… distrair; distrair das causas e apontar aos sintomas; distrair da reflexão crítica e favorecer a conversa de café.
Direito à sua opinião tem; direito a contribuir voluntariamente para a desinformação e para o cultivo do ódio, não.
O artigo em causa representa uma visão/posição que é conhecida: não a apresenta na sua totalidade – nem poderia sê-lo – mas os seus contornos estão delineados. E é em relação a esse universo que me pronuncio.
O que da visão nela inscrita resulta demasiadas vezes é um esquecimento selectivo das razões apontadas para os ataques de violência indiscriminada. Reduzir um ataque a uma barbárie irracional é, desde logo, recusarmo-nos a pensar o que pode motivá-la.
E sem compreender essas razões – por menos que concordemos com elas – é incompreender o que move os ataques, o que os torna frequentes e repetíveis, e o papel que podemos desempenhar na mudança dessa realidade.
É a isso que me refiro quando falo de causas e de sintomas: se reagirmos apenas aos sintomas, abdicando de mais liberdades aqui sem compreender o papel que a falta delas (e o que fizemos para isso) noutro lugar desempenha, entraremos numa espiral de redução paulatina de liberdades que, na realidade, não evitará um único ataque.
A expressão utilizada no artigo identificando algo sob ameaça, “os padrões actuais de liberdade, tolerância e pluralismo” europeus, não pode ser dissociada precisamente da acção de uns países noutros, e à acção desenvolvida nesses países relativamente a populações de ascendência terceira.
Não são, como é evidente, realidades mutuamente exclusivas. Por essa razão, qualquer raciocínio que se centre exclusivamente nos atentados perde de vista a sua causa, tratando-os como eventos a-históricos. É uma forma de pensamento muito redutora, mas ideologicamente muito útil a alguns sectores da sociedade e da esfera política-económica.
Por outro lado, o discurso centrado exclusivamente nos sintomas é também útil para reforçar divisões, para cristalizar culpados úteis – em limite, para alimentar um numero de ilusionismo ideológico extraordinariamente eficaz para extremar posições e fazer eleger as piores soluções possíveis.
Já vimos tudo isto acontecer no passado, e estamos a repetir as mesmas soluções-asneira. Não vai correr melhor desta vez. Ver o final do processo e reagir, em vez de reflectir sobre a sua origem, não é ver melhor, é não querer ver de todo.
E tudo o que tem sido feito ultimamente apenas acentua os erros desse esquecimento selectivo, agravando o problema em vez de solucioná-lo.