Agosto de 1981. Universidade de Montpellier. Nós, bolseiros, tínhamos chegado dos quatro cantos do mundo. Os russos, então soviéticos, não falavam com ninguém — estavam proibidos, ou receavam o controleiro, o único que interagia com a universidade. Os polacos, por um mês fora da cortina de ferro, extravasavam a alegria como crianças em loja de brinquedos.
O controleiro russo tenta conversar com eles. Viram-lhe as costas com desprezo: França é terreno neutro, on en a assez, ils nous emmerdent en Pologne. Acrescentavam, para nossa surpresa: Mas os russos são nossos irmãos! E riam muito da nossa surpresa: A família, ao contrário dos amigos, não se escolhe!
E havia os chineses, inchados com as sua revolução. Todas as manhãs batiam à porta do professor responsável: se os norte-americanos já tinham chegado.
Pois um dia chegaram. E os chineses, na dianteira o minúsculo controleiro, batem à porta do americano para cumprir a missão por que ansiavam, para que se haviam meticulosamente preparado: punho erguido, cantam para o surpreendido gigante barbudo, de calções e em tronco nu, o hino chinês Abaixo o imperialismo yankee!
Esperariam, talvez, reatar ali, no quente Sul de França, os conflitos do Sudoeste da Ásia. Mas o americano, sem compreender a declaração de guerra, tomou a provocação por simpática recepção, agradeceu, e retirou-se para dentro do quarto.
Suponho que no regresso à China terão sido recebidos como heróis, eles que, mais uma vez, e nos antípodas, provaram que o imperialismo americano é um tigre de papel!
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