Diz o Correio da Manhã que os ”pais da criança apresentada no primeiro episódio do programa da SIC “Supper Nanny” “receberam mil euros por expor a filha”. A SIC por seu turno, na ficha do programa informa que as imagens foram captadas com autorização dos protagonistas, esperando com isso justificar a exibição de um programa que viola claramente um conjunto de questões éticas e deontológicas que requerem urgente intervenção por parte do regulador dos media (a ERC).
Os meios de comunicação social estão legal e eticamente obrigados a protegerem a imagem e a identidade das crianças em situações consideradas “de risco”, à luz de um conjunto de instrumentos legais como a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Lei Tutelar Educativa e a Lei de Protecção de Crianças e Jovens , nas quais se encontram tipificadas situações de risco para as crianças, sendo as mais frequentes e mediatizadas os “maus tratos físicos ou psíquicos” e os “abusos sexuais”. A criança exposta no programa da SIC não se enquadra nesta situação. Contudo, parece evidente que a crer nas imagens exibidas a criança assume “comportamentos que afetem gravemente a sua (…) formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, (…) se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação”.(al. g, art.º 3.ºdo último dos diplomas citados)“.
De facto, a criança que protagoniza o programa é apresentada como sofrendo de graves distúrbios comportamentais que mereceriam acompanhamento médico e psicológico em vez de ser despudoradamente exposta, como fez a SIC. Independentemente do consentimento dos “pais” para a captação das imagens exibidas, que devassam claramente a intimidade da filha, aquela Mãe necessita de apoio médico ou social porque quem expõe a intimidade de uma filha de 8 anos a troco de mil euros, não está seguramente em condições de educar uma criança.
Mas se esta Mãe merece reprovação, a SIC não a merece menos, desde logo pela falta de transparência do próprio programa. Em que condições foram captadas as imagens? A criança foi consultada? As câmaras eram visíveis ou estavam ocultas? Apesar da autorização da Mãe, esta visionou e participou na selecção das imagens exibidas? Tratando-se de uma criança cujos pais estão separados, o Pai foi chamado a pronunciar-se sobre as imagens, mesmo tendo autorizado que a filha fosse filmada?
E o que dizer do papel da psicóloga, apresentada no programa como “educadora”? Qual o código de conduta que enquadra a sua participação no programa? Em que condição se volta para os telespectadores com gestos e movimentos fisionómicos como se fosse uma actriz de uma série televisiva?
São questões que não podem deixar de ser respondidas pela SIC e pelas entidades que no nosso País supervisionam a protecção das crianças e a regulação da actividade televisiva. Depois da condenação do programa por parte de entidades como o Instituto de Apoio à Criança (IAC) e de especialistas, como os citados aqui, e aqui, impõe-se que a SIC reveja a sua decisão de exibir o programa nas condições do primeiro ou, se o não fizer, que a ERC se pronucie.
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