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Segunda-feira, Novembro 4, 2024

Por que o julgamento de Lula põe em risco a democracia?

Tereza Cruvinel, em Brasília
Tereza Cruvinel, em Brasília
Jornalista, actualmente colunista do Jornal do Brasil. Foi colunista política do Brasil 247 e comentarista política da RedeTV. Ex-presidente da TV Brasil, ex-colunista de O Globo e Correio Braziliense.

BRASIL

Juristas respeitados apontam falhas na sentença do juiz Sérgio Moro que permitem a absolvição do ex-presidente Lula pelos desembargadores do TRF-4. Este seria o desfecho natural de um processo em que faltam provas e sobram convicções, permeado por contradições, argumentos flácidos e invenções jurídicas, como o tal “ato de ofício indeterminado”. Vale dizer, Lula teria recebido vantagem indevida mas o juiz não sabe em troca de quê. A absolvição seria desfecho natural dentro do devido processo legal e da normalidade democrática. Ocorre que, desde o golpe, e mesmo antes, desde que a Lava Jato começou a atropelar direitos e garantias em nome de uma suposta missão purificadora, a exceção e o arbítrio foram se impondo sob a batuta de um segmento do Judiciário e de suas forças auxiliares. Por isso defender Lula e seu direito de ser candidato, e denunciar o risco de uma manipulação judicial no julgamento de amanhã, para selecionar os candidatos à eleição presidencial, é defender a democracia.

As evidências de que o processo contra Lula tramitou num tempo programado, com o objetivo de produzir sua inabilitação eleitoral, estão claras para todos. O parecer do relator foi produzido em tempo recorde, bem como o do revisor, que em apenas dez dias pediu a marcação do julgamento. Sete recursos deviam ter sido analisado antes. Se o TRF-4 atropela prazos e fura fila, fica difícil acreditar num julgamento justo e técnico, que exigiria o desmonte da frágil sentença de Moro.

Se o Judiciário se prestar à condução de um processo destinado a selecionar os candidatos a presidente, barrando Lula, estará atentando contra a soberania popular. É na eleição que ela valer seu primado, com a livre escolha de representantes e governantes. Quando um poder do Estado pisoteia a soberania popular, suspendendo, proibindo ou manipulando eleições, estamos no Estado de Exceção.

Na esteira da Lava Jato o Judiciário foi se entregando a um ativismo que hipertrofiou seu poder em relação ao Legislativo e ao Executivo, desmoralizados pela ação anti-política de Curitiba. Mas o que a Constituição prevê é o equilíbrio e a equipotência entre os poderes, não admitindo em nenhuma passagem que o Judiciário possa controlar o processo eleitoral, barrando candidatos em sintonia com suas próprias preferências ideológicas e os interesses das forças dominantes, nacionais e internacionais.

Não se trata, como insistem alguns defensores da condenação do ex-presidente na mídia, de advogar uma excepcionalidade para ele na aplicação da Lei da Ficha Limpa, por ele sancionada. Ainda que o ex-presidente não fosse o líder em todas as pesquisas, a inabilitação através de processo discutível, desprovido de provas incontestes, amplamente contestado em seus aspectos técnicos, seria da mesma forma uma ofensa ao regime democrático. Não se trata, portanto, de colocar Lula acima da Lei mas de colocar o aparelho judicial nos limites da lei. Não se trata da sorte pessoal de Lula mas do destino da democracia brasileira.

E trata-se também de nosso futuro, em termos mais práticos. Se Lula for impedido, que legitimidade terá o eleito? Uma sombra irá pairar sempre sobre seu mandato, na forma de uma restrição severa: “só se elegeu porque Lula não disputou”. E com isso, a crise de legitimidade que desde o golpe impede a estabilização política e econômica do país persistirá. E talvez até se aprofunde.

A autora escreve em Português do Brasil

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