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Segunda-feira, Novembro 4, 2024

José Augusto Seabra

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1937 – 2004)

Poeta, ensaísta e professor, cidadão de grande estatura intelectual. Durante a Ditadura fascista militou activamente na Resistência. Foi preso, torturado, julgado num Tribunal Plenário fascista e condenado. Mais tarde, viu-se forçado a exilar-se. Regressou com o 25 de Abril e foi deputado e ministro da Educação.

Início de vida e actividade cívica

José Augusto Seabra com 12 anos, em Novembro de 1949, iniciando o 3ºano do Liceu Alexandre Herculano

José Augusto Baptista Lopes e Seabra nasceu a 24 de Fevereiro de 1937, filho de José Luís Rodrigues Lopes de Matos e Seabra e de Alice Preciosa de Sousa Baptista, uma família modesta, e é natural da freguesia de Vilarouco, concelho de S. João da Pesqueira (Alto Douro). Viveu a infância em Peroselo, no concelho de Penafiel, e estudou no Porto, nos Liceus Alexandre Herculano e D. Manuel II. Neste último, foi um dos fundadores de O Mensageiro, jornal académico em que partilhou algumas “inquietações intelectuais” com alguns condiscípulos. Do Porto rumou a Coimbra, em cuja Universidade se inscreveu no curso de Direito e onde foi encarregado de organizar um núcleo do Movimento de Unidade Democrática (MUD) Juvenil.

A sua actividade conspirativa não passaria despercebida à PIDE, que lhe passou busca ao quarto após uma denúncia com origem no Porto. Torturado em Coimbra e mais tarde no Porto, onde a PIDE o obrigou a vários dias de “estátua”, cumpriu mais de seis meses de prisão preventiva em regime de isolamento nos calabouços dessa polícia política. Julgado no Tribunal Plenário do Porto com quase meia centena de arguidos (quase todos estudantes), entre os quais se encontrava Agostinho Neto (futuro presidente de Angola), foi condenado a dez meses de prisão e cinco anos de privação dos direitos políticos.

Apresentando-se na Cadeia da Relação do Porto, foi de imediato transferido para Santa Cruz do Bispo (arredores do Porto) e, alguns dias mais tarde, para o forte de Peniche, onde teve como companheiros de cela Raul de Carvalho, Ângelo Veloso e Hernâni Silva e aí permaneceu até às vésperas do Natal de 1957.

Em 1958, José Augusto Seabra participou activamente na campanha do general Humberto Delgado e, inspirado pelo exemplo cívico de D. António Ferreira Gomes, Bispo do Porto, iria juntar-se a um vasto conjunto de estudantes, artistas, jornalistas e outros intelectuais, para fundar, no Porto, um movimento a que deram o nome de Convívio (dele surgindo a revista Coordenada).

Para terminar o curso de Direito, José Augusto Seabra optou por transferir-se para a Faculdade de Direito de Lisboa, a partir do ano lectivo 1958/1959, procurando fugir, assim, à militância política no Porto. Contudo, acabou por envolver-se movimento associativo académico de Lisboa e por ser dirigente da Associação de Estudantes da Faculdade de Direito (de 1959 a 1961).

Reanima então o jornal Quadrante, participa em acções antifascistas e colabora com o Partido Comunista Português. Após a suspensão da revista Coordenada, colabora noutras publicações, tais como a Seara Nova, Bandarra e Notícias do Bloqueio. Organizou o seu primeiro livro em 1961 – Inicialmente intitulado A Solidão e o Voo – que acabaria por ser publicado, nesse mesmo ano, com o título A Vida Toda, e onde constam poemas desde 1955. Ainda em 1961, com “um grupo de poetas inconformados”, fundou um Clube de Poesia.

Fuga para o estrangeiro

Logo após o fim do seu curso, que terminou em 1961, começa a preparar a fuga para o estrangeiro, para evitar assim a mobilização militar, que o levaria seguramente à guerra em África que ele recusava. Escondendo da própria família essa intenção (a única excepção seria o Dr. Mário Cal Brandão, seu advogado e amigo), no final de 1961 rumou a Paris onde encontrou outros exilados políticos e se ligou à actividade oposicionista dos estudantes portugueses em França.

