No que diz respeito à formação de professores, e em concreto para reflectir sobre os tipos de conhecimento praticamente obrigatórios para que o professor cumpra as suas funções educativas com sucesso, decidi “inspirar-me” nas opiniões do autor espanhol (Garcia, 1999) e de dois portugueses (Pacheco e Flores, 1999) que, por sua vez, se basearam em outros autores, nomeadamente, nos estudos de Carlsen (1987), Shulman (1987), Ball (1989), Sockett (1989), Grossman (1990) e Reynolds (1991).
Segundo estes investigadores, referências obrigatórias em contexto de educação, os tipos de conhecimento a destacar no âmbito da formação de professores devem incluir o «conhecimento psico-pedagógico», o «conhecimento do conteúdo», o «conhecimento didáctico do conteúdo» e o «conhecimento do contexto».
O «conhecimento psico-pedagógico» relaciona-se com o processo de ensino-aprendizagem (técnicas didácticas, avaliação, etc.), com as teorias do desenvolvimento humano, com a história, sociologia e filosofia da educação, com normativos, etc.
O «conhecimento do conteúdo», como a própria expressão indica, é relativo aos conhecimentos, conceitos, definições, etc., mas também aos paradigmas de investigação em cada unidade curricular.
O «conhecimento didáctico do conteúdo» faz a combinação entre o conhecimento da matéria a ensinar e o conhecimento pedagógico e didáctico de como a ensinar.
Repare-se que este tipo de conhecimento (didáctico do conteúdo), principalmente para a investigação em educação assume importância crescente porque conduz-nos à análise e à reflexão em torno de questões como as crenças, atitudes, etc., muito valorizadas no nosso País, e que de certa forma pode ajudar a melhor compreender a tese de que os professores têm temas preferidos e outros de que não gostam de ensinar, uma problemática muito interessante que nos transportaria para o domínio do “currículo oculto” ou “currículo nulo” (aquilo que não se ensina) temáticas muito trabalhadas pelo pedagogo brasileiro Tadeu da Silva.
Por último, e não menos importante, temos o «conhecimento do contexto» que nos remete para os aspectos ligados às características sociais e culturais da escola e do meio envolvente, nomeadamente conhecimentos sobre os alunos e respectivas famílias, uma preocupação que deve merecer a melhor atenção dos profissionais da educação timorenses devido ao facto de existirem muitas tradições seculares que devem ser mantidas e estudadas.
Ora bem, os quatro tipos de conhecimento descritos são fundamentais para a competência profissional do professor, mas, até pela dinâmica de tudo o que nos rodeia, é bom não esquecer, há sempre que considerar outras dimensões importantes para que o nosso professor obtenha e desenvolva competências necessárias, à gestão de conflitos, à concepção, execução e avaliação do projecto educativo de escola, e ao diálogo com os chefes de suco / aldeias, pais e encarregados de educação, etc.
Sobre a identificação de competências consideradas imprescindíveis ao exercício da actividade docente, Garcia (1999), baseado em estudos de Lynch (1989), autor que deve ser sempre citado no âmbito do debate sobre formação de professores, destaca algumas competências fundamentais para os professores que não resisto em compartilhar.
Por um lado, defende a tese de que o professor «deve desenvolver a integridade intelectual na recolha, utilização e avaliação de uma variedade de evidências como base para o desenvolvimento de juízos». Por outra parte, destaca a importância do professor «desenvolver a competência visual, linguística, estética e imaginativa como base para o diálogo e o discurso em contexto de diversidade intercultural».
Os resultados dos estudos de Lynch são de importância extraordinária porque sugerem que o professor deve desenvolver a sua capacidade de análise política global e de competências práticas tais como a comunicação, resolução de problemas e solução de conflitos, como opina Garcia, para reforçar «o desenvolvimento de valores e atitudes clarificados e reflexivos e suas aplicações como critério para tomar decisões equilibradas e sensíveis».
Nesta mesma linha de raciocínio do autor, um aspecto muito importante, corolário e exemplificativo do que já referi, passa pela necessidade do professor desenvolver a reflexividade crítica «em relação às imagens dos países considerados subdesenvolvidos e mostradas pelos meios de comunicação social, desenvolvendo competências de tomada de decisões colaborativas e participativas», e acrescento eu, em todas as questões análogas onde se justifica a análise e o pensamento crítico, com intervenção política e social.
A discussão educacional que proponho nesta reflexão, estrategicamente, dá relevância à deontologia pedagógica e aos tipos de conhecimentos e competências a ter em conta na formação de professores, porquanto, para além de serem assuntos obviamente importantes para o bom exercício da função docente, na minha opinião, também é uma forma eficaz dos professores se “defenderem” das críticas das famílias e da sociedade em geral.
É minha convicção, se atribuirmos relevância à deontologia pedagógica, as famílias e a sociedade em geral passarão a olhar para o professor como um profissional competente que valoriza a ética e a deontologia pedagógica, e que ao longo de toda a carreira tudo fazem para apostar na renovação e mudança dos seus conhecimentos, no desenvolvimento de competências, na inovação no âmbito do processo de ensino-aprendizagem, portanto, na prática da «reflexão na acção, pela e sobre a acção» (Fullan e Hargreaves, 2001).
Todas estas considerações parecem-me pacíficas e aceitáveis, contudo, apesar de sabermos que em grande parte «o êxito do desenvolvimento da escola depende do êxito do desenvolvimento do professor» (Day, 2001), é bom que todos nós, em particular o Ministério da Educação timorense, tenha consciência de que só haverá uma mudança educativa num quadro de responsabilidade partilhada, onde se incluem professores, família, escola, sociedade em geral e governo.
Na opinião do Partido Socialista de Timor, estas e outras questões afins, devem ser abordadas com seriedade e determinação pelos governantes do nosso País e pelos académicos timorenses que irão estar presentes no XXVI Encontro da Associação das Universidades de Língua Portuguesa (AULP), a ter lugar no Centro de Convenções, no próximo dia 29 de Junho, em Díli.
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