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Sábado, Dezembro 21, 2024

Limites à aposentação antecipada

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

O projecto de Decreto-Lei do actual Governo, só permite aos trabalhadores da Função Pública a aposentação antecipada se aos 60 anos tiverem pelo menos 40 anos de contribuições. Se não tiverem nunca a poderão obter

Neste estudo analiso o projecto de decreto-lei enviado pelo actual governo aos sindicatos da Função Pública sobre o novo regime de aposentação antecipada para estes se “pronunciarem”, mostrando que ele visa reduzir drasticamente o acesso a ela, transformando-a numa caricatura de aposentação antecipada, podendo-se mesmo dizer que, na prática, é eliminado o direito a aposentação antecipada para a esmagadora maioria dos trabalhadores da Função Pública como a análise feita prova.

Espero que este estudo possa ser um contributo para alertar os trabalhadores da Função Pública e os seus sindicatos para este projecto, e que ele se for aprovado e publicado a esmagadora maioria dos trabalhadores das Administrações Públicas inscritos na CGA perderão, na prática, o direito à aposentação antecipada.

Estudo

O projecto de Decreto-Lei do actual Governo, só permite aos trabalhadores da Função Pública a aposentação antecipada se aos 60 anos tiverem pelo menos 40 anos de contribuições. Se não tiverem nunca a poderão obter

O governo enviou aos sindicatos um projecto de decreto-lei sobe a aposentação antecipada para estes se pronunciarem. Neste estudo faz-se uma análise do essencial desse projecto.

Actualmente os trabalhadores da Função Pública podem-se aposentar antecipadamente se tiverem pelo menos 55 anos de idade e 30 anos de serviço, mas com dois cortes significativos na sua pensão (um primeiro corte, de 68,5% por ter menos 11 anos 5 meses do que a idade de acesso normal a aposentação que, em 2019, é 66 anos e 5 meses; e um segundo corte na pensão de 14,67% que resulta da aplicação do factor de sustentabilidade). E se tiver mais de 40 anos de serviço não tem qualquer bonificação contrariamente ao que sucede no sector privado.

O projecto de decreto-lei do actual governo enviado aos sindicatos, para entrar em vigor em Outubro de 2019, portanto no mês das eleições, segundo a entrevista dada pela Secretária de Estado da Segurança Social, só permite a aposentação antecipada ao trabalhador se aos 60 anos de idade tiver pelo menos 40 anos de descontos (contam os que eventualmente tenha de Segurança Social). Se não tiver 40 anos de descontos aos 60 anos de idade nunca se poderá aposentar antecipadamente.

Se aos 60 anos não tiver 40 anos de descontos só se poderá aposentar quando atingir a idade de acesso normal a aposentação que, em 2019, são 66 anos e 5 meses e que aumenta, em média, um mês todos os anos. Se o trabalhador da Função Pública tiver 40 anos de descontos aos 61 anos, ou aos 62 anos, ou depois, mesmo com 40 anos ou mais de serviços, não tem o direito de se aposentar antecipadamente. Parece mentira, mas isso está no projecto de decreto-lei do actual governo PS que introduz uma forte e inaceitável restrição à aposentação antecipada, transformando-se numa caricatura, podendo-se mesmo dizer que, na prática, é eliminado o direito a aposentação antecipada para a esmagadora maioria dos trabalhadores da Função Pública. É o “presente” do PS nas eleições de Outubro para os trabalhadores da Função Pública.

Mas analisemos em pormenor o projecto de decreto-lei que o actual governo pretende aplicar à Função Pública, que já aplicou aos trabalhadores do sector privado, infelizmente com pouca oposição quer dos sindicatos quer da Assembleia da República. Espero que agora não aconteça o mesmo pois é mais uma forma encapotada de austeridade que tem passada despercebida à opinião pública (o governo e todos os seus defensores nos media tudo têm feito para isso).

O que diz o projecto de Decreto-Lei do Governo que foi enviado aos sindicatos sobre o direito a aposentação antecipada: a confirmação de uma caricatura

O artº 4º do projecto de Decreto-Lei do governo altera o nº1 do artº 37º-A do Estatuto da Aposentação que tem actualmente a seguinte redacção:

Podem requerer a aposentação antecipada, independentemente de submissão a junta médica e sem prejuízo da aplicação do regime da pensão unificada, os subscritores da Caixa Geral de Aposentações com, pelo menos, 55 anos de idade e que, à data em que perfaçam esta idade, tenham completado, pelo menos, 30 anos de serviço”.

E substitui esta redacção por um novo nº1 com a seguinte redacção: só

podem requerer a aposentação antecipada…. os subscritores que tenham, pelo menos, 60 anos de idade e que, enquanto tiverem essa idade, tenham completado, pelo menos, 40 anos de serviço em efectivo de funções”.

Esta disposição do projecto do governo restringe drasticamente o direito à aposentação antecipada. E isto porque se o trabalhador aos 60 anos não tiver 40 anos de descontos ele nunca mais tem o direito à aposentação antecipada, mesmo que aos 61, 62 anos., etc. anos de idade alcance 40 anos de contribuições.. É uma limitação muito forte que, a meu ver, é inaceitável e não tem qualquer justificação económica a não ser eliminar o direito, na prática, à aposentação antecipada para a maioria dos trabalhadores. Isto até porque o trabalhador se aposentar com mais de 60 anos de idade, a CGA pagará menos anos de pensões, porque com essa idade a sua esperança de vida é inferior à que tinha aos 60 anos idade. Qualquer trabalhador pode ele próprio saber se perde o direito à aposentação antecipada com este projecto de lei do actual governo.Basta fazer contas para ver se aos 60 anos de idade teve ou terá 40 ou mais anos de contribuições para a CGA. Se não tiver nunca terá o direito a se aposentar antecipadamente.

