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Domingo, Novembro 10, 2024

Monsueto 100 anos: a filosofia não deixa a fonte secar jamais

Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Jornalista, assessor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo

Se estivesse vivo, o compositor Monsueto de Menezes completaria 100 anos nesta segunda-feira (4). Ele faleceu, porém, em 17 de março de 1973, aos 49 anos. Mesmo em sua curta vida, deixou um legado ímpar para a história da música popular brasileira.

Com uma trajetória muito parecida com a de muitos compositores dos morros cariocas, Monsueto teve muitos sucessos em diversos carnavais com canções marcadas no imaginário popular, como Mora na Filosofia, de 1955:

“Eu vou lhe dar a decisão/ botei na balança e você não pesou/ botei na peneira e você não passou/ Mora na filosofia, pra que rimar amor e dor?”.

A filosofia da esperança, da crença no futuro.

Mora na Filosofia, canta Marlene

Como escreveu Renato Bernardi, “Monsueto fazia um samba diferenciado” por causa de suas “complexidades rítmicas que não são presentes em seus parceiros de geração. Enquanto estes focavam na percussão dos violões e cavaquinhos aliados aos seus princípios harmônicos”, o trabalho de Monsueto “acontece sempre em volta das batidas, tendo os outros elementos harmônicos e melódicos (mesmo o canto) como complementares à música construída pelas baterias e percussões”.

Como canta em A Fonte Secou, em parceria com Marcléo e Tuffic Lauar, sucesso do carnaval de 1954, quando foi gravada:

“Eu não sou água/ Pra me tratares assim/ Só na hora da sede/ É que procuras por mim/ A fonte secou”, olha que beleza, “Quero dizer que entre nós/ Tudo acabou”.

Lembrado como um grande compositor, Monsueto atuou em 14 filmes e pintou quadros. Seguiu o seu destino com um lugar guardado entre os grandes nomes da música popular brasileira, com um talento singular e filosofia própria.

A Fonte Secou, canta Cláudia

Por isso, “se você não me queria, não devia me procurar” porque “evitar a dor é impossível, evitar esse amor é muito mais”, ora veja “você arruinou a minha vida”, então, “me deixa em paz”. Canta a desilusão amorosa de maneira tão poética em Me Deixa em Paz, de 1951, em parceria com Airton Amorim.

“A sua aptidão inquestionável com o instrumento, somada com o interesse crescente que as elites cariocas passaram a ter pela música desenvolvida nos morros, logo o colocou em destaque nesse nicho, tornando-se em 1950 o baterista da Orquestra do Maestro Copinha”, completa Bernardi.

Em Ziriguidum, de 1961, o poeta revela a sua visão sobre o debate de onde vem e dá a sua visão sobre os diferentes sotaques do samba pelo país afora. “Vocês querem saber o que é Ziriguidum/ Ziriguidum é coisa assim/ Que só se faz com pandeiro e tamborim/ Não sei se ele vem de cima ou se vem de baixo/ Vem de lá ou vem de cá/ Só sei que ele chega assim, assim”.

Me Deixe em Paz, canta Linda Baptista

O compositor carioca só conseguiu lançar seu primeiro disco em 1962 – um Long Play (LP), muito comum na época anterior ao Compact Disc, que hoje já está superado por novas tecnologias.

De acordo com Bernardi, ele deixa de lado “as orquestrações e arranjos da escola europeia” e “busca trazer uma versão reduzida de uma escola de samba para dentro do estúdio, mantendo sua essência de percussões, aqui com 13 ritmistas, cantos de pastorinhas e o próprio Monsueto assumindo o papel de puxador”. Um dos grandes discos da MPB.

E a sua filosofia insiste em Couro do Falecido, de 1962, quando entoa que “morre um para bem de outros, a verdade é essa, não se pode negar”, portanto, “bate o bumbo com vontade, Que a moçada quer sambar, castigue o couro do falecido”, que deu a pele para a confecção dos instrumentos de percussão. O falecido é um cabrito. Vida que segue.

Lamento da Lavadeira, canta Elza Soares

Monsueto cantou as dores, os amores, o cotidiano dos morros do Rio de Janeiro como poucos. Como mostra Lamento da Lavadeira, de 1956, parceria com João Vieira Filho e Nilo Chagas, “Trabalho um tantão assim/ Cansaço é bastante sim/ A Roupa um tantão assim/ Dinheiro, um tiquinho assim”. E nem existia neoliberalismo ainda.

Monsueto é um daqueles talentos esquecidos pelo show business fugaz. Cem anos se passaram de seu nascimento e sua obra permanece viva e atual para a felicidade de uma nação adormecida por enquanto. Passarão mais cem anos e suas canções continuarão tocando fundo nas mentes e nos corações.

 

Monsueto, que completaria 100 anos em novembro de 2024, em foto de 1971. Arquivo Nacional

Texto em português do Brasil

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