Jean-Loup Passek, aquele que Bertrand Tavernier considera uma figura central da História do Cinema Francês (a par de Henri Langlois – fundador da Cinemateca Francesa e seu director durante muitos anos) morreu este fim-de- semana em Paris, com oitenta anos de idade. Cinéfilo e coleccionador, crítico de cinema e programador, Passek andava no início dos anos setenta do século passado a fazer as suas experiências no chamado “cinema directo”.
Oriundo de uma família eslava
Nascido em França mas oriundo de uma família eslava centrava a sua atenção, enquanto fazedor de filmes, nos trabalhadores estrangeiros que por aquela data ajudavam a construir a França. Nas obras do metro de Paris travou conhecimento com alguns deles e, em particular, com um grupo de portugueses de Melgaço e da Nazaré. O relacionamento com os protagonistas do objecto cinematográfico deu, de imediato, origem à criação de fortes relações de amizade. Por essa via e também pelo conhecimento do cinema português, em particular de autores como António Campos, Noémia Delgado e António Reis, que navegavam nas mesmas águas, foram-se tornando cada vez mais estreitas as suas relações com Portugal. Daí à aquisição de uma casa no concelho de Melgaço foi um pequeno passo.
E assim temos, indelevelmente ligado ao nosso país o fundador e director do Festival de La Rochelle, o responsável da área de cinema do Centro Georges Pompidou e da “Câmara de Ouro” do Festival de Cannes, mas sobretudo o responsável pelo monumental ‘Dictionnaire Larousse du Cinéma’, a “bíblia” de todos os cinéfilos e cineclubistas na era pré-internet. E quando, aproximando-se dos setenta anos de idade, pensou em doar o espólio que foi acumulando durante a vida Melgaço foi o local escolhido.
Museu de Cinema de Melgaço
Em 2005 foi inaugurado o Museu de Cinema de Melgaço – Jean Loup Passek que acolhe inúmeros instrumentos de animação de imagens e de projecção de filmes, livros e catálogos, milhares de cartazes, centenas de milhares de fotografias, enfim, uma impressionante memória de mais de cem anos da História do Cinema. Os efeitos colaterais da existência do museu acabaram por surgir e a Associação Ao Norte passou a organizar na vila fronteiriça do Alto Minho o festival “Filmes do Homem” em que o tema da emigração tem um papel muito especial. E pronto, aqui está contada, muito resumidamente a forma como um francês de ascendência russa se tornou também um pouco português.
Em Agosto passado o Município de Melgaço atribuiu a Passek o título de Cidadão de Honra e em Setembro, na Cinemateca Portuguesa, o Secretário de Estado da Cultura fez entrega da Medalha de Mérito Cultural. O estado de saúde de Jean-Loup Passek já não permitiu que estivesse presente e a distinção foi recebida pelo nosso amigo Bernard Despomadères, outro francês com o coração dividido, grande responsável pela divulgação da cultura francesa em Portugal (e em particular no Porto) e que deu uma contribuição decisiva para a existência e afirmação do Museu de Melgaço.