A eliminação do factor de sustentabilidade: em que condições é eliminado

O projecto de Decreto-Lei do governo introduz outras alterações no art.º 37-A do Estatuto da Aposentação. São as seguintes: (a) Inclui um nº 3 que estabelece uma penalização de 0,5% por cada mês que falte ao trabalhador para ter a idade normal de acesso à aposentação que, em 2019, são 66 anos e 5 meses; (b) Um nº 5 que dispõe que se o trabalhadores aos 60 anos, mas só nesta idade, tiver completado, pelo menos, 40 anos de contribuições “não é aplicado o factor de sustentabilidade. O mesmo projecto altera o nº2 do artº 37º do Estatuto da Aposentação que passará a ter a seguinte redacção:

A aposentação pode ainda verificar-se na idade pessoal de acesso à pensão de velhice, que se obtém reduzindo a idade de acesso normal à aposentação (66 anos e 5 meses em 2019) quatro meses por cada ano civil que exceda os 40 anos de serviço efectivo à data da aposentação, não podendo a redução resultar no acesso à pensão antes dos 60 anos de idade”.

Resumindo, só os trabalhadores que aos 60 anos de idade tenham 40 anos de descontos é que não aplicará o factor de sustentabilidade, e se tiverem menos anos do que a idade normal de acesso à aposentação que, em 2019, são 66 anos e 5 meses, por cada mês que lhe falte sofrem um corte de 0,5% na sua pensão. Por outro lado, se tiverem cumprido aquelas condições (aos 60 anos, ter 40 anos de descontos), e se quando se aposentarem tiverem mais 40 anos de contribuições, por cada ano mais para além dos 40 anos de descontos reduz o corte na pensão em 2%.

Um exemplo para tornar tudo isto mais claro para o leitor. Suponha-se que aos 60 anos o trabalhador tinha 40 anos de descontos. Só cumprindo esta condição é que tem direito a aposentação antecipada, e só nesta situação é que possível o que se segue. Se tiver 60 anos de idade e 40 anos de serviço e se se aposentar como não tem a idade de acesso normal à aposentação que, em 2019, são 66 anos e 5 meses, sofre um corte de 38,5% na sua pensão (como lhe faltam 77 meses para ter 66 anos e 5 meses, então 77 X 0,5% = 38,5%). Suponha-se agora que não se aposenta nessa altura mas sim 4 anos mais tarde. Como tem 4 anos para além dos 40 anos de descontos, reduz em 8% no corte da pensão (cada ano a mais de desconto reduz o corte em 2%). Mas daqui a 4 anos, a idade de acesso normal à pensão deve ser 66 anos e 9 meses, pois ela tem aumentado em média um mês em cada ano. Como nessa altura o trabalhador tem 64 anos de idade, faltam-lhe 2 anos e 9 meses para ter a idade normal de acesso à aposentação que nessa altura (66 anos e 9 messes), o que determina um corte na sua pensão de 16,5 % (33 meses X 0,5%), mas como deduz os 8% referidos anteriormente, então os 64 anos de idade e 44 anos de descontos tem ainda um corte na sua pensão de 8,5%. Como aos 60 anos tinha 40 anos de descontos não se aplica o factor de sustentabilidade.

O factor de sustentabilidade também não se aplica nos casos de incapacidade absoluta e se o trabalhador se aposentar na idade de acesso normal a ela

O artº 2º do projecto de Decreto-lei do governo acrescenta um nº 3, que não existia, ao artº 5º da Lei 60/2005 elimina também o factor de sustentabilidade nos casos de incapacidade absoluta e permanente e na reforma e aposentação atribuídas por limite de idade. Portanto o factor de sustentabilidade (corte na pensão de 14,64% em 2019) não se aplica nos casos de incapacidade absoluta e se o trabalhador se aposentar com a idade legal de acesso à aposentação que , em 2019, são 66 anos 5 anos, e está a aumentar em média um mês por cada ano.

Os anos de descontos para a segurança social contam para o cálculo dos 40 anos de contribuições para a aposentação antecipada

O artº 4º do projecto de decreto-lei do governo introduz no artº 37 do Estatuto de Aposentação um nº5 que dispõe que o tempo de serviço que o trabalhador esteve inscrito em outras instituições de previdência (ex.: Segurança Social) é considerado para efeitos da contagem do numero de anos de serviço a mais para além dos 40 anos que acabamos de referir. E isto porque aquele nº5 tem a seguinte redacção:

O tempo de inscrição nas instituições de previdência referidas no n.º 2 do artigo 4.º, quer anterior, quer posterior ao tempo de inscrição na Caixa, conta-se também para o efeito de se considerar completado o prazo de garantia que resultar do disposto nos n.ºs 3 e 4 “.

O actual regime da aposentação antecipada só se mantém enquanto o novo Decreto-Lei não produzir efeitos e a nova lei aplica-se aos processos pendentes

O artº 7º do projecto de Decreto-lei dispõe que “Os beneficiários que não reúnam as condições de acesso à aposentação antecipada prevista no artigo 37.º-A do Estatuto da Aposentação com a redacção dada pelo presente decreto-lei, mantêm a possibilidade de acesso à aposentação antecipada através do regime em vigor até à produção de efeitos do presente decreto-lei, sendo a pensão calculada nos termos desse regime.”

Finalmente o artº 9 do projecto do governo, estabelece que “ Os artigos 37.º, 37.º-A e 38.º-A do Estatuto da Aposentação, com a redacção dada pelo presente decreto-lei, aplicam-se aos pedidos de aposentação pendentes”.

 



 

 


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