“Precisamos de estratégias de marketing. Marketing das reformas necessárias”, disse o procurador Deltan Dallagnol em grupo de conversa com colegas em 2016. Dessa necessidade, mostram mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil, surgiu a ideia de fazer um monumento à Lava Jato em Curitiba, escolhido por meio de concurso. O projeto nunca foi concretizado, mas rendeu discussões entre procuradores, com a chefia do Ministério Público Federal no Paraná e até com o então juiz Sergio Moro.
As conversas, travadas no aplicativo Telegram, foram analisadas pela Folha de S.Paulo e publicadas nesta quarta-feira (21). A colegas, Deltan demonstrava entusiasmo com seu projeto megalomaníaco. O plano era realizar um concurso de uma escultura que simbolizasse a operação e mudanças defendidas pelos procuradores, como o projeto das Dez Medidas, que estava em tramitação no Congresso, e a reforma política.
“A minha primeira ideia é esta: Algo como dois pilares derrubados e um de pé, que deveriam sustentar uma base do país que está inclinada, derrubada”, escreveu. “O pilar de pé simbolizando as instituições da justiça. Os dois derrubados simbolizando sistema político e sistema de justiça…”
O plano foi levado pelo procurador, que é chefe da força-tarefa, a Moro. Deltan esperava obter apoio do magistrado para instalar a peça na praça em frente à sede da Justiça Federal, que já virara local de atos em apoio à Lava Jato. Citou a possibilidade de um concurso de escultura “que simbolize o fato de que a lava-jato é um avanço, mas precisamos avançar com reformas, como a reforma do sistema de justiça e do sistema político”.
“Isso virará marco na cidade, ponto turístico, pano de fundo de reportagens e ajudará todos a lembrar que é preciso ir além… Posso contar com seu apoio?”, questionou Deltan. Moro, em conversa no aplicativo, transpareceu contrariedade: “Não é melhor esperar acabar?”
Deltan negou que o propósito fosse “endeusar” a operação e insistiu: “Eu apostaria que tão somente a existência do concurso já será matéria de jornal, estimulará o debate sobre reformas, e frisaremos na proposta do concurso das esculturas a necessidade de reformas e que elas simbolizem as reformas necessárias… sabemos que precisamos ir além, como país, e só estou pensando nisso para fazer tudo o que estiver ao meu/nosso alcance.”
O procurador não era o único a ser tomado pela vaidade. “A Paula mesmo adorou e se empolgou”, disse Deltan a Moro, em referência à procuradora-chefe no Paraná, Paula Conti Thá. Ele argumentou que o plano não seria da equipe da Lava Jato, mas da Procuradoria no Paraná com a Justiça Federal. Mas até Moro, depois de pedir um prazo para pensar, deu opinião contrária: “Melhor deixar para depois. Em tempos de crise, o gasto seria questionado e poderia a iniciativa toda soar como soberba”.
Para o então juiz – hoje ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro (PSL), iniciativas que soam como homenagens “devem vir de terceiros”. No entanto, o teimoso Deltan disse na conversa por meio do aplicativo que não haveria gastos dos cofres públicos e que o “candidato faria com patrocínio privado”.
Procurado, o Ministério Público Federal no Paraná deu a entender que fez mea-culpa. Segundo o órgão, em uma força-tarefa, “diversas vezes iniciativas são cogitadas por seus integrantes ou por terceiros, sendo que muitas não se concretizam após reflexão e ponderações, pelas mais variadas razões”.
Mensagens divulgadas anteriormente pelo Intercept e pelo jornalista Reinaldo Azevedo mostraram o chefe da força-tarefa pedindo, também em 2016, apoio financeiro da 13ª Vara Federal para a produção de um vídeo em apoio às Dez Medidas que seria veiculado na TV. Moro, segundo o diálogo, deixou a possibilidade em aberto e disse que responderia mais adiante.
O vídeo com o roteiro descrito por Deltan de fato foi produzido, mas o Ministério Público Federal afirma que nunca houve direcionamento de recursos da Vara Federal para a campanha das Dez Medidas.
Texto original em português do Brasil
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