Ao primeiro movimento da carruagem alguns acenavam já com firme convicção, outros apenas ali estavam,…
Entre tudo isto embaraça-me a imagem do meu filho mais novo. Distante, distraído no bulício naquele fim de tarde. De que se recordará ele desse dia? Baltasar lembrar-se-á do velho pai, que acena da janela estreita. Eu, por outro lado, recordarei um miúdo imóvel, que se vai tornando cada vez mais breve.
Viver é uma experiência sempre solitária. Porque seria diferente quando a morte chega? Nada é compartilhável na justa medida com aqueles a quem mais amamos. Essa é – de todas – a maior injustiça.
Deixei-me dormir. Acordei. Saudei o sol levantando a mão esquerda. Apercebi-me de estar a chegar finalmente à estação de destino.
Reconheço a melodia que paira no ar: …the long and winding road that leads to your door will never disappear. I’ve seen that road before. It always leads me here. Lead me to your door…*
Surpreendo-me ao ver que estou de volta à estação da partida. Alguns ainda lá estão. Amigos, família, outros duvidosamente conhecidos. Abandono a carruagem pousando demoradamente o meu olhar no comboio que acaba de partir. À distância alguém acena efusivamente.
Acredito que existem outros mundos, mas que estão todos neste. Perdemo-nos demasiadas vezes na vulgaridade do procurar novas paisagens, esquecendo que também viver só será possível na premissa de novos olhares.
Talvez a vida tenha uma espécie de plano oculto que nos traz sempre a uma mesma estrada – a única forma de fugir ao engano de existir.
Morri! E agora?!?
* “The Beatles”.