A escalada de preços causada pela pandemia, guerra, sanções e retaliações, a perda de poder de compra dos trabalhadores, pensionistas e poupanças, a ausência de medidas para evitar o alastrar da pobreza, e a perda de poder de compra dos trabalhadores da Função Pública de jan.2021 / abr.2022
Neste estudo analiso os efeitos do aumento exponencial dos preços, causado pela pandemia, guerra, sanções e retaliações, para os portugueses. Pensar que se consegue por fim à invasão da Ucrânia pela Rússia e à sua destruição, fornecendo armas e aplicando sanções é uma ilusão, que só prolongará a destruição. Países com mais de 1/2 da população mundial não aplicam as sanções. E que os políticos ocidentais hajam racionalmente e não com a emoção, como um simples cidadão e consigam parar a guerra e chegar a um acordo que dê segurança na Europa. É para isso que são eleitos e pagos. E os jornalistas assumam a sua missão respeitando princípios éticos e não meros propagandistas. A informação em tempo de guerra é uma arma utilizada pelos beligerantes. Só permitem ver o que lhes interessa.
Estudo
A escalada de preços causada pela pandemia, guerra, sanções e retaliações, a perda de poder de compra dos trabalhadores, pensionistas e poupanças, a ausência de medidas para evitar o alastrar da pobreza, e a perda de poder de compra dos trabalhadores da Função Pública de jan.2021 / abr.2022
O gráfico 1 (dados do INE), dá uma ideia clara da escalada de preços em Portugal que está a causar uma profunda degradação das condições de vida, nomeadamente dos trabalhadores e pensionistas e a corroer as poupanças.
Em abril.2022 os preços já eram superiores ao de abril.2021 em 7,3% (em jan.2022 eram superiores aos de jan.2021 em 3,3%). Isto significa que em abril.2022 um salário ou uma pensão de 1000€ correspondia, a preços de abril.2021, apenas a 932€. Com 932€ em abril.2021 comprava o mesmo que em abril.2022 com 1000€. O salário mínimo nacional atual – 705€ – corresponde a preços de abril de 2022 a apenas a 657€ de jan.2022, valor inferior ao salário mínimo nacional de 2021 (665€). O mesmo acontece com as poupanças ou depósitos que os portugueses têm nos bancos, etc. Uma poupança ou um depósito de 50.000€ em abril.2021, em abril.2022 só valia 46.598€ (em abril.2021 com 46.598€ comprava aquilo que em abril.2022 tinha de pagar 50.000€). É desta forma “invisível e incolor” que a inflação está a destruir salários, pensões e poupanças e as condições de vida dos portugueses e a gerar milhares de pobres.
Em contrapartida o Estado ganha com inflação. Um produto que custa 100€, se pagar 23% de IVA o Estado recebe 23€, mas se o preço subir para 110€, o IVA de 23% sobre os 110€ já são 25,30€, ou seja, mais 2,3€. Segundo a DGO do Ministério das Finanças nos primeiros 3 meses (jan./mar.) de 2021 o Estado arrecadou 697,2 milhões de impostos sobre os produtos petrolíferos e energéticos e 4.086,2 milhões € de IVA; e nos primeiros 3 meses (jan./mar) de 2022 o Estado já arrecadou 849,6 milhões € de impostos sobre os produtos petrolíferos (+152,4 milhões € do que em 2021) e 5.092,5 milhões € de IVA (+1.006,3 milhões € do que em 2021). O Estado “lucra” com a inflação.
A guerra na Ucrânia, as sanções ocidentais, e as retaliações da Rússia estão a destruir não só a economia russa, mas também as economias e as sociedades europeias. A economia não escolhe entre bons e maus. A crise alimentar, ao contrário do que os media tentam fazer crer, não vai atingir apenas os países da Africa e da Ásia. Também atingirá os países ocidentais, incluindo Portugal. O nosso país importa 75% do milho que consome, que é indispensável a alimentação animal, e mais de 90% do trigo necessário à humana. A Rússia e a Ucrânia eram os principais exportadores de cereais do mundo. A sua eliminação do mercado mundial está a determinar a subida exponencial dos preços dos cereais (+34%). O mesmo com a energia. A eliminação do petróleo e gás russo, o maior exportador mundial, do mercado onde a Europa adquire, está também a determinar a subida exponencial dos preços (petróleo + 47%; gás: +33%). As alternativas de fornecimento destes produtos essenciais à vida da população e ao funcionamento da economia, que normalmente são referidos nos media, são muitos mais caras, o que determinará preços mais elevados, tornando a vida dos portugueses e a competitividade das “nossas” empresas mais difíceis. A continuação da guerra destruirá ainda mais a Ucrânia tornando a reconstrução mais cara. O FMI já estimou que a ela custará mais de 500.000 milhões € (2,5 vezes o PIB português) que Kiev pretende que seja financiada, em grande parte, pela U.E., ou seja, com receitas de impostos cobrados aos europeus. António Costa, na visita que fez a Kiev em 21/5/2022 prometeu já uma ajuda de Portugal de 250 milhões €, 100 milhões € pagos já em 2022. Internamente Costa recusa-se a fazer qualquer ajustamento nas pensões e remunerações para não pôr em causa a redução défice.
