Poema inédito de Beatriz Aquino
Esse também é um livro de quem não sabe escrever
Esse também é um livro de quem não sabe escrever.
Quero te tocar a alma enquanto junto essas sílabas.
Eu que nunca sou adequada.
Mas queria redesenhar aquele momento em nós que foi o momento mais justo e mais íntimo.
Pois que sem dúvida eu o perdi enquanto o vivíamos.
Tu também o perdeste.
Essas coisas são feitas de éter, coisas que tentamos não assimilar pelo medo de perdermo-nos no outro.
Vazar para além da forma e descobrir que só se vibra dentro de outro corpo.
Tudo isso dói.
E por isso mesmo é o que tento traduzir.
Mas as sílabas não chegam.
Ou não se harmonizam.
Seremos mais uma vez Mais-um-clássico-caso-de amor-não-compreendido.
E eu detesto os clássicos.
Pois gosto de inventar palavras e também de reerguer civilizações extintas.Veja que o nocivo hábito me obriga a direcionar essas linhas para um final tocante.
Mas me recuso a ser óbvia e rala.
E é melhor que eu morra como as carpas nos lagos artificiais em um dia quente de sol.
A pele agonizante, a boca aberta e sem nenhuma compreensão.
Prefiro isso a me entregar ao óbvio que traz uma dor mais latente que a dúvida.
A conveniência jamais entenderá a inquietação dos rebeldes ou o número de cortes na boca dos pedintes.
Mas termino-me tentando resgatar aquele nosso eterno instante.
Em que eu era algo de todo incompreensível e em que tu também o era em igual proporção.
É bonito o medo humano quando envolto pela túnica morna da esperança.
Mas a janela estava aberta.
E sempre foram amplas as tuas janelas.Volto-me agora para a trivialidade. Escrevo-te sobre borboletas e caramujos.
Disserto longamente sobre a gaveta emperrada
ou sobre a torneira da pia que continua vazando.
É o meu modo tosco e rouco de dizer,
eu te amo…
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