Renzi, o anfitrião do encontro, recebe a sucessora actual de Bismarck e um pálido herdeiro de Mitterrand, na ilhota de Ventotene, onde Altiero Spinelli (que aí estava desterrado e agora aí está enterrado) lançou um “manifesto europeista” (muito de inspiração comunista, posicionamento assumidamente vanguardista e pouco ou nada democrático…), justamente chamado “Manifesto de Ventotene”.
Renzi, Merkel e Hollande reconhecem que essa sua “Europa” está “em plena crise de identidade” (uma realidade que o Brexit veio pôr a nu) e que tal não pode continuar pois assim marcha para o colapso (mesmo se evitam cuidadosamente a palavra…).
Transportados para a pequena ilha no navio-almirante da armada italiana, um porta-aeronaves com nome de maçon, o “Garibaldi” (que muito se riria se assistisse a esta pequena tragicomédia), os três “almirantes” desta Europa não resistiram à tentação de uma conferência de imprensa na ponte de comando do navio… A esta vulgar pretensão de simbolismo, seguiu-se a inevitável romagem ao túmulo de Spinelli, ocasião e pretexto para mais umas tiradas grandiloquentes de Renzi sobre o sonho europeu.
Na pequena viagem a caminho da ilha de Ventotene, nenhum dos três se terá esquecido do que comanda, na presente conjuntura, a sua vida de cada um deles: os pequenos problemas domésticos.
Renzi tem absolutamente de ganhar o referendo constitucional (marcado para Outubro próximo) e nada indica que o não perca.
Hollande viu os jornalistas perguntarem-lhe sobretudo por Sarkozy e pelo socialista Montebourg que estavam a anunciar as respectivas candidaturas às presidenciais do próximo ano que, tudo o indica, Hollande deverá perder (está com 12% de popularidade, coisa nunca vista na V República). Respondeu que não falava sobre tal e “muito menos ali” e que era de Europa que queria falar. Pois… como dizia a prima do Solnado.
Quanto a Merkel, as suas eleições são também em 2017 e, a sofrer uma queda acentuada da sua popularidade e com a “opinião pública” a mudar de opinião e a bávara CSU a ameaçar fazer uma lista própria, não há agora nada que garanta que ela conseguirá manter a tradição de as ganhar. Portanto…
Os spin-doctors do agenda setting vão, certamente, conseguir dar à imprensa mainstream óptimas “notícias” desta cimeira de “relançamento da Europa” pós-Brexit. Mas o que a análise fria e desapaixonada revela são três dirigentes em fim de ciclo, desfasados da realidade, mergulhados numa espécie de “sonho acordado”, sem ideias de futuro e muito menos projectos sérios, mas apenas com umas pobres propostas reactivas.
A “abertura” desta partida de xadrez a três coube a Renzi que, numa tirada lírica e grandiloquente (mas impensável ainda há meia-dúzia de anos), avançou que “a Europa não está acabada”, precisa apenas de “um novo impulso”. E, para isso, são preciso investimentos… Pelo que a Europa não pode continuar a ser uma “contabilista”.
Hollande tinha sugerido um financiamento europeu, em “euro-obrigações”, para apoiar projectos comuns em matéria militar (em convergência com a ideia italiana de um “Schengen da segurança para responder ao terrorismo”) e pretendia também duplicar o “plano Juncker”, nos próximos 5 anos. Acabou, contudo, por ir ao encontro do lirismo de Renzi e declarar que “a Europa continua um ideal” e “vive um período histórico” (seja lá o que for que isso quer dizer). Numa farpazinha a Merkel, acrescentou que a sua Europa é “uma Europa que protege e dá força às economias nacionais”.
Merkel teve de falar de “flexibilidade” (sobretudo da legislação laboral…) mas evitando comprometer-se com a coisa orçamental. E traduziu o seu pensamento numa equação lírica: a flexibilidade é o uso inteligente do pacto de estabilidade. E, para que não restem dúvidas sobre a sua “flexibilidade” prussiana, ela remata que “de todo o modo, têm de ser os investimentos privados a garantir o crescimento da economia italiana, da francesa e da alemã”. Tomem lá, Renzi e Hollande, e vão-se curar…
Joseph Stiglitz: “That’s going to be the end.[?]Isto vai ser o fim.”
Como uma desgraça nunca vem só, o Prémio Nobel da Economia escolheu o dia de ontem para se pronunciar sobre o iminente colapso da EU.
Joseph Stiglitz declarava no britânico Express que a UE “is on the brink of imploding, destroying the Euro and causing economic doom[?]está à beira da implosão, da destruição do Euro e vai causar a desgraça económica” e que, portanto, “an amicable divorce must be considered to avoid a political cataclysmic event like Brexit[?]deve ser tido em conta um divórcio amigável para evitar um evento cataclísmico político como o Brexit”. E apontava a Itália como forte candidato a ser o próximo a ter de abandonar, dado o estado calamitoso (quase tão mau como o alemão) da banca italiana.
Conclusão de Stiglitz: “What’s going to happen is that there will be a definite consensus that Europe is not working[?]O que vai acontecer é que vai haver um consenso definitivo de que a Europa não está a funcionar”.
Portanto, “that’s going to be the end.[?]Isto vai ser o fim.”