Ninguém está a defender que não se ajude os povos da Ucrânia, o que não é aceitável é ignorar a situação de milhões de portugueses. A continuação da guerra agravará tudo isto muito mais e não resolverá nada. Só um país destruído. Que ninguém tenha ilusões. O próprio FMI afirma que “o dano económico causado pelo conflito contribuirá por uma desaceleração significativa do crescimento económico mundial em 2022 e fará disparar a inflação”. O crescimento da economia mundial diminuirá dos 6,1% em 2021 para 3,6% em 2022 quando antes da guerra tinha previsto 4,9%. Na Zona Euro o crescimento é de 2,8% em 2022, o que dificultará as exportações portuguesas. Devido à crise alimentar e ao agravamento das desigualdades o próprio FMI na sua “carta semanal” de 20/5/2022 escreveu “A agitação social está a crescer criando riscos para a economia global”. A situação é muito grave e perigosa e as reações emocionais dos políticos, compreensíveis no cidadão comum, são inaceitáveis pois só servem para prolongar a destruição de pessoas e bens, e tornar difícil obter um acordo que pare a guerra que está a destruir a Ucrânia e os seus povos, a economia e as sociedades europeias. E aqueles jornalistas que se transformaram em propagandistas se respeitassem a ética da sua profissão dariam uma ajuda importante para uma opinião publica informada e esclarecida vital para parar a guerra pois dos governos pouco há esperar a não ser mais guerra, pois já mostraram a sua incapacidade para obter uma solução que a acabe. Os jornalistas deviam ter presente que a informação em tempo de guerra é uma arma utilizada pelos beligerantes para transmitir só o que lhes interessa e o bom jornalismo não deve ser um mero instrumento nas mãos das partes em conflito.
O EFEITO CORROSIVO DA INFLAÇÃO NO PODER DE COMPRA DOS SALARIOS DO SETOR PRIVADO
O gráfico 2, construído com dados do INE, mostra a evolução da remuneração media mensal total bruta nominal (antes dos descontos para a Segurança Social e IRS) no período mar.2021/mar.2022 no setor privado e, em relação a março de 2022 mostra o efeito corrosivo da inflação na remuneração media mensal (última coluna à direita).
A simples observação dos dados do gráfico revela que a partir de janeiro de 2022 se verifica uma redução continua na remuneração total (inclui tudo o que o trabalhador recebe) média bruta. Entre jan.2022 e mar.2022 diminui em 258€, ou seja -17,2%, o que é bastante significativo. E se deduzirmos na remuneração bruta total de mar.2022, o efeito corrosivo do aumento de preços verificado entre mar.2021 e mar.2022 (5,3%) conclui-se que o poder de compra da de mar.2022 é inferior à de mar.2021 em 3% (valores em euros a vermelho).
APESAR DA CRISE ECONÓMICA CAUSADA PELA GUERRA (inflação) OS APOIOS SOCIAIS EM PORTUGAL AOS MAIS POBRES NÃO FORAM AUMENTADOS, DIMINUIRAM. A SITUAÇÃO DOS PENSIONISTAS AGRAVOU-SE IMENSO
O quadro 1, com dados da Segurança Social e do INE, mostra, contrariamente que pretende fazer crer o governo e alguma comunicação social, que os mais pobres não a estão a receber os apoios sociais que necessitam para viver.
Quadro 1- Variação do valor dos apoios sociais e número de beneficiários desses apoios entre dez.2021 e abril-2022
Como revela o quadro 1, e os dados são da Segurança Social, entre dez.2021 e abril.2022, o poder de compra do subsídio médio de desemprego em abr.2022 era inferior ao de dez.2021 em 23,57€ ( -4,3%) e o poder de compra do valor médio do RSI (Rendimento social de inserção) em abr.2022 era inferior ao de dez.2021 em 5€ (-4,2%). E o poder de compra da prestação social para a inclusão-componente base diminuiu, no mesmo período, 14,21€ (-5,2%).
