“O meu temor é o de que não se consiga organizar o centro”, disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. E admitiu, ao final, que se Geraldo Alckmin não demonstrar viabilidade eleitoral, pode ser rifado pelo PSDB. “Se houver outro que aglutine, fazer o quê?”. Mas FHC, que como sociólogo sabe muito bem ler as pesquisas, sabe: o que ele chama de “centro”, apelido da direita, ou centro-direita, hoje está aritmeticamente fora do segundo turno. Dificilmente haverá “outro que aglutine”.
São os números que dizem isso. Em nenhuma das últimas pesquisas, Lula e Bolsonaro, juntos, ficaram com menos de 50%. No último IBOPE, por exemplo, Lula pontuou 35%, Bolsonaro 13% e Marina Silva, 8%. Estão aí 64% dos votos, e vale incluir a fração de Marina porque ela não está entre as alternativas da centro-direita, embora tenha se afastado também da esquerda. No último Datafolha a soma de Lula (34%) e Bolsonaro (17%) chega a 51%. Se adicionamos os 9% de Marina, temos 60%. O temor de FHC, portanto, é fundado. Se a eleição estivesse mais próxima, e as elites nacionais fossem mais chegadas à razão que ao preconceito, a candidatura de Lula seria o estuário natural de um grande acordo de pacificação nacional, em torno de um projeto nacional com desenvolvimento e inclusão.
Mas, hoje, o que faz o chamado “centro”, dividido entre candidaturas flácidas como as de Alckmin e Henrique Meirelles, é buscar um salvador do golpe, o inexistente e improvável candidato portador de um milagre, o de ser competitivo defendendo a agenda neoliberal imposta pelo golpe e até aqui executada por Michel Temer. Depois que a ficha caiu para a maioria da população ao longo de 2017, com seu saldo tenebroso de retrocessos, será difícil, para não dizer impossível, pois que na política nada é de todo impossível, encontrar este santo (não confundir com “o santo”, apelido atribuído a Geraldo Alckmin nas planilhas da Odebrecht). Em busca dele, a direita agora empina em uníssono um discurso, o de que o centro desunido favorecerá os candidatos dos “extremos”.
Para que o candidato de centro, no quadro de hoje, tivesse condições de chegar ao segundo turno, Lula e Bolsonaro teriam que perder uns bons décimos em seus índices. Bolsonaro pode até ter chegado ao teto mas o apoio que ele tem hoje vem de um segmento bastante coeso, a ultra-direita anti-Lula e anti-PT. E Lula, por sua vez, está cada vez mais sólido com seus 34%, 35%, 37%, dependendo do instituto, e continua crescendo. Por isso o “centro” deseja ardentemente que sua candidatura seja barrada, liberando votos que o candidato da direita tentaria amealhar para chegar ao segundo turno. Mas, mesmo barrado, Lula continuará sendo uma variável determinante, pois indicaria a seu eleitorado um candidato. Os magros índices hoje atribuídos a Fernando Haddad ou Jaques Wagner não valem. O potencial do candidato apoiado por Lula só poderá ser conferido diante de uma situação concreta, a de seu impedimento, convertendo-o num poderoso cabo eleitoral.
Então, no quadro hoje apontado pelas pesquisas, não há espaço para um candidato do chamado centro chegar ao segundo turno. Se ele for do PSDB, ainda que se descole de Temer e seu governo, teria que ter uma bandeira, um programa, uma proposta sedutora para o eleitorado que ainda não se definiu. E isso, o PSDB não tem. Alckmin não tem nem terá nada como o Real que garantiu a vitória de FHC. Se tal candidato for um governista, como Meirelles, tanto pior. FHC sabe também disso.
Não por acaso, surgem sinais de que o balão da candidatura de Luciano Huck pode voltar a ser empinado pelos desesperados da direita.
A autora escreve em Português do Brasil