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Quarta-feira, Dezembro 25, 2024

Fomos revolucionários mas perdemos a revolução

José Carlos S. de Almeida
José Carlos S. de Almeida
Professor de Filosofia do ensino secundário. Licenciado em Filosofia e em Direito.
Tony Judt in NYT
Tony Judt in NYT

Refiro-me a Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos e o seu último livro de memórias, O Chalet da Memória, já ditado no apogeu da esclerose lateral amiotrófica que o vitimaria em Agosto de 2010.

Era um autor difícil de catalogar, mas talvez seja essa a marca dos livres pensadores do nosso tempo.

Com efeito, em entrevista ao jornal The Guardian, afirmava que fora da New York University era visto como um esquerdista, um comunista que renega as suas origens e dentro da universidade era considerado como um típico elitista liberal branco fora de moda (Jornal «Público», 8/8/2010).

Seja quem for, vai fazer-nos falta. Pensava e ajudava a pensar e isso é fundamental nos conturbados tempos que correm.

Faleceu com 62 anos, portanto, podemos dizer que é da nossa geração, que viveu acontecimentos que também marcaram o nosso imaginário político. Comungamos de muitas das suas alegrias e dos seus descontentamentos e perplexidades. Por isso, não resisto a transcrever um belíssimo texto sobre a nossa geração.

Porque fomos revolucionários e perdemos a revolução.

“Ninguém se deve sentir culpado por nascer no local certo na altura certa. Nós, no Ocidente, fomos uma geração com sorte. Não mudámos o mundo; em vez disso, o mundo, obsequioso, mudou para nós. Tudo parecia possível: ao contrário dos jovens de hoje, nunca duvidámos de que haveria um trabalho interessante para nós e por isso não sentimos a necessidade de desperdiçar o nosso tempo em algo tão degradante como uma «faculdade de gestão». A maioria conseguiu empregos úteis na função pública ou no ensino. Dedicámos a nossa energia a discutir o que estava mal no mundo e como mudá-lo. Protestámos contra as coisas de que não gostávamos e ainda bem que o fizemos. Aos nossos olhos, pelo menos, fomos uma geração revolucionária. É uma pena que tenhamos perdido a revolução.”

(Tony Judt, O Chalet da Memória, pp. 126-127).

De facto, não ganhámos a revolução, não fizémos a revolução duma forma conclusiva.

Mas os dias, aqueles dias, sabem, ninguém nos tira. E foram belos, muito belos.

Quando as noites de inverno apertarem e se ouvir o vento e a chuva lá fora, à desfilada, não percamos a sua reflexão e a sua leitura: a sua amargura lúcida segreda-nos que não estamos sozinhos.

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