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Terça-feira, Julho 16, 2024

Irão ou a Pérsia das Mil e Uma noites

Beatriz Lamas Oliveira
Beatriz Lamas Oliveira
Médica Especialista em Saúde Publica e Medicina Tropical. Editora na "Escrivaninha". Autora e ilustradora.

O assassínio de Soleimani é a ação mais imprudente de política externa do presidente Donald Trump desde que assumiu o cargo. Ao contrário de outros militantes não estatais que os Estados Unidos mataram ao longo dos anos, Soleimani era um alto funcionário de um governo estrangeiro.

Era uma figura popular entre os nacionalistas iranianos. Mas não era popular entre a população iraquiana que parece estar farta de influências estrangeiras no seu País.

Os iraquianos não veem a sua vida melhorar com a presença americana nem sob a influência iraniana.

Soleimani era popular no Irão e agora muitos iranianos que são contra o governo provavelmente ficaram indignados com a morte de um alto funcionário do seu país. Agora sim, todos os lideres iranianos têm argumentos contra a administração americana. O assassínio de Soleimani é a representação do conflito intensificado exponencialmente pelos EUA contra o Irão no Iraque.

O Pentágono (via Mike Pompeo) acusou Soleimani de planear um ataque ao complexo da Embaixada dos EUA em Bagdade, e de estar a planear ataques adicionais contra diplomatas dos EUA e membros do serviço no Iraque e na região. Mas não apresentou quaisquer provas.

Já recentemente, o bombardeamento feito por milícias iranianas tinha morto um empreiteiro americano e vários iraquianos, e os EUA responderam com um ataque aéreo que matou dezenas de milicianos xiitas ligados ao Irão. Dias depois, membros da mesma milícia invadiram a Embaixada dos EUA, quebrando janelas e forçando a equipe diplomática a barricar-se.

Tudo se preparava para este apoteótico e desastroso ataque.

Soleimani era um comandante militar, poderíamos dizer brutal, e oficiais dos serviços secretos iranianos lamentavam a maneira rude e sectária como ele travara a guerra contra o Estado Islâmico no Iraque.

O seu assassínio marca hostilidades diretas entre os Estados Unidos e o Irão. O Departamento Americano de Defesa divulgou uma declaração reivindicando a responsabilidade pelo assassinato de Soleimani, dizendo que ele e a Força Quds eram “responsáveis pela morte de centenas de americanos e membros da coligação e por milhares de feridos”.Embora essa afirmação seja indubitavelmente verdadeira, a declaração não indica o que os Estados Unidos e aliados esperam que aconteça após este passo extremo.

Apesar das suas diferenças com o Irão, nem os governos de Obama nem de George W. Bush acharam prudente matar o comandante militar mais conhecido do Irão.

“Os iranianos vão responder, mas não de uma maneira que desencadeie uma guerra total, porque eles sabem que perderiam”. Com base em precedentes anteriores, qualquer resposta iraniana provavelmente será feita por grupos proxy, e pode incluir cyber ataques contra estrutura críticas. Os americanos no Iraque estão em risco.

No passado, alvejar diretamente as tropas americanas no país era visto como um tabu, dado o objetivo iraniano de impedir escaladas que podiam levar a uma guerra total. Mas com o conflito de repente transformou-se numa guerra quente com o Irão. As consequências podem cair sobre todos nós.

Documentos expostos pelo The Intercept e pelo NY Times expõem a vasta influência do Irão no Iraque, dando conta e referenciando anos de trabalho meticuloso de espiões iranianos para captar os líderes daquele país, pagar a agentes iraquianos que trabalhavam antes para os americanos para se transmutarem em agentes iranianos. Assim se infiltraram em todos os aspetos da vida política, económica e religiosa do Iraque .

Desde a eleição de Donald Trump, os Estados Unidos e o Irão trocam cada vez mais provocações que alimentam o medo de um conflito alargado. Essas provocações culminaram agora no assassínio de Soleimani.

Mas nos primeiros dias da luta contra o ISIS sendo o presidente americano Barack Obama, esses rivais de longa data estavam interessados num objetivo comum: interromper o avanço do Estado Islâmico e destruir o chamado califado. Embora as linhas gerais da guerra convencional contra o ISIS sejam conhecidas há muito tempo, os detalhes da guerra secreta do Irão contra os seus militantes é muito mal conhecida. Relatórios dos serviços secretos iranianos fornecidos ao The Intercept por uma fonte anónima tentam clarificar as relações entre os USA e o Irão. Os relatórios são do Ministério da Inteligência e Segurança do Irão, ou MOIS, um dos dois serviços secretos do país.

O Iraque está sob influência iraniana desde a invasão americana em 2003, que transformou este país numa porta de entrada para o poder iraniano. Quem incentivou este alargamento de influência iraniana no Iraque?

Durante muitos dos últimos anos, relacionar-se com autoridades iraquianas era uma parte essencial do trabalho dos Guardas da Revolução, e foi facilitado pelas alianças que muitos líderes iraquianos fizeram com o Irão quando, num passado não muito longínquo, pertenciam a grupos de oposição que lutavam com Saddam Hussein. Muitos dos principais oficiais políticos, militares e de elementos dos serviços de segurança do Iraque mantinham relações secretas com Teerão, segundo revelam os documentos dos serviços secretos iranianos revelados pelo The Intercept e pelo NY Times.

Já em 2014 haveria um “relacionamento especial” do Primeiro Ministro iraquiano Abdul-Mahdi,que também nomeou vários outros membros importantes do gabinete do ex-primeiro ministro Haider al-Abadi como tendo laços estreitos com o Irão.

Abdul-Mahdi, no exílio, terá trabalhado em colaboração com o Irão enquanto Saddam Hussein estava no poder no Iraque, e teria um “relacionamento especial com o IRI” – a República Islâmica do Irão- quando era ministro do petróleo do Iraque em 2014.

Os iraquianos queriam a demissão deste primeiro ministro demasiado colado ao Irão.

Agora,

  • A presença militar dos EUA no país pode estar encerrada.
  • O primeiro-ministro Adel Abdul-Mahdi reúne o parlamento para uma sessão de emergência onde será discutida a presença de tropas dos EUA no país.
  • Abdul-Mahdi também pediu aos parlamentares que tomem medidas legislativas “para salvaguardar a dignidade, segurança e soberania do Iraque”.
  • Abdul-Mahdi em alta.
  • Os americanos convidados a sair e os Iranianos a ficarem.

Quem ganhou?

 


Por opção do autor, este artigo respeita o AO90


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