É urgente reforçar o orçamento do SNS para defender a saúde dos portugueses e, assim, garantir o funcionamento da economia sem a qual as consequências económicas e sociais serão dramáticas para os portugueses
Neste estudo analiso o subfinanciamento cronico do SNS pelo O.E, que continua em 2020 e em 2021 (OE-2021), o que determina que o SNS para funcionar tenha uma divida enorme aos fornecedores privados, com custo elevadíssimos. Há ainda a degradação das condições de vida dos profissionais de saúde cujo poder de compra atual é muito inferior à de 2010, e o governo congelou as suas remunerações mais uma vez. Assim torna-se difícil o SNS combater a pandemia. É urgente reforçar o orçamento do SNS para garantir o funcionamento da economia.
Neste estudo analiso , utilizando dados do Ministério da Saúde e da DGAEP (MMEAP) o subfinanciamento crónico do SNS pelo Orçamento do Estado que se tem verificado todos os anos, incluindo 2020 e 2021, o que determina que o SNS para poder funcionar é obrigado a se endividar enormemente junto dos fornecedores privados com custos acrescidos, causando as dificuldades que enfrenta.
O investimento ridículo no SNS que continua em 2021 assim como a degradação da situação dos profissionais de saúde, com remunerações cujo poder de compra continua a ser significativamente inferior ao que tinham em 2010, associado ao congelamento das remunerações pelo atual governo, bem como a manutenção da proibição da exclusividade, a falta de profissionais de saúde, e que existem trabalham simultaneamente no SNS e no setor privado de saúde, criando a promiscuidade que está destruir o SNS e a alimentar o negócio privado de saúde são outras matérias importantes que analiso, embora de uma forma sintética, neste estudo.
É altura para reforçar os meios que o SNS precisa e para acabar com a promiscuidade que o destrói. E tudo isto é necessário para defender verdadeiramente a saúde dos portugueses e garantir assim também o funcionamento da economia, cujo afundamento está a ser já dramático já para todo o país.
Estudo
É urgente reforçar o orçamento do SNS para defender a saúde dos portugueses e, assim, garantir o funcionamento da economia sem a qual as consequências económicas e sociais serão dramáticas para os portugueses
A grave crise de saúde pública causada pelo “coronavírus”, que gera a incerteza e a insegurança, está a destruir a economia e o emprego, a reduzir a produtividade e a riqueza criada no país, a agravar as profundas desigualdades que já existiam, e a causar o alastramento rápido da pobreza no país (antes da pandemia já mais de 1.700.000 viviam no limiar da pobreza, atualmente serão muito mais de 2.000.000)
A economia não pode nem fechar nem parar pois sem ela o país e a vidas dos portugueses estarão condenados ao retrocesso e à pobreza. É urgente defender a saúde dos portugueses também para que a economia possa funcionar. Para conseguir é necessário investir muito mais no SNS, e apesar do governo afirmar que está a disponibilizar ao SNS os meios que este necessita para cumprir tal tarefa, isso não corresponde à verdade. É o que vamos mostrar com dados do próprio Ministério da Saúde.
As transferências do Orçamento do Estado para o SNS são sempre muito inferiores à sua despesa total mesmo em 2020 e 2021 o que causa o subfinanciamento crónico que destrói e incapacita o SNS
Mesmo com a pandemia, e com a grave crise da saúde publica, também em 2020 e em 2021 as transferências do Orçamento do Estado para o SNS são muito inferiores à despesa do SNS, o determina que este continue a carecer dramaticamente de meios.
Quadro 1 – Despesa do SNS e transferências do Orçamento do Estado para o SNS
Mesmo em 2021, as transferências do Orçamento do Estado para o SNS serão inferiores a despesa total prevista em 1.089 milhões €. Se somarmos os saldos negativos dos 11 anos constantes do quadro anterior obteremos o impressionante montante de -12.467 milhões €.Entre 2020 e 2021, as transferências do OE para o SNS aumentarão apenas 134 milhões € (+1,3%) e não 467,8 milhões € como o governo refere na sua propaganda. O gráfico 1, mostra de uma forma clara, a política de estrangulamento financeiro a que os sucessivos governos têm sujeito e continuam a sujeitar o SNS.
