Eric Nepomuceno, Jornalista pela Democracia, avalia que a resposta de Leonardo Boff a Ernesto Araújo “foi absolutamente cristã: contundente, tão dura como merecida, mas ao mesmo tempo piedosa. Tanto assim, que perdeu parte de seu precioso tempo para colocar as coisas em seu lugar”
Conheci Leonardo Boff lá por 1984 ou 85, quando ele foi castigado pelo então cardeal Ratzinger, que das fileiras da juventude nazista saltou para a igreja e acabou virando Papa. Mas foi a partir de 1992 que nos aproximamos, e nos tornamos fraternos amigos para sempre.
Eu, ateu irremediável, e Leonardo, um cristão absoluto, um católico inoxidável, que traz com ele e espalha por onde anda a visão de um Cristo admirável até por quem, como eu, duvida da sua existência…
Com Leonardo tenho, às vezes, como aliás com meus amigos mais fraternos, divergências.
Por mais, porém, que eu discorde em pontos específicos, em momento algum deixei de sentir por ele um respeito absoluto.
Posso assegurar que é das pessoas mais íntegras que conheci na vida, e conheci muitas e fui e sou amigo de várias.
Pois nesta quinta-feira ganhei um motivo a mais para reforçar o orgulho que sinto por essa nossa amizade: Leonardo foi criticado e ofendido por Ernesto Araújo, o ministro de Aberrações Exteriores do governo encabeçado por uma figura chamada Jair Messias.
Fiquei imaginando qual seria a minha reação se semelhante sacripanta tivesse elogiado esse meu amigo fraterno.
De verdade, eu teria de rever os últimos 28 anos da minha vida para tentar entender como é que consegui gostar, respeitar e admirar tanto alguém que fosse elogiado por Ernesto Araújo.
Pois a resposta de Leonardo foi absolutamente cristã: contundente, tão dura como merecida, mas ao mesmo tempo piedosa. Tanto assim, que perdeu parte de seu precioso tempo para colocar as coisas em seu lugar.
Pensando bem, acabo de descobrir uma nova divergência minha com Leonardo Boff: perdeu parte de seu precioso tempo respondendo a um boçal, um mentecapto desequilibrado e sem rumo.
Já escrevi e disse, e repeti e repito, que com Jair Messias e seu ministro de Aberrações Exteriores o meu país sumiu do mapa do mundo. O que Ernesto Araújo fez o Itamaraty regredir em um ano levará um tempo enorme para ser reconstruído. Nem na ditadura militar, que Jair Messias nega ter existido, a imagem brasileira mundo afora foi tão enxovalhada, tão desprezada, e nunca nossa política externa causou tamanha preocupação.
Ernesto Araújo tem características que merecem ser reconhecidas. Por exemplo: dispondo de um admirável quadro de funcionários altamente qualificados, demonstrou um talento olímpico para descobrir as piores mediocridades e dar a elas postos importantes.
Os melhores quadros da casa foram destinados ao que é chamado, no Itamaraty, de DEC (Departamento de Escadas e Corredores). Sei, através de amigos diplomatas aposentados que mantêm contato com colegas mais jovens, que boa parte de embaixadores com larga folha de bons serviços prestados a este país náufrago passa o tempo na biblioteca do ministério, lendo e tomando notas, para não precisar tropeçar com as mulas sem cabeça promovidas por Araújo.
O Brasil teve, em 2019, o pior resultado de sua balança externa desde 2015, quando as complicadas aspirações de Aécio Neves desandaram o golpe institucional que se concretizaria no ano seguinte.
Em parte, esse resultado se deu pela catástrofe vivida pela Argentina no último ano de Mauricio Macri, candidato de Jair Messias à reeleição e que foi exemplarmente catapultado para longe.
Mas em boa parte, em enorme parte, pela destroçada imagem do país exibida mundo afora por Jair Messias, seu trio de filhos hidrófobos, seus assessores, a começar por um certo Filipe Martins, e, claro, por Ernesto Araújo, um ridículo que brilha entre ridículos.
Que sorte, meu querido Leonardo, que ele atacou você com a grosseria habitual dos que carecem de qualquer vestígio de noção.
Imaginou se ele, em lugar de atacar, tivesse elogiado? Eu perderia o sono…
por Eric Nepomuceno, Jornalista e escritor | Texto em português do Brasil
Fonte: Brasil247