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Domingo, Novembro 3, 2024

Geoeconomia

Jorge Fonseca de Almeida
Jorge Fonseca de Almeida
Economista, MBA, Pos-graduado em Estudos Estratégicos e de Segurança, Auditor do curso de Prospectiva, geoeconomia e geoestratégia, Doutorando em Sociologia

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A geoeconomia ajuda a perceber o sentido e natureza dos fluxos mundiais de capitais e mercadorias e a entender a relação de forças que molda e condiciona o desenvolvimento de cada região e de cada país e a forma como cada Estado se insere na divisão internacional de trabalho.

Gramática do comércio, lógica da guerra

A Geoeconomia é uma área de estudos relativamente recente, tendo o termo sido cunhado apenas em 1990 pelo romeno, naturalizado norte-americano, Edward Nicolae Luttwak no âmbito dos seus estudos de geopolítica. Desde então a maioria dos estudos desta área são produzidos por académicos americanos.

Luttwak percebeu que as relações económicas internacionais se regem “pela gramática do comércio, mas pela lógica da guerra”. Cada país ou bloco tem os seus objectivos económicos que, na maioria dos casos, só podem ser obtidos contra a realização de objectivos similares de outros países.

Organização de mercados

No mundo actual não há mercados livres. Os mercados são regulados e controlados pelos Estados mais fortes. O poder de organizar os mercados, as regras por que se regem, o grau de liberdade dos vários actores (compradores, vendedores, reguladores, política fiscal, financiamento) é um poder económico enorme, capaz de controlar países, sectores e regiões.

Um pequeno exemplo. Vários países procuram activamente atrair investimento estrangeiro, mas os países que controlam as agências de rating estão em posição de canalizar os fluxos de capital, premiando uns países em detrimento de outros. Para obter rating favorável alguns países aceitam as sugestões das agências de rating americanas. Portugal considerado lixo está excluído do investimento americano e europeu. Por isso os governantes portugueses têm tentado obter, ainda que a contragosto, investimento angolano e chinês.

Possuir uma agência de rating credível é uma forma de poder económico de largo alcance, uma forma de coordenar e comandar fluxos financeiros importantes não só do próprio país como de outros. Não admira que as principais potências económicas tenham as suas agências de rating (os Estados Unidos lideram com a Moodys e a Standard and Poor’s), mas a Europa, a China e outros também possuem as suas.

Outro exemplo pode ser encontrado na complexa luta pelo controlo dos recursos energéticos no mundo. A finaceirização do mercado do petróleo, a par dos mercados de outras matérias-primas, significa que se transaciona em bolsa, volumes muito superiores aos das mercadorias reais.

Assim, o preço real destas mercadorias é fixado pelos volumes de procura e de oferta nestes mercados financeirizados e não pela oferta e procura real dos bens. Com este deslocamento do estabelecimento dos preços, os países mais poderosos em termos financeiros podem estabelecer os preços das mercadorias sem a intervenção dos países produtores. O desenho dos mercados internacionais e a sua regulamentação é uma poderosa arma económica que os países utilizam para obter vantagens.

A arquitectura do sistema financeiro internacional, com instituições como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Organização Mundial de Comércio, tem sido usada para promover o comércio livre, prejudicando gravemente as indústrias nascentes em países em desenvolvimento que necessitam de prazos adequados de proteccionismo alfandegário e orçamental para se poderem desenvolver e afirmar no contexto internacional.

Portugal fornecedor de mão-de-obra barata

Para Portugal compreender a geoeconomia é essencial, para se poder posicionar do lado correcto dos fluxos financeiros e de mercadorias que ocorre nos dias de hoje.

Perceber que o simples posicionamento como país fornecedor de mão-de-obra barata é um modelo sem futuro no contexto europeu, mas também perceber que o país não pode viver apenas dos serviços, tal só é possível em países de pequena dimensão, uma vez que os portugueses têm de comer, vestir-se, calçar-se, usar computadores, comprar carros, televisores, telemóveis, etc.. Ou seja que sem agricultura, nem indústria, que produzam para o mercado interno e externo, não poderemos aceder aos produtos que precisamos importar.

A composição da balança de mercadorias é essencial para o posicionamento de cada país no contexto internacional. Para além das ilusões sobre o livre comércio, o Estado tem na estratégia e gestão económica um papel fundamental. Em todos os países desenvolvidos o Estado assume esse papel. Renunciar a ele é renunciar ao nosso futuro.

Nota do Director

As opiniões expressas nos artigos de Opinião apenas vinculam os respectivos autores e não reflectem necessariamente os pontos de vista da Redacção ou do Jornal.

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