Gráfico 1 – O financiamento do SNS pelo OE e o subfinanciamento crónico do SNS Fonte: Notas explicativas do Ministério da Saúde aos deputados no debate sobre o OE
Como revela o gráfico 1 (dados do Ministério da Saúde) o financiamento do SNS pelo Orçamento do Estado tem representado apenas entre 86,1% e 92,1% da despesa total do SNS. Tal facto tem contribuído para o seu subfinanciamento crónico, que está a destruir o SNS e incapacitá-lo de responder às necessidades do país. Mesmo em plena grave crise de saúde pública, a insuficiência de meios é clara como provam os próprios dados oficiais (em 2021, as transferências do OE são inferiores à despesa em 1.089 milhões €).Para colmatar a enorme divida acumulada o governo faz de tempos a tempos transferências extraordinárias ou permite a utilização dos capitais próprios para outros fins: Mas desta forma o SNS é estrangulado no seu funcionamento diário, impedindo qualquer gestão racional, eficiente e responsável.
O endividamento enorme do SNS para suprir a insuficiência das transferências do OE
Se analisarmos a Conta do SNS referente a 2019 e 2020 (esta ainda com estimativas), concluímos que o subfinanciamento por parte d Orçamento do Estado, ou seja, o “buraco” tem sido coberto por receitas de jogos sociais (122M€ em 2019 e 115M€ em 2020), por receitas das taxas moderadoras pagas pelos portugueses (170M€ em 2019 e 112M€ em 2020) e fundamentalmente através do endividamento cronico e enorme do SNS aos fornecedores. Em 2021, com eliminação das taxas moderadores nos centros de saúde a situação piorará (entre 2020 e 2021,a receita das taxas moderadoras diminuirá de 112 milhões € para 76 milhões €).O gráfico 2, mostra o enorme endividamento do SNS devido subfinanciamento crónico
Gráfico 2 – Divida total do SNS a fornecedores – Milhões € Fonte: Notas explicativas do Ministério da Saúde no debate sobre o OE-2021
No 4º Trim.2011, a divida acumulada do SNS aos fornecedores atingia 3.249 milhões €. Este enorme endividamento do SNS obrigou o Estado a fazer um financiamento extraordinário de 1.932 milhões € o que reduziu a divida de 3.249 milhões € para 1.317 milhões €. Mas no 4º Trim.2012, a divida já tinha subido para 1794 milhões €, o que significa que cresceu, em 2012, em 477 milhões €. No 3º Trim.2020, a divida seria muito maior do que o que consta no gráfico – 1.531 milhões € – se os aumentos de capital de 256,4 milhões € não fossem aplicados na amortização da divida. Para além disso, no ano de 2020 o SNS terminará com um défice de 283,9 milhões € (Nota explicativa do Ministério da Saúde OE-2021 -pág. 32).
O recurso sistemático do SNS ao endividamento para suprir as transferências insuficientes do Orçamento do Estado está, por um lado, a impedir a internalização de muitos serviços no SNS por falta de investimentos e, por outro lado, a determinar o recurso crescente aos privados, o que significa que uma parte significativa do orçamento do SNS (ver quadro 2) vai engrossar os lucros dos privados com custos acrescidos, pois estes impõem preços mais elevados como contrapartida dos atrasos.
Quadro 2 – Despesas do SNS com Pessoal e com a aquisição de bens e serviços a empresas privadas
O SNS é uma fonte enorme de negócio e de lucro para o setor privado. Segundo a “Conta do Serviço Nacional de Saúde”, divulgada pelo Ministério da Saúde durante o debate na Assembleia da República da proposta do OE-2021, em 2020, e o mesmo acontecerá em 2021, 56,7% do orçamento do SNS (6.412 milhões € em 2021) é utilizado para aquisição de bens e serviços a empresas privadas (na ADSE são 550 milhões€ para privados sendo criticada por isso). A parcela destinada aos profissionais de saúde – 42,6% do total da despesa corrente – é muito menor (4841 milhões € em 2021). O investimento no SNS em equipamentos e outros bens de capital tem sido mínimo, mesmo ridículo. Em 2019, representou apenas 1,46% da despesa total; em 2020, 2,2% de despesa, e, em 2021, apenas 2,5% da despesa total do SNS.
