Pois isso me lembra o fiasco dos institutos de pesquisas na últimas eleições (2014), quando apresentaram a mais elevada margem de erro da sua história. Ficaram desprestigiados e, nos meses seguintes, investiram bastante na tentativa de restaurar a reputação.
Tantos erros podem ter várias origens, mas uma delas certamente foi a dúvida dos eleitores consultados, mesma dúvida que certamente acomete os senhores deputados e senadores (metade dos membros das casas foi ouvida) que votarão no impeachment sabendo, melhor do que qualquer um de nós, leigos, que não há base para tirar a legitimidade de Dilma, eleita pelo voto.
É justamente essa “libertinagem” política, à falta de palavra mais comportada, que deixa nossa República e Democracia em perigo, além de exaustas, safando-se como podem de delações premiadas tratadas como sentença de culpa e de réu condenado que gerencia impunemente processos legais no país. De retrocesso civilizatório, como bem definiu o jornalista Argemiro Borges.
A historiadora Heloísa Murgel Starling, garante, em entrevista ao “Brasil de Fato”:
“Se a Lava Jato não gerar provas contundentes, abrem-se portas para a destruição da república.”
Heloísa detalha o cenário:
“Enquanto nós avançamos na democracia, não avançamos na república. Existe uma postura de produção de acusações sem gerar provas contundentes. Esse procedimento é antirrepublicano, lembra o tribunal jacobino. Um sujeito dizia: “Fulano é ligado à nobreza”. O Fulano era levado à presença do tribunal e não havia provas, porque o tribunal tinha virtude. Ele falava, era o virtuoso e, portanto, podia julgar a partir do critério da pureza de sua virtude. Este é o risco que corremos. Se o procedimento levantado pela Lava Jato não gerar provas contundentes e, mesmo assim, houver condenações, estarão abertas as portas para a destruição da república. Não se pode acusar com base em delações, sem apresentar provas contundentes. Você não é mais inocente até que provem o contrário. Há uma inversão ameaçadora que faz com você seja culpado até que prove o contrário. Além disso, na república, ninguém tem o monopólio da virtude. Portanto, não há um juiz que possa determinar o que é ou o que não é. Quer dizer que amanhã eu digo que o governo é ruim e vamos tirá-lo? Governo ruim a gente resolve com eleição.”
A democracia também está sendo golpeada, por um lado, foi despertada do seu sonho de irrealidade cotidiana, materializou-se, a maioria dos brasileiros está se valendo do direito de manifestar a sua vontade, contra ou a favor do governo. Principalmente, contra a roubalheira que a Lava Jato até aqui apontou. Mas ainda é muito pouco. O que teremos com o fim do governo Dilma?
Retrocesso nos direitos humanos, sociais e trabalhistas a partir de leis que estão sendo votadas agora mesmo na Câmara e no Senado. E outras que virão. O jornalista Leonardo Sakamoto enumera pacientemente as 55 ameaças a direitos adquiridos. Leia e saiba que não está sozinho na luta por direitos trabalhistas que lhes estão sendo roubados. Um grupo de juízes redigiu um manifesto exigindo que os direitos conquistados sejam mantidos.
Então, a boa notícia é que não estamos sozinhos, há jornalistas escrevendo para nos esclarecer, há juristas brigando para que nossos direitos sejam resguardados, há artistas e formadores de opinião que tiraram pijama e chinelos para voltarem às ruas em defesa do país que defenderam da ditadura há pouco mais de 50 anos.
Há também seres iluminados, como Leonardo Boff, que consegue extrair 10 lições, sobretudo éticas, dessa dolorosa crise. É otimista, apesar de realista. Ensina o que precisamos fazer para finalmente conquistar o país com o qual sonhamos:
“O tipo de sociedade que temos não pode mais continuar assim com é. Queremos um Brasil que seja democrático, includente, justo e sustentável.”, conclui.