“Todos os meus direitos políticos estão intactos e tenciono exercê-los”
Na primeira intervenção pública desde que está em liberdade, José Sócrates participou numa conferência sobre Justiça e Política, em Vila Velha de Ródão, Castelo Branco, distrito onde iniciou a vida política. Começou por afirmar que não tenciona abandonar a vida política, apesar de ser arguido no processo Marquês. “Quero deixar claro que todos os meus direitos políticos estão intactos e que tenciono exercê-los”.
Antes de falar no caso que o colocou em prisão preventiva quase dez meses, Sócrates agradeceu o apoio recebido enquanto esteve na cadeia de Évora e abriu a conferência com uma afirmação: “não aceito o banimento que quiserem fazer-me da vida pública e da vida política do nosso país”. Esclareceu também que está em pleno direito dos seus direitos políticos. “E se alguém lhe passou pela cabeça que eu iria prescindir dos meus direitos políticos e dos direitos de intervenção, civicamente, na política, estão equivocados”, afirmou Sócrates.
O tempo de prisão preventiva foi um dos temas dominantes, tendo como base o seu próprio caso de ser arguido e estar há onze meses sem acusação formada. “Quando se tem uma atitude destas, onze meses sem acusação, o Estado Português perde autoridade moral para falar de direitos individuais de outros Estados”, disse, referindo a situação de Luaty Beirão em Angola e um outro cidadão português que esteve preso em Timor durante vários meses sem acusação.
“Deve governar quem tem maioria no parlamento”
José Sócrates comentou também a actualidade política e a polémica de quem deve governar o país. “Deve governar quem tem maioria no parlamento. Melhor dito, não pode governar quem tem a maioria do parlamento contra ele”, afirmou o ex-primeiro-ministro do PS.
E aproveitou para responder a quem refere que Sócrates também governou em minoria. O meu governo era legítimo, não houve rejeição do parlamento e no primeiro momento em que o parlamento me mostrou que tinham uma maioria contra mim, demiti-me imediatamente”, afirmou.
Num recado directo para Belém, disse ainda que nessa altura do chumbo ao PEC 4 que provocou eleições antecipadas, não ouviu alguém apelar à responsabilidade. “Nessa altura não ouvi, e vou citar, que houve interesses conjunturais que se sobrepuseram ao superior interesse nacional”, disse, referindo um dos argumentos de Cavaco Silva sobre a alternativa de governo proposta pelo PS.
Atacou também Cavaco Silva sobre a manifesta rejeição do PCP e BE numa solução alternativa, com o argumento que são partidos contra a União Europeia e contra a Nato. “Ninguém pode ser privado dos seus direitos políticos por causa das suas convicções”, disse citando a Constituição da República. “Eu sou a favor da constituição, mas sou até mais a favor de um país onde se possa ser contra a constituição. Sou mais contra aqueles que não cumpriram a constituição”, afirmou Sócrates. E acrescentou em modo filosófico: diz-se que o Presidente da República é a pedra angular do sistema, que está no centro, e que não deve mexer, porque se mexe desaba tudo”, disse o ex-governante do PS.
Neste regresso à vida pública, José Sócrates foi recebido na Casa das Artes de Vila Velha de Ródão por centenas de simpatizantes, foi aplaudido de pé e no final, distribuiu abraços e beijinhos pelos presentes, tal como o fez durante décadas de vida política e como se o tempo não tivesse passado por Évora.