Todos os dias, elas – como nós – vêem a morte em directo, desvalorizando-a, assimilando métodos de matar resultantes dos maiores requintes de malvadez.
O que é sórdido no mundo, entra-lhes (entra-nos) olhos dentro, tornando-os (tornando-nos) verdadeiros analfabetos emocionais. Perde-se a distinção entre a vida e o valor da vida, a distinção entre o homem e o humanismo, prática suprema que o pode dignificar.
Quando as nossas crianças crescem podem ter-se tornado seres menores e até descerem na escala dos valores a ponto de usarem um cinto de bombas para rebentarem com o próximo, ou seja, vítimas da celebração do medo que não souberam enfrentar.
Quando damos por isso é sempre tarde de mais.
O medo forjou ao longo de milénios a estrutura das civilizações, criou a sua espinha dorsal, conduziu a coisas como as religiões ou a explicações intermédias do desconhecido.
Se eu chegasse a estas páginas e dissesse, por exemplo, sem mais introduções, Abū al-Qāsim Muḥammad ibn ʿAbd Allāh ibn ʿAbd al-Muṭṭalib ibn Hāshim, provocaria alguma indisposição entre os leitores menos precavidos. A expressão, afinal, é o nome de uma das grandes figuras da história, mais conhecido como Maomé (Muḥammad, Mohammad ou Moḥammed).
Há quem tenha medo de pronunciar o seu nome ou de falar daqueles que, invocando-o, o traem. Se aprendermos alguma coisa, o medo diminui.
Maomé nasceu em Meca, acreditando-se que tenha nascido perto do dia 6 de Abril de 570 — só por curiosidade, os cristão realizavam em Braga um importante concílio regional nesse mesmo ano.
O profeta morreu em Medina, a 8 de Junho de 632.
Apostar no conhecimento diminui os medos e gera, sobretudo, reconhecimento.
Diga-se então que Maomé foi um líder religioso e político. Segundo a religião islâmica, é o mais recente e último profeta do Deus de Abraão.
Para os muçulmanos, Maomé, foi precedido neste seu papel de profeta por Jesus, mas também por Moisés, Davi, Jacó, Isaac, Ismael e Abraão. Quem não conhece o Corão ficará admirado com a presença de Jesus e de Maria sua mãe nas suas páginas. E no respeito que ambos merecem aos crentes e Imãs (autoridades religiosas do islamismo).
Como figura política, Maomé unificou várias tribos locais, o que permitiu que da união nascesse a força e desta a grandeza que estaria na origem das conquistas e daquilo que viria a ser um importante império islâmico (que se estendeu da Pérsia até à Península Ibérica).
Falámos, em artigo anterior aqui no Jornal Tornado, nas várias divisões islâmicas – fazendo sobressair sunitas, xiitas e ismaelitas. Tudo começou realmente com a morte de Maomé que, sem indicar claramente um seu sucessor na liderança da comunidade muçulmana (a “Umma”), permitiu novos desenvolvimentos.
Os anciãos da comunidade entenderam que Abu Bakr, um dos primeiros convertidos ao Islão e companheiro fiel do Profeta, deveria ser o líder. Deste modo, numa sucessão que parecia evidente a muitos, Abu Bakr foi o líder durante dois anos seguidos. Abu Bakr, cujo cognome era Al-Siddiq, “o Verídico”, foi, de facto e de direito, o primeiro califa.
Abu Bakr chamava-se realmente Abdul Ka’aba, ou “escravo da Kaaba”, mas o profeta Maomé mudou-lhe o nome para Abdullah, o “servo de Allah”, quando este se converteu ao Islão. Ficou contudo conhecido como Abu Bakr devido ao seu gosto por criar dromedários (abu, “pai”, bakr, “dromedário”, abu bakr, “pai de dromedários”).
(Sem grande esforço, percebemos porque Ibrahim Awwad, Ibrahim Ali al-Badri al-Samarra, tomou para si o nome Abu Bakr Al Baghdadi. Ele é hoje um dos líderes mais noticiados das frentes de intensidade assassina, um marginal chefe de marginais que domina Iraque e Síria num auto-proclamado Estado que a comunidade internacional não pode nem deve reconhecer.)
O verdadeiro Abu Bakr, sucessor de Maomé, também morreu, pouco depois de assumir a liderança dos seus. Antes, submeteu as tribos beduínas rebeldes através da diplomacia e do recurso à força militar (tendo Khalid ibn al-Walid como importante general dos seus exércitos). Combateu nas chamadas guerras da apostasia (Ridda).
Entre os seus inimigos, e de toda a comunidade islâmica, contava-se a presença dos dois impérios que na época cercavam a Arábia: o Império Bizantino e o Império Persa Sassânida.
Com a morte de Abu Bakr, Omar tornou-se o novo dirigente da comunidade, um lugar que ocupou por dez anos. Omar ibn al-Khattab ou Umar ibn al-Khattab foi o califa entre os anos de 634 e 644 e considerado o mais poderoso dos califas bem guiados e um dos mais poderosos e influentes governantes muçulmanos. Sucedeu-lhe Otman (durante doze anos), como líder do Islão.
Omar foi assassinado (por um cristão persa em 644).
Otman ou Osman era membro do clã dos Omíadas (Umayyad) que se encontrava integrado na tribo dos Coraixitas (Quraysh) de Meca. Rico mercador, tornou-se um dos primeiros a seguir a mensagem religiosa do profeta Maomé.
Deve saber-se que após a morte de Omar, deu-se uma disputa em torno de quem deveria ser o novo califa. Para alguns, essa honra deveria recair sobre Ali, primo de Maomé e que era também casado com a sua filha Fátima. Para outros, o califa deveria ser o primo de Otman, Muawiyah.
A eleição de Ali, em 656, foi contestada por Muawiyah, originando uma guerra civil entre os partidários das duas facções. Ali acabaria por ser assassinado em 661 e Muawiyah conquistou o poder para si e para a sua família, fundando a dinastia dos Omíadas. O conflito entre os dois campos não terminaria aqui, estendendo-se até aos dias de hoje, em continuadas lutas, das quais se destaca, logo em 680, o massacre, onde Hussein, filho de Ali, morreria contra as tropas de Yazid, filho de Muawiyah.
A origem dos dois principais ramos em que actualmente se divide o Islão teve como base esta diferente interpretação da forma de sucessão do Profeta.
Os partidários de Ali (“shiat ali”, ou seja, Xiitas) acreditam que os três primeiros califas foram usurpadores que retiraram a Ali o seu direito legítimo à liderança.
Como nota, refira-se que Abu Bakr se encontra sepultado no recinto da Mesquita do Profeta, em Medina (Masjid al-Nabawi), juntamente com Maomé e Omar.