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Domingo, Dezembro 22, 2024

Nobel de Economia diz que Trump deu dinheiro para empresas

Paul Krugman, em artigo reproduzido pelo site da Exame, escreve que os cortes nos impostos dos Estados Unidos feitos pelo presidente Donald Trump em 2017 deveriam levar a um crescimento econômico anual de 3%, mas não foi o que aconteceu.

Segundo ele, até agora Donald Trump aprovou uma única peça significativa de legislação: o corte de impostos de 2017. “Para ser justo, foi um negócio bastante grande: as empresas, as principais beneficiadas, já economizaram mais de US$ 150 bilhões, e ao longo de uma década o corte tributário provavelmente vai ampliar o déficit orçamentário em mais de US$ 2 trilhões”, diz ele.

Mas o que se esperava, escreve Krugman, era que o corte de impostos fizesse mais do que dar mais dinheiro aos acionistas – ou, ao menos, era isso que seus defensores diziam. Também era esperado que ele levasse a vários anos de crescimento econômico elevado, coisa de 3% ou mais anualmente.

Observadores independentes estavam céticos, para dizer o mínimo, afirma Krugman. “Eles admitiam que o corte tributário poderia levar a um breve pico de insulina, porque é isso que grandes cortes orçamentários fazem. Porém, diziam eles, qualquer efeito favorável no crescimento logo passaria. Além disso, eles sempre disseram que ia levar algum tempo para analisar os reais efeitos do corte de impostos”, escreve.

Pico de insulina

Mesmo assim, afirma, quando a economia cresceu de modo bastante acelerado no segundo trimestre do ano passado, Trump e seus apoiadores se disseram convencidos de sua eficácia e ridicularizaram os críticos. De lá para cá, um pouco de tempo se passou. O gráfico abaixo mostra a taxa de crescimento da economia dos EUA, por trimestre, desde o começo de 2018. 

O último número não é oficial; mas há vários observadores independentes, inclusive bancos do Federal Reserve e instituições financeiras privadas, que produzem os assim chamados nowcasts (neologismo que combina as palavras “previsão” e “agora”, em inglês; em português, seria algo como “já-visão”), que estimam o crescimento com base nos dados mais recentes, diz Krugman. “Neste momento todos eles mostram um crescimento em desaceleração, e a maioria situa o primeiro trimestre para algo em torno de 1,5%”, afirma.

Logo, será que os resultados até aqui se parecem com a enorme e sustentada alta que o lado de Trump prometia ou com o pico de insulina passageiro previsto pelos críticos? “O senhor Trump é um tipo especial de líder. Quando as coisas não saem como ele queria, ou quando os eventos falham em acontecer do jeito que ele planejou e prometeu, ele sempre sabe exatamente o que fazer: botar a culpa em outra pessoa”, escreve. 

Sem surpresas, ele está afirmando agora que nós teríamos a enorme disparada econômica, o crescimento de 3%, tudo isso, se o Federal Reserve não tivesse aumentado a taxa de juros. “Ok, agora é a hora em que você precisa ser capaz de guardar duas ideias na cabeça ao mesmo tempo. O Fed errou ao elevar os juros? Provavelmente sim. Isso explica o fracasso do corte de impostos de Trump? Não”, equaciona.

Evasão de divisas

Segundo ele, claramente o Fed foi otimista demais sobre as perspectivas da economia, como tem consistentemente sido na última década. “Vale notar que, ao longo de todo esse período, os críticos conservadores do Fed – as mesmas pessoas que hoje apoiam o senhor Trump – atacaram a instituição por manter as taxas de juros muito baixas, e não muito altas. Ainda assim, agora está claro que a tentativa de normalizar a política monetária foi prematura”, afirma.

Porém, a alta prematura dos juros pelo Fed não é o motivo do corte de impostos de Trump estar fracassando, diz Krugman. “Como nós sabemos disso? Porque todas aquelas bravatas sobre por que o corte tributário faria milagres se baseavam em uma história específica sobre o que está travando a economia dos EUA. E aquela história estava, e ainda está, totalmente errada”, diagnostica.

