A entrevista de Marques Mendes ao DN do dia 26 de Agosto lembrou-me uma confissão de uma velha praticante de striptease num bar muito manhoso para os lados do Intendente, que se chamava Faridol, se a memória não falha. Onde ela actuava aos domingos e eu a acompanhava nos intervalos.
O segredo das velhas stripteaseres está em esconder os podres para melhor vender o mau produto. As velhas sabidas utilizam uma mistura de desnudamento com uma lenga-lenga acompanhada com uns acordes de piano desafinado. O cliente é espoliado, mas sai da sessão convencido que provou o melhor naco que lhe mostraram e ainda trauteia a música. Marlene Dietrich e Lizza Minnelli fizeram geniais interpretações do Cabaret decadente. O Marques Mendes faz o que pode e a entrevista dele ao DN está como ele para as pernas do Anjo Azul. Cada um dá o que tem e pode. Há quem compre. Eu é que já tenho o fígado demasiado gasto para o castigar com mais mixórdias.
A actuação de Marques Mendes no duplo papel de político-comentador começa sempre com a mesma letra: entra a dar à perninha e a trautear: Ó Clara, o que vou mostrar é segredo e revelo-o pelo vosso bem, meus amigos. Provem e arrotem, que é fresquinho.
A entrevista ao DN é uma lição em forma de fábula de como fazer uma PPP. Com Promiscuidade, Propaganda e Política para sacar dinheiro público para contas privadas. Prostituição. Se o termo não vos choca, é porque o Marques Mendes aos domingos fala para um público infantil, ou infantilizado.
Marques Mendes é o melhor vendedor do mercado de carne de cabra velha para chanfanas de comissões. Convenceu o público que explicou o truque, guardando o verdadeiro coelho na cartola, sob a forma de rendas exorbitantes calculadas com base em clientes imaginários. A EDP e a Brisa, por exemplo, já têm lugar reservado para Marques Mendes nos seus panteões!
Ele explicou porque consegue tantas “cachas”, notícias em primeira mão, que dispara em direto e cobra em privado: ”Talvez se deva ao facto de ser uma das pessoas que mais tempo estiveram em cargos governativos e políticos após o 25 de Abril”, revela candidamente. A antiguidade é um posto. Esqueceu-se de dizer que a seguir a ele alguns juízes poderão justificar as primeiras páginas das notícias do Correio da Manhã por terem andado muitos anos de tribunal em tribunal… Um dia teremos o juiz Alexandre em prime time e será um fartote de marquesmendesadas sob a forma de cachas. Lá se irá o exclusivo do Marques Mendes!
Avisa que trabalha em solitário. Marques Mendes não tem uma equipa a recolher dados ou a procurar as notícias. “Faço tudo sozinho e peço pontualmente a ajuda de um amigo ou outro”, diz. E tem a mulher como partenaire. Uma situação vulgar nos circos.
Tu cá, tu lá com Marcelo e Costa.Pegar no telefone e confirmar informações ou até apanhar alguma notícia. O comentador admite que fala “regularmente” com os dois (Marcelo e Costa), mas claro que é mais próximo de Marcelo. Ainda assim, garante: “O Presidente não faz a menor ideia do que vou comentar.” Há o SIS, já agora.
Faz telefonemas para gente importante e conversa com dois ou três “amigos”.
”A minha vida não é esta”, garante Marques Mendes, que, aos 60 anos, é jurista na Sociedade Abreu Advogados. Eu, pessoalmente, nunca encontrei ninguém nos bares de alterne que me tenha dito que a vida dela era aquela. Também as garrafas que andam sobre aquelas mesas não são de uísque, nem de champanhe! O Marques Mendes é apenas mais um produto falsificado no cabaré da política vendida como o comentário político!
“Ajuda-me muito ter sido ministro e líder parlamentar e presidente do PSD. Ter conhecido por dentro, muito bem, a máquina do Estado, saber como funcionam os Conselhos de Ministros”, reconhece. Fala como expertdo milieu: esteve ao lado de Cavaco Silva, como secretário de Estado e ministro adjunto, de 1985 a 95 e, mais tarde, no governo de Durão Barroso como ministro dos Assuntos Parlamentares. Foi líder do PSD entre 2005 e 2007. Entre os seus amigos pessoais contam-se Francisco Balsemão, Cavaco Silva, Leonor Beleza, Fernando Nogueira e Silva Peneda e um “amigo” do escritório com o qual troca impressões sobre os comentários. Jorge Sampaio e Ramalho Eanes, Paulo Portas e Pedro Passos Coelho, também. Tem boas relações com Horta Osório, presidente do Lloyds, Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, os antigos ministros Eduardo Catroga e Miguel Cadilhe, o presidente do grupo Visabeira, Fernando Nunes, ou a chairman da Galp, Paula Amorim. Entre as suas fontes conta-se António Guterres e Carlos Moedas, Francisco Louçã, Jerónimo de Sousa, Jorge Coelho ou António Lobo Xavier. E gosta de conversar com o arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga. Falta o provedor dos Jogos da Santa Casa para ele nos anunciar o euromilhões!
A rede de contactos é, no entanto, muito vasta e abrange pessoas bem colocadas em vários cargos e instituições. Ele apresenta-se na entrevista como um Zorro, um justiceiro da Marvel. Quer fazer-nos acreditar na entrevista ao DN que veio ao mundo e à SIC explicar-nos a corrupção que por aqui grassa. Ele é o mais parecido que conseguimos de uma varejeira que paira sobre os excrementos da sociedade para não os pisarmos!
Como Dante, ele conhece os círculos do inferno, os grandes pecadores. Apenas faltou apontá-los a dedo e gritar: aquele negociou PPP, eu sei, foi com malta do meu escritório.
A entrevista devia ser de leitura obrigatória, com um título – Como se faz um anjinho. Podia começar assim: Pegue-se num Marques Mendes, dêem-lhe um microfone e uns amigos…
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