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Sábado, Dezembro 21, 2024

Francisco Vieira de Almeida

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1888 – 1962)

Figura de grande relevo da Filosofia e na Cultura, monárquico antifascista, teve significativa intervenção na luta contra a Ditadura Militar e o regime do Estado Novo, e na defesa da Liberdade e da Democracia. Com contactos com o grupo da Seara Nova, apoiou numerosas iniciativas da Oposição, mantendo o seu posicionamento corajoso, nas fases de maior repressão do regime. Foi proponente da candidatura do general Humberto Delgado a Presidente da República, em 1958, figurando ao seu lado na célebre conferência de imprensa no Café Chave d’Ouro[1]. Detido por duas vezes pela PIDE, passou dois períodos de prisão no Forte de Caxias (Junho e Novembro de 1958), por “atentado à segurança do Estado”. Já tinha mais de 70 anos de idade quando foi encarcerado em Caxias, juntamente com António Sérgio, Jaime Cortesão e Mário de Azevedo Gomes, pelo apoio dado à candidatura presidencial de Humberto Delgado. No ano seguinte, em 1959, de novo com Jaime Cortesão, António Sérgio e Azevedo Gomes, convida os socialistas Aneurin Bevan e Mendès-France para conferências em Portugal, que são proibidas, e os organizadores novamente detidos.

É autor de vasta e notável obra filosófica em que avultam trabalhos sobre Lógica, Estética, Epistemologia e História.

Figura de grande relevo da Filosofia

Francisco Lopes Vieira de Almeida nasceu em Castelo Branco, em 9 de Agosto de 1888, viveu a maior parte da sua vida em Lisboa, e viria a falecer em Cascais em 20 de Janeiro de 1962.

Nunca frequentou a escola primária e foi o pai que, ainda em Castelo Branco, o preparou para a admissão ao liceu e lhe ensinou latim. Licenciado e doutorado pela Faculdade de Letras de Lisboa em Filosofia, em 1915 ingressou na Universidade como docente no grupo de História. Em 1921 voltou à Filosofia e é nesta área que ascende a catedrático em 1930, mantendo-se em actividade permanente até 1958. Apesar de entre a sua extensa bibliografia se encontrar poesia, romance e teatro, bem como traduções, é a sua actividade como professor e ensaísta na área de Filosofia e também de História que o distingue[2].

Foi um dos raros autores portugueses com trabalhos de relevo em Lógica (e na sua divulgação), mas nunca abdicou de um compromisso político explícito, apesar dos dissabores que o regime lhe causou mesmo em idade avançada.

Monárquico antifascista

Monárquico, está entre os fundadores da breve (apenas dois números) Revista dos Homens Livres («livres das Finanças e livres dos Partidos»), projecto frentista contra a degeneração da República na década de 1920. Fracassada essa «frente», e implantada a ditadura que irá estar na base do Estado Novo, Vieira de Almeida encontra-se já próximo do grupo Seara Nova, com o qual mantêm contactos, através de Câmara Reys e iria aproximar-se gradualmente do ideário republicano. Já então uma figura intelectual de referência (o seu primeiro trabalho filosoficamente relevante data de 1922, A Impensabilidade da Negativa), sempre se manteve disponível para apoiar a Oposição nos períodos de maior repressão, entre as décadas de 1930 e 1950.

Humberto Delgado, na sua campanha de 1958, apreciou-o, em particular pela sua independência, vivacidade e, provavelmente, pelo percurso político pouco comum. Na ressaca dessa campanha e do seu desfecho, Vieira de Almeida encontra-se entre os «quatro grandes» (expressão de Mário Soares no volume de homenagem a Vieira de Almeida no centenário do seu nascimento), que se juntam a Delgado para convidar os socialistas Aneurin Bevan e Mendès-France para conferências em Portugal, em 1959. Foram impedidas as conferências, e presos os quatro (além de Vieira de Almeida, Jaime Cortesão, António Sérgio e Azevedo Gomes).

Francisco Vieira de Almeida, pai do arquitecto Pedro Vieira de Almeida e do advogado Vasco Vieira de Almeida, morreu em casa, aos 74 anos, lúcido e comunicativo, estimado e respeitado pelos mais variados sectores da vida intelectual portuguesa e um exemplo na família e amigos, que o admiravam muito[3].

Publicações e homenagens

Além da Lógica moderna, matemática, que introduziu na Universidade de Lisboa e que divulgou em obras menos especializadas, a sua actividade como filósofo deu origem a trabalhos nas áreas de Estética, Epistemologia e História. .

