Obra de grande força plástica no jogo da luz e da cor. Grande dinamismo da figura central da “Liberdade”, aludindo à revolução liberal de 1830. Esta libertadora é uma mulher do povo, descomposta mas corajosa e que incita os seus camaradas à vitória. O pequeno Gavroche, à direita do observador, ficaria gravado nas páginas dos “Miseráveis”, de Victor Hugo.
Pela primeira vez a pintura moderna assume esta assumpção da luta política. O visionamento do tema, não obstante a mistura de “um chapéu alto”, é acerca das virtudes do republicanismo revolucionário. O Romantismo pictórico largava a sua fonte classicista e passava a focar elementos concretos da vida contemporânea.
Nota da Edição
Eugène Delacroix (1798-1863)
Pintor francês, nasceu em Charenton-Saint-Maurice. Começou seus estudos de pintura em 1813 na École des Beaux-Arts (Escola de Belas Artes), no ateliê de Pierre-Narcisse Guérin, onde foi colega de Theodore Géricault.
Sob a influência do realismo romântico de Géricault, Delacroix expôs no Salão de 1822 a tela “Dante et Virgile aux enfers” (1822), também chamada de “A barca de Dante”, que provocou críticas favoráveis e contrárias. A polêmica acentua-se quando apresenta no Salão de 1824 “Scènes des massacres de Scio” (1824), ou “O massacre de Quios”, narrando episódios dramáticos da guerra da independência da Grécia contra a Turquia. Em 1828, refaz a tela, separando as pinceladas e avivando o colorido, após ter visto em Londres, em 1827, obras de Bonington e de John Constable.
Com a tela “La mort de Sardanapale” (1827), “A morte de Sardanápalos”, de composição extremamente movimentada e cores vivas, passa a ser considerado como o chefe da escola romântica francesa de pintura. Cada vez mais se inspira em temas românticos ou em episódios medievais. Converte-se então no alvo principal dos acadêmicos da Escola de Belas Artes, adeptos do neoclassicismo de David e Ingres, seu rival na época.
Comovido com os acontecimentos políticos de Julho de 1830, pinta uma alegoria à liberdade, à França e ao seu povo, que representa em suas diversas classes sociais: “A Liberdade guiando o povo” (1831), hoje no Museu do Louvre.
De Janeiro a Julho de 1832, visitou Marrocos como membro de uma delegação francesa. Seduzido pelo exotismo e pela luminosidade do país, executou uma série de desenhos e aguarelas sobre os costumes pitorescos dos árabes, que mais tarde utilizará em telas como “Les femmes d’Alger” (“As mulheres de Argel”).
Em 1836 executa, para o governo, uma série de decorações, entre as quais a do salão do rei no palácio Bourbon (1833-1836) e a da biblioteca do palácio de Luxembourg (1849-1861). Um de seus maiores murais é o da capela dos anjos da Igreja de Saint-Sulpice (1849-1861). Especialmente no quadro que representa Jacó em luta contra o anjo, Delacroix revela-se o último grande muralista de tradição barroca.
Isolamento
Em 1840, com a técnica já madura, conserva a sua originalidade, mas as suas pinceladas vigorosas e separadas, a sua cor de tons dourados e a sua composição barroca lembram Rubens e Paolo Veronese. Apesar de sua popularidade entre os intelectuais jovens, de seu sucesso de público e mesmo do apoio do governo, Delacroix ainda é hostilizado pelos neoclássicos, que só o aceitam em 1857.
Passa os últimos anos de vida em reclusão, isolado em seu ateliê, onde morreu. Em 1865 apareceu a primeira edição do seu “Diário”, provando que, além de grande pintor, Delacroix era excelente escritor, pensando profundamente sobre a sua arte.
Delacroix restituiu à pintura, além do movimento e da cor, o seu caráter passional. A sua obra revela o individualismo exaltado pela Revolução Francesa e pela epopéia napoleônica. O seu objectivo é criar emoção e energia, exaltadas por fortes contrastes de cores, por um desenho torturado e por uma composição com movimento intenso. Traduziu em pintura os sentimentos contidos em Goethe, Beethoven, Victor Hugo e Baudelaire. Não deixou uma escola, mas os impressionistas e os neo-impressionistas sofreram a sua influência.