Com as recentes eleições legislativas na Alemanha confirmou-se o fim da era Merkel e de pronto começaram a surgir comentários e análises ao seu papel e influência na UE.
Claro que as opiniões divergem, variando entre as mais favoráveis e as menos abonatórias, numa escala de valores onde obviamente sobressai o alinhamento dos autores e onde os mais conservadores quase só vêem e reportam conclusões abonatórias e os menos favoráveis destacam, principalmente, os aspectos mais controversos e menos positivos.
Vem esta introdução a propósito de um excelente artigo publicado aqui no Tornado, onde Yanis Varoufakis, a propósito do fim do consulado de Angela Merkel, expõe a falácia da crise das dívidas públicas europeias – responsável pelo lançamento de uma espiral de políticas austeritárias sobre a sul da Europa e pelo agravamento das já profundas desigualdades entre estados-membros da UE e nas políticas de distribuição interna da riqueza – atribuídas ao sobreendividamento público quando a sua verdadeira origem esteve na necessidade de resgate do sistema financeiro europeu, com os bancos alemães à cabeça.
O texto, originalmente publicado no sítio JACOBIN, é apresentado na versão brasileira (que pode ser lida aqui) onde se referem valores da ordem dos bilhões e dos trilhões (português do Brasil) de euros, quando no nosso português devem ser lidos milhares de milhões e biliões, respectivamente. Esta discrepância resulta do facto de se usarem diferentes escalas de valor nos dois países, com o Brasil a seguir a norma anglo-saxónica da escala curta e Portugal a seguir a norma europeia da escala longa. E a diferença não é pequena. As duas escalas são dois sistemas de nomenclatura de grandes números, onde na escala curta cada novo termo é mil vezes (103) o anterior enquanto que a escala longa usa o milhão (106) como factor.
Daqui resulta que o “billion” anglo-saxónico (ou o “bilhão” brasileiro) deverá ser traduzido/convertido em mil milhões (109) e não em biliões (1012), como tantas vezes acontece numa inadequada tradução literal onde “billion” significa bilião.
Mais grave ainda é quando este “erro” é praticado por quem nunca se poderá escudar no desconhecimento e só pode resultar de óbvia intenção manipulativa, como sucedeu nos idos de Abril de 2011 (em plena crise descrita e analisada por Varoufakis), quando no aceso do debate em torno do eventual resgate a pedir ao FEEF (Fundo Europeu de Estabilização Financeira) e ao FMI, foram difundidas entrevistas televisivas aos principais banqueiros nacionais e numa delas, Santos Ferreira, então presidente do concelho de administração do poderoso BCP, anunciou que o Estado necessitava de recorrer a um financiamento urgente duma dezena de biliões de euros, confundindo intencionalmente (porque ele não pode deixar de conhecer a diferença) a escala curta com a escala longa, como se não soubesse a diferença entre biliões (1012) e milhares de milhões (109), que era o valor que deveria ter referido e aproveitando o ensejo para atemorizar ainda mais os espectadores e alcançar o resgate de que o banco que dirigia tanto necessitava.
A par deste, muito outros exemplos poderiam ser invocados para demonstrar a necessidade de todos reforçarmos o nosso conhecimento e assim evitarmos estas e outras manipulações.