Você provavelmente foi impactado por notícias de que vulnerabilidade no Whatsapp permitiu a “hackers” acessarem seu telefone e, consequentemente, seus dados. No entanto, você não foi informado que esse serviço não é fruto do trabalho de algum lobo solitário na garagem de casa ou algo do tipo. Talvez a questão não seja tão simples.
A história tem início oficial em 2011, quando a empresa NSO desenvolveu seu primeiro protótipo, uma ferramenta de vigilância móvel chamada Pegasus. A ferramenta da NSO poderia fazer algo aparentemente impossível: coletar grande quantidade de dados – até então inacessíveis – de smartphones sem deixar rastros e claro, sem permissão. Isso incluía telefonemas, textos, e-mails, contatos, localização e quaisquer dados transmitidos sobre aplicativos como Facebook, WhatsApp e Skype.
A partir daí, a empresa que se identifica como “a Q Cyber Technologies company, we develop technology that enables government intelligence and law enforcement agencies to prevent and investigate terrorism and crime” passou a vender seus serviços para governos em todo o mundo. Segundo líderes da NSO, a empresa “tem clientes em todos os continentes, exceto na Antártida”.
“Quando essas empresas invadem seu telefone, elas são as proprietárias. Você está apenas carregando isso”, disse Avi Rosen, da Kaymera Technologies, uma empresa israelense de defesa digital, sobre a NSO e seus concorrentes. A empresa logo teve seu primeiro cliente para a Pegasus: o governo do México, que estava envolvido em uma ofensiva aos cartéis de drogas. (…) Um porta-voz do Ministério da Defesa de Israel, que precisa autorizar qualquer contrato que o NSO ganhe de um governo estrangeiro, se recusou a responder a perguntas sobre a empresa.
Os produtos da NSO – particularmente a Pegasus – ajudaram a desmembrar células terroristas e ajudaram nas investigações sobre o crime organizado e o sequestro de crianças, informaram as autoridades de inteligência e policiais europeias em entrevistas. Voltando ao primeiro cliente da empresa, um dos casos mais emblemáticos, a NSO teve papel central na guerra do México contra os cartéis, de acordo com pessoas envolvidas com o governo mexicano. As autoridades mexicanas atribuem à Pegasus atuação fundamental para ajudar a localizar e capturar El Chapo, o famoso traficante que foi condenado à prisão perpétua em segurança máxima.
No entanto, o governo mexicano também estava usando os serviços para fins mais sombrios – como parte de um esforço mais amplo de vigilância do governo, que utilizou os serviços da NSO para rastrear pelo menos 24 jornalistas, críticos do governo e investigadores internacionais que investigavam o desaparecimento de 43 estudantes, por exemplo.
Portanto, ao ser atingido por notícias como falhas de segurança ou hackers, entenda que o processo está a milhas distante de um trabalho amador, caseiro ou de indivíduos solitários. A falha de segurança no Whatsapp permitiu – e permite – que empresas monitorem e influenciem inúmeros processos em todo o mundo, sejam eles ligados a atividades ilícitas, como se propõe na teoria a agência israelense, ou atividades consideradas perigosas por àqueles que contratam os serviços.
Por isso, deve-se desconfiar também da aproximação – muitas vezes injustificável – de Bolsonaro com o governo israelense. Some-se a isso a necessidade de que todas as atividades da empresa, em governos estrangeiros, precisam ter a anuência do governo israelense. Acrescente-se ainda que, segundo a BBC, a visita de Bolsonaro ao país incluía a expectativa de “firmar novas parcerias em segurança, nas áreas de tecnologia, cibersegurança e defesa”. Ou, caso ache melhor, apenas ignore e reconsidere a ideia de que as falhas de segurança do Whatsapp são exploradas por algum lobo solitário em um porão da Macedônia.
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por Pedro Barciela, da FPA | Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV (Fonte: Fundação Perseu Abramo) / Tornado
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