A teoria trumpista – que, lamento muito dizer, foi apoiada por economistas conservadores que já deviam ter noção das coisas – foi que existia uma pilha enorme de dinheiro fora dos Estados Unidos que as empresas trariam de volta e investiriam de modo produtivo se tivessem o incentivo das taxas de juros menores. A questão é que a tal pilha de dinheiro era uma ficção contábil. E o corte de impostos não deu às empresas um incentivo para construir mais fábricas ou coisas assim; só o que ele fez foi induzi-las a mudar a tática delas de evasão de divisas”.

Krugman lembra que, “como destaca Brad Setser, do Conselho de Relações Exteriores, um olhar casual nos dados parece sugerir que as empresas americanas fazem muito de seu lucro em suas filiais no exterior”. “Porém, um olhar mais atento revela que o grosso desses lucros anunciado está em alguns poucos países pequenos com taxas de juros baixas ou inexistentes, como Bermuda, Luxemburgo e Irlanda. Essas empresas obviamente não estão obtendo lucros enormes nessas economias pequenas; elas só estão fazendo malabarismo contábil para atribuir lucros obtidos em outros lugares às filiais que podem até ter algumas poucas fábricas, mas que na maioria dos casos se resumem a pouco mais que um escritório pequeno, ou mesmo uma caixa de correio”, escreve.

Apple da Irlanda

Ele lembra que estes lucros basicamente falsos então se acumulam nos livros-caixa das filiais no exterior, em vez de na sede da empresa. “Mas isso não afeta a capacidade delas de investir nos EUA: se a Apple quiser gastar um bilhão de dólares aqui, ela sempre pode emprestar o dinheiro usando como garantia os ativos de sua filial irlandesa. Em outras palavras, os impostos nos EUA não vinham tendo nenhum efeito significativo no sentido de impedir investimentos reais na economia americana”, afirma.

Krugman diz que quando Trump cortou os impostos, algumas empresas “repatriaram o dinheiro”.

Contudo, na maioria dos casos, isso não teve significado econômico algum. Funciona assim a coisa: a Apple da Irlanda transfere alguns de seus ativos para a Apple dos EUA. Oficialmente, a Apple da Irlanda vem reduzindo seus gastos com investimentos ao mesmo tempo em que está pagando dividendos a seus investidores nos EUA. Na verdade, a entidade Apple tem o mesmo lucro total e os mesmos ativos totais de antes; ela não dedicou um mísero dólar a mais para compra de equipamentos, pesquisa e desenvolvimento ou qualquer outra coisa para a operação dela nos EUA”.

Não é surpresa, portanto, que a disparada nos investimentos que os economistas de Trump prometeram nunca tenha se concretizado, diz Krugman. “As empresas não usaram o respiro tributário para investir mais; elas basicamente o usaram para recomprar suas ações. Isso, por sua vez, colocou mais dinheiro nas mãos dos investidores, o que deu à economia um impulso temporário – embora, para 2018 como um todo, um dos maiores fatores do crescimento mais rápido tenha sido, acredite se quiser, o gasto mais alto do governo”, assevera.

Ou seja, a suposta teoria por trás do corte de impostos de Trump se revelou um fracasso completo. “Os contadores de empresas até que se divertiram explorando novos limites na evasão fiscal; o resto de nós acabou tendo de carregar coisa de US$ 2 trilhões a mais de dívida. Até aí, eu não estou muito preocupado com essa dívida. Considerando-se os custos baixos dos empréstimos, os custos e riscos da dívida federal são muito menores do que vinham afirmando os suspeitos de sempre – de novo, as mesmas pessoas que aplaudiram o corte tributário de Trump. Mas pensem em todas as outras coisas que poderíamos ter feito com US$ 2 trilhões – toda a infraestrutura que poderíamos ter construído ou arrumado, todas as pessoas a quem poderíamos ter oferecido uma cobertura básica de saúde, conclui.


Texto original em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV / Tornado


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