A sua criação é o resultado do seu desalento. Mas também da sua frustração e da sua pouca elogiada anarquia. Começou por desenhar marcadores de livros. Com a venda ambulante comprava pão e sobrevivia em Buenos Aires. Esticou depois as folhas e a crença. O mundo deu-lhe fome e cansaço. Mas não lhe negou a procura pelas pessoas. Pelas estórias de vidas, e da fuga delas através da natureza. Se por um lado, hoje, se define maior, por outro também sente o vazio aumentar. Talvez o vazio do mistério.
Descobriu mais tarde que podia viajar sentado numa cadeira, a do sonho. E nela criou “Bucéfalos”, “Odes Marítimas”, “Mulheres a Olhar o Mar”, “Peixes Neolíticos”, ou “Borboletas” de diferentes formas e feitios. Os desenhos não lhe pertencem, diz. São independentes e fruto da exaltação. Pertencem ao mundo de “ninguém”. E vivem através do som de compositores como o catalão Jordi Savall. São o resultado de “uma paciência provocada por um ser impaciente”.
“A arte é maior que o artista”, traceja João David Zilhão, 34 anos, nascido na capital que deixou para trás à procura de mais mundo. Largou casa, emprego, pôs em debandada coisas e factos. Desceu o continente. Atravessou o oceano. E regressou há um ano. Vive hoje numa aldeia que espia o Parque Natural Serra de Aires e Candeeiros. Ao lado de Cervantes, Dostoiévski, Kafka ou Kerouac, organiza e consome lápis, folhas e cores. Êxtases de cores.
Depois de expor em Buenos Aires (2013) e em Lisboa (no Espaço 62, e na Fábrica de Braço de Prata), as “Máscaras” são a sua mais recente mostra que inaugura este fim-de-semana, em Torres Novas. Até 12 de Fevereiro próximo, pode conhecer parte da obra de João David, do colectivo Cabana na Praia, no museu municipal Carlos Reis. Artista em criação? Ou criado para ser artista?