A sua obra filosófica, em que avultam os trabalhos sobre Lógica, Estética, Epistemologia e História, encontra-se editada pela Fundação Calouste Gulbenkian . É autor de Introdução à Filosofia (1942). Encontra-se colaboração da sua autoria na Revista de História (1912- 1928) e na revista Prisma (1936 – 1941).

Figura cativante e polémica, capaz de simultaneamente comandar o respeito intelectual de especialistas e chegar a públicos mais amplos, os estudos dedicados ao seu pensamento não são muitos[4].

Um esquecimento tanto mais lamentável quanto a sua combinação de actividade cívica, pública, e diversidade intelectual, em particular científica, é rara. E particularmente valiosa para apreciar um processo de mudanças institucionais que foi decisivo na evolução da sociedade portuguesa ao longo do século XX».

Vieira de Almeida,
(Colóquio do Centenário, 1888 – 1988)

Os textos das comunicações apresentadas ao colóquio do centenário de Francisco Vieira de Almeida foram publicados em 1993 pela na Editora Colibri: “Vieira de Almeida, Colóquio do Centenário, (1888 – 1988)”.

A Fundação Vasco Vieira de Almeida em parceria com a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) lançaram, em 2018, o Prémio Professor Francisco Vieira de Almeida, um novo galardão na área da Humanidades destinado a distinguir o melhor trabalho científico submetido por licenciados, mestres, doutores ou investigadores pós-doutorados da FLUL.

A biblioteca pessoal de Francisco Vieira de Almeida foi doada, em 2017, à Biblioteca da Faculdade de Letras, pelo filho, Vasco Vieira de Almeida.

Francisco Vieira de Almeida foi agraciado, a título póstumo, com a condecoração Grande-Oficial da Ordem da Liberdade, em 1987.

Em 2017, foi homenageado na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde foi descerrado um busto, e condecorado pelo PR, a título póstumo, com o grau de Grande-Oficial da Ordem da Instrução Pública .


A casa one viveu em Castelo Branco

A lápide descerrada em 1988, na casa onde viveu em Castelo Branco


 

 

Entrevista

No Rádio Clube Português, dada por Vieira de Almeida a Igrejas Caeiro, em 1957

 

[1] A conferência de imprensa em que o general, quando interrogado pelos jornalistas sobre Salazar, respondeu: «Obviamente, demito-o!».

[2] É mesmo possível afirmar que o seu foi um dos primeiros casos de articulação bem sucedida entre dois registos de crítica à sociedade portuguesa que marcam o século XX no seu conjunto: se, na primeira metade do século, é de um ideal de reformismo cívico que se faz o discurso crítico português, uma transição encetada ao longo das décadas de 1940 e 1950 leva a que na década de 1960 se assista a uma especialização disciplinar da análise social, fundada nos saberes emergentes das ciências sociais. Ora, Vieira de Almeida foi um percursor dessa especialização disciplinar»

[3] Vasco Vieira de Almeida, seu filho, em “Conversa com M. João Seixas” recordou-o assim:

(…) Era uma pessoa extraordinária, em todos os aspectos. Talvez o homem mais inteligente e culto que conheci, com um grande sentido de humor. Era um homem de valores, extremamente simples e tinha uma forma única de comunicar as coisas que sabia e em que acreditava; não as ensinava, comunicava-as (…) Nem meu irmão nem eu fomos à escola. Fizemos a primária em casa. O meu pai fez uns livrinhos, um de gramática portuguesa com 16 páginas, um de francês com 20 e tal páginas e um de matemática com 30. E as lições eram dadas conversando. O que aprendi nesses quatro anos de instrução primária, o que ele me quis ensinar e tudo o que me transmitiu sem me ensinar, foi de uma riqueza excepcional. (…) Era senhor de uma grande coragem (foi preso aos 74 anos, depois das eleições do Delgado). Com apurado sentido de humor (…), Foi dele que herdei o rigor de raciocínio (,,,) Insistia sempre na necessidade de busca permanente de uma sólida lógica interna do pensamento que não permita pôr em causa as conclusões, a não ser que se rejeitem as premissas.»

, in Memoria recente e antiga Vieira de Almeida…

[4] O estudo mais recente é a dissertação de Mestrado de Graça Maria Dias Lopes intitulada O pensamento estético em Vieira de Almeida (Universidade do Minho, 1998)».

Dados biográficos


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