Poemas de Delmar Maia Gonçalves
I
“Refúgio”
Um dia
terei de plantar
o verde do quintal
no céu estrelado
E então terei
cactos de cimento
pintados na terra!
II
“As duas faces do Cão Tinhoso”
Cão Tinhoso
era estranho
era guerra
era sombra
Cão Tinhoso morreu
nasceu nova aurora
e com ela a esperança
Agora Cão Tinhoso é outro!
Não é estranho mas é guerra
não é estranho mas é sombra
E é nosso pai,
nosso tio
e nosso irmão.
A desesperança instalou-se.
Aguarda-se o renovar da aurora
e com ele nova esperança.
III
“Luso-fonia”
De que serve a luso-fonia
quando as pontes
estão cercadas de moribundos?
De que serve a luso-fonia
quando as pontes
estão carregadas de ociosos elitistas?
De que serve a luso-fonia
se os caminhos da praxis
não se fundem com o mau sentido de orientação da doxa?
IV
“Martin Luther King Jr”
Tua consciência
não é escrava
Tua vida
é um hino à liberdade
Teu exemplo
um poema para a eternidade.
V
“Bradam os céus”
Oh, bradam os céus
crianças morrem a míngua de pão
e ninguém faz nada!
Oh, bradam os céus
todos se insultam
e ninguém tem razão
Oh, bradam os céus
a miséria próspera
e vozes de protesto são silenciadas
Oh, bradam os céus…
Até quando viveremos no sepulcro?
Até quando viveremos em agonia?
VI
“Renascer eternamente”
Sentir que todos os dias
renasço para a vida
estar em permanente luta
com a rotina
Quem seria sendo rotineiro?
E quem serei sendo diferente?
VII
“País”
De mim me ausento
para me ausentar
do meu país!
VIII
“Chuabo”
Em Quelimane
Abutres de mau agoiro
semearam tempestades de vazio
para que lá
apenas se colhessem
ventos de nada.
IX
“Somos um número”
Em visita sepulcral
aos entes humanos
descobri a aberração das modernas sociedades
desumanizantes e civilizadas
em que vivemos!
Quando morremos
somos reduzidos a um número
herdemos o nome
e a dignidade
Está tudo planeado!
Até temos
com quem partilhar a cova…!
Uma espécie de vala comum!
Afinal, estamos mortos, não é?
E não valemos nada
nem sequer um nome
Somos apenas mais um número
que não somos nem fomos!
X
Não se auguram
sortilégios no lodaçal
adivinham-se relâmpagos.
XI
“Esperança”
Quero construir versos
sobre o doce néctar
do teu corpo.