Subfinanciamento crónico do Orçamento do Estado, endividamento enorme do SNS, aquisição maciça de bens e serviço a empresas privadas pelo facto do SNS ser incapaz de realizar uma parte por falta de recursos, fragilidades de que se aproveitam os privados para impor ao SNS os seus preços e obter elevados lucros, investimento ridículo, profissionais mal pagos, promiscuidade de profissionais (SNS/privados), eis a situação do SNS e as dificuldades que já enfrentava antes da crise para prestar serviços de saúde à população (ainda está na memoria de todos as camas com doentes nos corredores dos hospitais por falta de instalações), o que foi enormemente agravada pela crise de saúde pública causada pelo “coronavírus”, que tornou mais visível as fragilidades do SNS que o governo tenta ocultar.
O número insuficiente dos profissionais de saúde e a sua situação atual
Um dos argumentos mais utilizados pelo governo na sua campanha junto da opinião pública é o aumento enorme do financiamento do SNS (mais 2.555 milhões € entre 2015 e 2021) e o aumento significativo do número de profissionais de saúde, nomeadamente médicos, nos últimos 5 anos. Em relação ao 1º argumento – aumento de 2.555 milhões € – já mostramos ao que ele se traduziu para o SNS. Em relação ao número e à situação dos profissionais de saúde é o que agora vamos analisar. O quadro 3 mostra a evolução entre 2011/30set.2020
Quadro 3 – Número dos principais profissionais de saúde entre dez.2011 e 30 set.2020 no SNS
Com os governos PS, o número de profissionais de saúde aumentou (+19633), quando durante a “troika”” e o governo PSD/CDS tinha diminuído (-5196) com exceção dos médicos cujo número sempre cresceu. Mas este crescimento não é real porque muitos pediram a redução de horário de trabalho devido às baixas remunerações que recebiam. Em 2009, o governo extinguiu o regime de exclusividade por razões economicistas e apenas um 1/5 dos médicos estão neste regime (obtido antes de 2009); este recusa-se a criá-lo.
A promiscuidade de profissionais que trabalham simultaneamente no SNS e nos privados generalizou-se causando a sua escassez e a destruição do SNS. A degradação em que se encontrava o SNS agravou-se dramaticamente com a crise do “coronavírus” e por falta de planeamento adequado (o governo só toma medidas após os problemas atingirem uma gravidade extrema e depois desculpa-se dizendo que era impossível prever).
A remuneração dos profissionais de saúde degradou-se profundamente com o governo do PSD/CDS com cortes e congelamento de salários, aumento do horário de trabalho sem acréscimo de remuneração, tendo continuado com os do PS com congelamento de remunerações e a não reposição do poder de compra
Quadro 4 – A evolução do poder de compra da Remuneração Base Média líquida dos profissionais de saúde
Entre 2010 e 2020, com exceção dos Assistentes operacionais cujo poder de compra estagnou, todos os restantes profissionais de saúde sofreram uma forte redução do seu poder de compra, atingindo os:
- médicos -18,2%;
- Técnicos de saúde -17,3%;
- enfermeiros -10,3%;
- A. Técnicos -12,3%.
Os baixos salários associados à extinção da exclusividade em 2009, e a recusa em criá-la levou à promiscuidade de muitos profissionais que trabalham ao mesmo tempo no SNS e nos privados o que está a destruir o SNS e a contribuir para a explosão do negócio privado de saúde (hospitais).
Pede-se tanto a estas profissionais, que arriscam a vida, cantam-se louvores, chamam-se heróis, mas o Estado paga salários de “miséria” e recusa a exclusividade. É preciso falar assim para acordar as consciências. E depois espantam-se que faltem profissionais de saúde se são tão mal tratados e dezenas milhares tiveram de emigrar em buscas de melhores condições de vida e carreira profissional
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