Entre dez.2021 e abr.2022, o número de beneficiários do subsídio de desemprego diminuiu em 27.295 (-4,7%) e a taxa de cobertura caiu de 47,2% para 43,2% (em dez.2021 por cada 100 desempregados havia 47 que recebiam subsídio desemprego, em abril de 2022 já eram apenas 43 em cada 100). Em relação ao RSI verificou também uma redução de 4.105 (2%) ente dez.2021 e abr.2022. Apenas o número de beneficiários da prestação social de inclusão é que aumentou em 2.503. O agravamento da situação dos pensionistas é dramático. Na Segurança Social a pensão média ronda, em 2022, 430€. Entre jan.2022 e abr.2022, sofreram uma redução no seu poder de compra de 13€, superior ao aumento extraordinário de 10€. Na CGA a pensão media era 1354€ em 2021 que teve uma atualização em 2022 de 0,49% subindo para 1361€. Em abr.2022, em poder de compra, já estava reduzida para 1252€ (-109€).Os pobres ficaram mais pobres e o número de pobres a receber apoios sociais diminuiu apesar da degradação das condições de vida causada pela escalada de preços e as pensões, em poder de compra, já sofreram uma forte redução.
A SITUAÇÃO DOS TRABALHADORES DA FUNÇÃO PÚBLICA, A PERDA SIGNIFICATIVA E CONTINUADA DO PODER DE COMPRA DAS SUAS REMUNERAÇÕES, E A DESTRUIÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA VITAL PARA O PAÍS
Os sucessivos governos e, nomeadamente, os governos de António Costa têm destruído o poder de compra e, consequentemente, têm degradado as condições de vida dos trabalhadores dos trabalhadores das Administrações Públicas (Central, Local e Regional) para reduzir o défice orçamental. Assim aconteceu com Costa/Centeno que até se gabou de apresentar um saldo positivo. O mesmo aconteceu com Costa/Leão, e agora também com Costa/Medina como os valores das Remunerações Base Médias Mensais das diferentes categorias profissionais da Função Pública, divulgados recentemente pela DGAEP (Ministério das Finanças) provam (quadro 1).
Quadro 2 – Remuneração Base Média Mensal (RBMM) ilíquida (antes dos descontos) e líquida (após os descontos) em jan.2021 e em jan.2022 e perda de compra da remuneração base de jan.2022 devido à inflação
Em 2022, a Tabela Única Remuneratória da Função Pública teve um aumento de apenas 0,9%. É a 2ª subida desde 2009 (a primeira foi em 2020, de 0,3%). As Remunerações Base médias mensais ilíquidas (antes de sofrerem os descontos para a CGA/Segurança Social, ADSE e IRS) de jan.2021 e de jan.2022, divulgadas pela DGAEP são as das colunas (1) e (3) do quadro 2. Mesmo estas remunerações médias ilíquidas (antes de quaisquer descontos) em 2022 já eram inferiores às de 2021 (médicos -58€; enfermeiros-12€; polícia judiciária -75€; pessoal de investigação – 6€).Nas colunas (2) e (4) estão as mesmas remunerações base, mas liquidas, (depois de se deduzir os descontos para a CGA/Segurança Social, ADSE e IRS). Na coluna (5) estão os valores da coluna (4) deduzidos da subida de preços entre jan.2021 e jan.2022 (3,3%). E a conclusão que se tira é que os trabalhadores da Função Pública perderam até jan.2022, em média, 1,7% do seu poder de compra quando comparado com o de jan.2021 (médicos -4,9%; enfermeiros -2,3%; Técnicos superiores -2,8%, etc.) É desta forma também que se destrói o SNS e própria Administração Pública. Se a análise for feita com base na inflação registada entre jan.2021 e abril.2022 (8,7%), as conclusões são dramáticas. Para fazer isso calculamos as Remunerações médias líquidas de ján.2022 (coluna 4), a preços de jan.2021, ou seja, deduzindo o efeito do aumento de preços entre jan.2021 e abril.2022. Os resultados obtidos constam da coluna (7). E a conclusão que se tira é que as Remunerações base líquida de jan.2022 da Função Pública já perderem, em média, até abril.2022, 6,5% do seu poder de compra que tinham em jan.2021(Coluna 8, a última à direita, a vermelho). Mas há categorias profissionais onde a perda de poder de compra foi maior (médicos -9,6%; enfermeiros -7,1%; Técnicos superiores -7,6%; assistente técnico -7,8%; assistente operacional -6,8%; informático -7,1%), etc.