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Sexta-feira, Novembro 1, 2024

Morreu Crisódio Araújo, poeta, filósofo e político timorense

M. Azancot de Menezes
M. Azancot de Menezes
PhD em Educação / Universidade de Lisboa. Timor-Leste

Timor-Leste ficou mais pobre. Profunda dor, luto e consternação são as palavras que me ocorrem para partilhar a notícia da morte de um bom amigo, um companheiro da luta de libertação nacional. Crisódio Araújo faleceu no passado dia 22 de Agosto, com 57 anos de idade, vítima de ataque cardíaco.

Crisódio Marcos Tilman Freitas de Araújo nasceu em Lahane (Díli), no dia 26 de Março de 1964.  Era licenciado em Teologia e Humanidades pela Faculdade de Teologia e Filosofia de Braga, da Universidade Católica Portuguesa. Ainda no que refere às suas habilitações académicas realizou um Curso Intensivo de Leiturização, com a duração de 2 anos, seguindo o método Lipman, organizado pelo CIDAAC e CIVITAS, no âmbito do Projecto da União Europeia e destinado a Formadores de Jovens Marginalizados do Sul.

O seu percurso profissional inclui a assessoria técnica na Unidade do Currículo Nacional (UCN) do Ministério da Educação e Cultura de Timor-Leste (2013 – 2016), e as importantes funções que desempenhou enquanto Ponto Focal da Educação para a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Crisódio Araújo

Foi Professor Convidado de Língua Portuguesa I na Universidade Nacional de Timor Loro´Sae (UNTL), Consultor/Tradutor na empresa privada de Recursos Humanos Invest People, Conselheiro para a Comunicação Institucional e Ponto Focal de Timor-Leste para a Avaliação do Plano Indicativo de Cooperação (PIC) com Portugal (2007 – 2010) – Ministério dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste.

Mais jovem, enquanto Presidente da Associação de Estudantes do Instituto Superior de Teologia da Universidade Católica Portuguesa e Delegado, por Braga, na Comissão Nacional de Estudantes de Teologia, Tesoureiro e Vogal de Cultura e Comunicação da Associação de Estudantes da Faculdade de Filosofia de Braga), foi responsável por diversas iniciativas no âmbito do associativismo académico (Queima das Fitas, promoção de Semanas Culturais, Jornadas e criação de Revistas Académicas, como Critério e Porta Aberta ou, ainda, na qualidade de redator para a Revista Cenáculo).

Colaborador assíduo em eventos culturais e cívicos, fundador de vários boletins, com destaque para o Kaibauk, e membro da Comissão Nacional do Instituto Internacional de Língua Portuguesa (IILP), Crisódio Araújo foi  autor do livro de poesia «Plantámos a nossa independência no chão duro de Santa Cruz», publicado pela Edições LIDEL, em 2014.

O poeta, filósofo e político, homem que dedicou parte da sua vida adulta na defesa da língua portuguesa em Timor-Leste e no mundo, morreu muito precocemente, tendo deixado viúva e dois filhos, e uma grande saudade, em todo o Timor-Leste.

Chão duro da nossa independência

Retomo à terra do chão duro,
Terra de gente com dor e memória ainda,
Do povo bom e obstinado,
Das crianças com sorriso aberto ao futuro
E dos jovens com alma e bravura.
Relembro Novembro, terno e imorredoiro…
Como as memórias que ecoarão para além do vento
Ou como as lembranças que voarão muito acima do céu…
Recordo Novembro, tristemente doce,
Agora sem lágrimas
Porque fluíram já com as primeiras chuvas
E fecundam, agora e para sempre, a terra de Timor…
Chego agora, num instante e com encanto,
Ao centro das minhas raízes
E serenamente contemplo o amanhã
Escondido na penumbra das incertezas.

 


Mesmo assim consigo ainda vislumbrar
Dias terrivelmente belos atrás da porta da esperança…
Caminho agora ao lado da minha gente
Que sempre soube andar mesmo que sozinhos,
Mesmo que tristes… Mesmo que abandonados…
Olho mais uma vez para a Cruz
Que este povo também transportou
E levando com ela a dor de todos.
Penso nos sobreviventes do Massacre
E nas suas histórias de coragem e lealdade
Mergulhadas em epopeias de sangue e dor!
São memórias intensas que ninguém deverá apagar!!!
Penso nos mortos de Novembro
E voltam as certezas de outrora:
Sobre aqueles corpos tragicamente jovens,
Interrompidos no fulgor da vida e do amor,
Cantei o meu sonho de liberdade!!!
E sobre o chão duro e fértil de Santa Cruz,
Símbolo indestrutível da juventude timorense,
Plantei para sempre
A independência de Timor Loro Sa’e!!!

Crisódio de Araújo, Setembro de 2008

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