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Sábado, Dezembro 21, 2024

Frente ampla, em vez de polarização

João Carlos Gonçalves, Juruna, em São Paulo
João Carlos Gonçalves, Juruna, em São Paulo
Metalúrgico, sindicalista, Secretário Geral da Força Sindical, vice presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo.

No ano e meio em que Lula ficou preso, o Brasil mudou para pior. Com Lula livre, esperava-se que os ventos da conciliação pudessem soprar mais uma vez entre o centro e a esquerda do espectro político. Entretanto, a palavra da moda desde a eleição de Jair Bolsonaro, a polarização, parece estar sendo instrumentalizada tanto por setores da esquerda, tanto quanto por setores da direita. Um discurso que prega que apenas polos devem sobreviver e disputar.

Lula precisa pensar que sua postura difere daquela com a qual ele se elegeu em 2002. Ele não fez um governo radical. O PT ganhou as eleições presidenciais em 2002, tendo Lula presidente e o empresário José de Alencar, como vice na chapa. Aquele PT, que fez uma heterogênea coligação com setores conservadores, além de obter apoio de grupos ligados a outros partidos com ideologia de direita mostrou que estava pronto para trabalhar com todos da sociedade, além do seu nicho de esquerda, e conseguiu vencer e governar tentando ser progressista num mundo capitalista.

É um quadro muito distante do que conhecemos no 1º ano de governo de Jair Bolsonaro! Um governo que busca o radicalismo e o extremismo como opção.

Em seus primeiros discursos após sair da prisão, Lula, todavia, parece vestir a carapuça e retroceder no tempo em que era um radical, intransigente, em um partido que dava seus primeiros passos. Com isso, ele cai na armadilha da polarização, rebaixando-se ao jogo bolsonarista.

Armadilha porque a guerra da polarização foi imposta por setores extremistas em várias partes do mundo. Eventos como o referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia, o chamado Brexit, a eleição do megaempresário Donald Trump para a Presidência dos EUA, a própria Lava Jato, no Brasil, o impeachment da presidente Dilma Rousseff, e o governo de Michel Temer, com sua reforma trabalhista e a PEC do teto de gastos, estão no contexto desta ascensão extremista. E ela não ascendeu por convencimento das massas ou por apresentar boas propostas para a vida das pessoas. Ascendeu atrelada à manipulação de conceitos – como contra tudo que está aí -, das mídias sociais e até mesmo às custas da manipulação da legislação.

Será que Lula acha que pode virar esse jogo?

Em reunião com dirigentes petistas no dia 14 de novembro último, em Salvador (Bahia), Lula disse que “o PT não nasceu para ser partido de apoio”. Com isso, ele quer dizer que o PT, sendo o maior partido da esquerda, vai impor suas candidaturas, manobrando para inviabilizar alternativas em seu campo?

A lógica formal de Lula parece incontestável. Mas ela esconde o fato de que o PT, mesmo sendo o maior partido de esquerda, em muitos casos corre o grande risco de perder. Ficou claro nas últimas eleições que muitos eleitores, no 2º turno, votaram em Bolsonaro ou anularam o voto para não votar no PT. Isso traz à discussão um fator fundamental: o antipetismo. E este é o fator polarizante que pavimentou a vitória de grupos extremistas no Brasil.

Lula pode apadrinhar candidaturas, como fez com Fernando Haddad e Dilma Rousseff, mas esta é uma relação que precisa ser melhor avaliada e repensada. No caso da ex-presidente Dilma, por exemplo, até o próprio Lula reconheceu, no livro A Verdade Vencerá, que “ela cometeu muitos erros pela pouca vontade de lidar com a política”, e, desde meados de 2016, vivemos uma situação catastrófica que, em parte, resultou desta pouca vontade de lidar com a política.

Mas, qual é a saída?

O ideal, acima da mesquinhez de interesses partidários, é construir uma rede progressista mais heterogênea. Uma rede que se alargue até o centro e que, muito importante, conte com pessoas que proporcionem um diálogo francamente amplo. A maior diversidade no campo progressista elevará o nível do debate público e fomentará um ambiente social mais saudável.

O PT não vai deixar de ser um dos maiores partidos do Brasil se apoiar políticos eleitoralmente mais viáveis de outros partidos. Esta seria uma maneira de evitar o avanço da extrema direita, que é o que está acontecendo, com seu poder de destruição, com danos irreversíveis para os menos favorecidos economicamente.

O exemplo do gesto de Cristina Kirchner cabe aqui e nos mostra que a lógica “o PT não nasceu para ser partido de apoio” não é absoluta. Mesmo liderando as pesquisas, Cristina não foi a cabeça de chapa, e sim Alberto Fernandéz, que foi chefe de gabinete de seu marido, Nestor Kirchner.

Precisamos fortalecer o campo progressista na política brasileira. Mas precisamos buscar melhorar este campo, deixando de lado, de uma vez por todas, o ranço do sectarismo e o espírito de gueto.

Se Lula quer continuar a ser o mito que ainda é, ele deve ser maior que pequenos interesses partidários e ter o bom senso para ser o gatilho que irá destravar o crescimento e a atualização da esquerda. Ainda está em tempo.

É preciso aumentar e fortalecer umarco de alianças. O PT precisa refletir: Ele quer construir uma arca de Noé para salvar poucos escolhidos ou uma arca de alianças, visando um projeto com desenvolvimento econômico, com distribuição de renda e empregos.


por João Carlos “Juruna” e Wagner Gomes | Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV (Poder 360) / Tornado

  • João Carlos Gonçalves, Juruna, 64, é secretário-geral da Força Sindical e vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo
  • Wagner Gomes, 60 anos, é secretário-geral da CTB (Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil)

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