Na capital francesa, uma vez que de pouco lhe servia a licenciatura que trouxera de Portugal, decidiu matricular-se em Ciências Políticas. Já com proximidade aos estudantes do PCP exilados em Paris, não tardou a ser eleito presidente da União dos Estudantes Portugueses em França (UEPF), uma situação que lhe permitiu inúmeros contactos com organizações estudantis de outros países, junto das quais a UEPF desenvolvia um trabalho de divulgação da situação em Portugal, do regime e da guerra colonial.

No Verão de 1962, deslocou-se a Leninegrado, na União Soviética, como representante da UEPF ao Congresso da União Internacional de Estudantes (UIE). No caminho, visitou Praga, na companhia do estudante brasileiro Nelson Vanuzzi, membro da direcção da União Nacional dos Estudantes do Brasil. À capital da Checoslováquia regressaria nos inícios de 1963 para se encontrar com Jiri Pelikan, presidente da UIE. De Praga partiu novamente rumo a Leninegrado, para se encontrar com Helena Gulobeva, professora e tradutora de Português, já que era sua intenção apresentar-lhe um plano para a edição de uma Antologia da Poesia Portuguesa Moderna que lhe havia sido encomendada no Congresso da UIE.

Paris, Moscovo, Argel e de volta a Paris

Entretanto, através do PCP, recebeu um convite da Rádio Moscovo (emissão para Portugal, em língua portuguesa), para aí trabalhar como revisor literário, o que o levou a interromper os seus estudos em Ciências Políticas em Paris. Em 1963 iria, assim, deixar a família em Paris (mulher e filhos, que entretanto regressariam a Portugal), e instalar-se na URSS, onde viveu uma experiência complicada – que consideraria, mais tarde, “dolorosa e dramática” – e, na sequência da qual, teve que aguardar, durante um ano, para poder sair de Moscovo. Conseguiu então um visto para a Argélia, onde estava instalada a Frente Popular de Libertação Nacional (FPLN), e em Argel aderiu ao Movimento de Acção Revolucionária (MAR) que estava representado nessa Frente.

Em Argel, leccionou na Universidade local e ligou-se à Frente Portuguesa de Libertação Nacional, de Humberto Delgado (organização criada pelo General, em divergência com a Frente Popular de Libertação Nacional).

De regresso a Paris, funda, com outros, a Liga de Unidade e de Acção Revolucionária (LUAR), chegando mesmo a integrar o seu Conselho Superior.

Em 1971, na Université de Paris III – Sorbonne Nouvelle, doutorou-se com uma tese sobre Fernando Pessoa, orientada por Roland Barthes, «Analyse structurale des Hétéronymes de Fernando Pessoa: du Poémodrame au Poétodrame», depois publicada em Portugal e no Brasil. Posteriormente, ainda na capital francesa, veio a exercer funções docentes na Université de Paris X e na École Normal Supérieur, até ao seu regresso a Portugal, após o 25 de Abril.

Adere ao Partido Popular Democrático após o 25 de Abril

Depois do 25 de Abril, José Augusto Seabra aderiu ao Partido Popular Democrático (PPD), do qual sairia em ruptura no Congresso de Aveiro, em Dezembro de 1975. Foi Deputado desse partido à Assembleia Constituinte e à Assembleia da República. Foi Ministro da Educação do IX Governo Constitucional, de Junho de 1983 a Fevereiro de 1985, e pediria a demissão do cargo, alegando “razões de coerência ética e política”. Embaixador de Portugal na UNESCO de 1986 a 1992, integrou também o seu Conselho Executivo. Exerceu igualmente funções diplomáticas na Índia, Roménia e Argentina.

Poeta, ensaísta e professor

De 1974 a 1985 foi Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, aí leccionando literatura e fundando também o Centro de Estudos Pessoanos e o Centro de Estudos Semióticos e Literários. A sua actividade docente estender-se-ia posteriormente a outras universidades nacionais e estrangeiras (nomeadamente a de Santiago de Compostela) onde ministrou cursos e seminários, orientando mestrados e doutoramentos.


