A reportagem prossegue e filma-se a tentativa de chegada do Secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, a Boticas, em Trás-os-Montes, ou seja, para lá do Marão.
De regresso a casa, a via que me leva ladeia, em determinado momento da viagem, uma lixeira de consideráveis dimensões. Fica no topo de um monte e parece, na paisagem, apenas e só um espaço natural e até verde, considerando que os resíduos que lá são colocados por camiões que os depositam são bem acomodados em montículos que, depois de tapados, são cobertos por terra e por uma capa que simula a cor pujante da natureza.
Não é por ver os montes que artificialmente surgem que os reconheço: há um momento de agressão nasal que descobre per olfactum a aproximação dos desperdícios urbanos. Cheiro o lixo à distância! Apesar de me afastar da lixeira, rapidamente chego à rotunda do lixo, assim nomeada por ostentar, a toda a circularidade, em vez de autóctones árvores, grandes “placards” de propaganda política que exibem sorrisos de fotografia e promessas vagas de políticos dos partidos do poder em busca do sagrado voto que dá lugares e dinheiro. A única satisfação, quando olho para eles, é saber que essa lixeira visual acabará na lixeira atrás cheirada e vista. O desagrado surge quando me apercebo de que até na lixeira acabarão por ser cosmeticamente alterados para bem parecer logo que forem acrescentados aos montículos malcheirosos que assumem um aspecto de monte verdejante. É como se até na lixeira vestissem fatos e “toilettes” vistosas e não cheirassem verdadeiramente mal. É a pensar neste lixo que vou sujando o meu pensamento até chegar a casa.
Lá chegado, já pensando na salubridade do lar, instintivamente ligo o emissor lixeiro e deparo com uma senhora, identificada como Elisabete Pires, a dizer que “a mina é próxima das casas e que eles negoceiam e o povo fica com o “lixo””. A reportagem prossegue e filma-se a tentativa de chegada do Secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba (“galamba” que é forma antiga e que lhe esconde o verdadeiro nome: síncope do “l”>” gaamba”; crase dos “aa”> “gamba”, nome mais consentâneo com a verdadeira origem deste ser: viveiro ou produção em aquacultura de políticos profissionais, espécie sem qualquer benefício proteico ou alimentar para a sociedade humana), a Boticas, em Trás-os-Montes, ou seja, para lá do Marão.
Depois de ter fugido do protesto popular, já bem seguro e confiante num local sem furiosa turba a mandá-lo para lá do Marão, o Secretário Galamba, cuja entrada na política se deveu ao facto de ser “blogger”, pois aos 23 anos desistiu do seu trabalho na consultora Cluster Consulting, e de ter sido convidado pessoalmente para integrar as listas do PS pelo insuspeito José Sócrates, lá foi dizendo que a mina de lítio traria mais riqueza à região, à população, que todos beneficiariam da exploração mineira, blá, blá, blá. Não disse foi que nem todas as autarquias em volta tinham sido consultadas, que a exploração mineira arruinaria a biodiversidade da região, que transformaria negativamente uma belíssima paisagem de uma região transmontana, que as terras e os cursos aquíferos seriam intoxicados pelos produtos usados na exploração e que a agricultura de subsistência que muitos praticam deixaria de o ser e nem explicou a ausência de um estudo de impacto ambiental.
Também não explicou o Secretário Gamba como é que se assina um contrato de exploração mineira no valor de 500 milhões de euros com uma empresa criada três dias antes com um capital social de 50 mil euros chamada Lusorecursos, à qual se juntou Jorge Costa Oliveira, ex-Secretário de Estado socialista, afastado do cargo por causa da sua ligação ao caso das viagens pagas pela Galp, e amigo pessoal de António Costa, nem explicou por que motivo o “Sexta às 9”, programa da jornalista Sandra Felgueiras, desapareceu nas férias de Verão e voltou no fim do dia, longe do horário nobre. A única explicação interessante do Secretário João aconteceu naquele ruidoso e confuso programa de segunda à noite, o “Prós e contras”. Disse o político carreirista que a empresa Lusorecursos assinara um contrato com o Governo de Passos Coelho em 2012 que previa que a empresa, após o período de prospecção e pesquisa, pudesse requerer a concessão. Aqui está: ora comes tu, ora como eu. Entre PS e PSD, um mata e o outro esfola.
Decidi, então, desligar o aparelho de lixo televisivo e esquecer estes “odorificamente” desagradáveis momentos de reflexão. Havia decidido empreender uma revolta pessoal na minha vida doméstica, facto não alheio à circunstância de a minha relação amorosa estar a passar por um período “lixeiramente” instável. Dirigi-me à banca, não a essa onde se depenam pessoas com comissões e taxas, para começar a preparar o jantar. A verdade é que para tal objectivo é essencial fazer lixo e ele foi-se formando à medida que as cascas de batatas, cenouras, nabos e xuxus iam formando um pequeno montículo, parecido, em menor escala, com o da lixeira do meu caminho, que eu não iria tapar e engalanar, pois limitei-me a despejar este lixo no saco do lixo. A minha mulher chegou no momento em que eu lançava as cascas para o saco e disse-me que também ela iria contribuir para a mudança dos hábitos domésticos como forma de salvaguardar a integridade mental de cada um de nós e que iria começar por fazer algo que me era imputado diariamente, como se fosse uma obrigação social e relacional masculina. Já que eu preparava o jantar, ela iria levar o saco do lixo ao contentor.
Seria absurdo afirmar que a minha mulher é mentirosa e que não cumpre com as suas promessas. Poderia fazê-lo, mas penso que, no seu ponto de vista, não houve mentira nem incumprimento. Pois bem, espero que este texto não exale o mesmo odor que eu agora aspiro. A minha esposa pegou em mim e depositou-me neste moderno contentor do lixo, mas que cheira tão mal como os antigos. Só me aguarda esperar que ela seja rápida e que se recorde que o único lixo que eu agora produzo é o inevitável para a confecção dos alimentos e que, portanto, suba imediatamente a minha nota de desempenho e contributo para a economia amoroso-relacional de “Lixo” para, pelo menos, BBB, porque receio, se ela não o fizer e não me vier retirar desta categoria e deste contentor, vir a ser triturado pelo FMI, ou melhor, pela máquina de compressão do camião do lixo.
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