Jornalista Fernando Assis Pacheco entrevista José Augusto Seabra, poeta, sobre a sua vida pessoal e a sua escrita. (Arquivos RTP – Ver entrevista)

Detentor de vários prémios e condecorações, fez parte de diversos organismos internacionais com intervenção nas áreas da literatura, cultura e defesa dos direitos humanos. De 1980 a 1999 dirigiu, no Porto, a revista Nova Renascença, que refundara , escrevendo e construindo uma obra considerável. Colabora na revista Persona.

Publica com sua esposa Norma Tasca, em 1993, a obra Enlace, no dia do seu casamento católico, obra escrita a duas mãos, em enlace, dedicada à mãe Anísia. Em 2004 publicou o livro de memórias, “De Exílio em Exílio. Resistências e Errâncias (1953-1963)”, o primeiro e afinal único volume em virtude do seu falecimento.

José Augusto Seabra foi um intelectual comprometido com causas que considerava justas, e fez da vida um combate permanente. A sua constante intervenção cívica baseada em princípios da ética republicana, em prol de uma Nova Renascença portuguesa, explica que, tenha fundado no Porto, com outros democratas, um Centro de Estudos Republicanos com o nome de Sampaio Bruno, o filósofo, que muito admirava e a quem dedicou alguns estudos.

Iniciado maçon, pertenceu à Loja União, do Porto, do Grande Oriente Lusitano.

«Poeta dos mais originais e mais sensíveis das últimas décadas da literatura portuguesa, as suas principais referências nacionais eram Camões, Camilo Pessanha, António Nobre, Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro e Jorge de Sena. Entre todos, talvez tenha sido António Nobre (também poeta do exílio) aquele que mais amou». Não admira, pois, que, por mais de uma vez, o tenha homenageado. A última foi em Paris, nos inícios de Junho de 2003. Com um restrito número de amigos reconstituiu o percurso poético e académico de António Nobre na capital francesa. Seria justamente nos arredores da capital francesa (em Villejuif) que José Augusto Seabra viria inesperadamente a falecer no dia 27 de Maio de 2004. Tinha 67 anos de idade[1].

Obra publicada

Poesia:

  • 1961 – A Vida Toda
  • 1967 – Os Sinais e a Origem
  • 1972 – Tempo Táctil
  • 1977 – Desmemória
  • 1980 – O Anjo
  • 1985 – Gramática Grega
  • 1990 – Fragmentos do Delírio
  • 1990 – Do Nome de Deus
  • 1993 – Enlace, em colaboração com Norma Tasca
  • 1996 – Sombras de Nada
  • 1997 – Amar a Sul
  • 1999 – Conspiração da Neve
  • 2001 – Oximoros
  • 2002 – Tangos Mentais.

Ensaio:

  • 1974 – Fernando Pessoa ou o Poetodrama
  • 1980 – Poética de Barthes
  • 1985 – O Heterotexto Pessoano
  • 1986 – Cultura e Política ou a Cidade e os Labirintos
  • 1994 – Poligrafias Poéticas
  • 1993 – Edição crítica de Mensagem e Poemas Esotéricos, de Fernando Pessoa
  • 1996 – O Coração do Texto | Le Coeur du Texte
  • 1998 – Tradução de Poemas de Mallarmé lidos por Fernando Pessoa.

livro O heterotexto pessoano, ensaios de José Augusto Seabra

O heterotexto pessoano, ensaios de José Augusto Seabra

 

Fernando Pessoa ou Poetodrama, Livro de José Augusto Seabra

Fernando Pessoa ou Poetodrama, Livro de José Augusto Seabra

 

 

Fragmentos do delírio, Livro de José Augusto Seabra

Fragmentos do delírio, Livro de José Augusto Seabra

 

A luz de creta, Livro de José Augusto Seabra

A luz de Creta, Livro de José Augusto Seabra

 

[1] Deixou um enorme vazio (sobretudo na sua mui amada cidade do Porto) que até hoje ainda não foi devidamente preenchido. Em Portugal, na Galiza (onde tinha inúmeros amigos e admiradores), em França e noutros países, hão-de guardar-se, enquanto viverem os que tiveram o privilégio de o conhecer e com ele conviver, as lembranças e as saudades do embaixador José Augusto Seabra, um verdadeiro apóstolo da República, da Cultura e da Liberdade»

Dados biográficos:

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