O Diário de Notícias e o Público têm agora novas direcções editoriais. No caso do Diário de Notícias, o novo director, Paulo Baldaia, era já um membro do grupo Global Média, detentor do jornal. No que se refere ao Público, o novo director passou brevemente pela direcção da TSF, rádio do grupo a que pertence também Paulo Baldaia, Porém, Dinis vem de um jornal electrónico de que foi fundador, o Observador, Sobre esta “dança de cadeiras” escrevi no blog Vai e Vem.
Linha político-ideológica do jornal
O que assinalo hoje é uma velha questão que consiste em saber o que é que, no fundo, marca e assinala para os leitores a orientação e o perfil de um jornal. De facto, quando um jornalista que foi fundador e director de um jornal claramente conotado com a direita política (o Observador) passa para director de outro jornal senão conotado com a esquerda política pelo menos não conotado com a direita (o Público), o que é que muda: o jornal ou a opção política do director?
Onde pode então o leitor encontrar a linha político-ideológica do jornal? No estatuto editorial, dir-se-à. Ora, os estatutos editoriais dos jornais não mudam com os directores. Na maioria dos casos mantêm-se indefinidamente dado que contêm princípios gerais e abstractos incontestáveis do ponto de vista da ética e da deontologia do jornalismo. Além de que nas redacções sobra pouco tempo para discussões éticas ou deontológicas. E para as discussões legais existem os advogados do grupo.
O Editorial
Chega-se então ao editorial. O editorial constitui um lugar de autoridade. Trata-se da afirmação de uma autoridade conquistada através da credibilidade e do prestígio alcançados (“acredito no que o jornal diz porque é ele que diz”). Essa confiança não se transfere automaticamente para cada um dos membros da sua direcção. Contudo, as posições da direcção, sobretudo as do director, marcam fortemente o perfil do jornal.
O estatuto editorial do DN refere que o jornal “assume a responsabilidade de emitir opinião própria através de editoriais assinados pela direcção”, sendo aí que se manifesta a “posição oficial” do jornal. A forma escolhida é a de editoriais assinados individualmente por cada membro da direcção. Ora, ao serem assinados, esses editoriais responsabilizam apenas o seu autor ou toda a direcção? No DN nem sempre foi assim. Nos anos 80, sob a direcção de Mário Mesquita, o jornal possuíu um “gabinete editorial” que produzia editoriais em nome do jornal, sem assinaturas individuais. Parece um modelo mais lógico e mais transparente.
No Público, ultimamente os editoriais não eram assinados mas o novo director decidiu que passariam a sê-lo. E, explica, ” porque a voz editorial do PÚBLICO não se faz só da sua direcção, verá nele também a assinatura de outros jornalistas que há muito conhece e que farão parte do nosso Conselho Editorial: Jorge Almeida Fernandes, Manuel Carvalho, Nuno Pacheco, Teresa de Sousa e São José Almeida.” O modelo parece pouco transparente. O Conselho Editorial aconselha a direcção ou assume posições em nome da direcção, isto é, do jornal?
Princípios e posições
É certo que não existem princípios de natureza ética ou deontológica que aconselhem uma ou outra opção, isto é, editoriais não assinados ou assinados e neste caso quem pode assiná-los. No caso do Público e dada a diversidade de posicionamentos político-ideológicos dos jornalistas que passarão a assinar os editoriais, qual deles representará a posição oficial do jornal? A opção parece, pois, ter sido, a de que o jornal não tomará posição.
É certo que a adopção de posições oficiais por parte de um jornal requer algumas condições que nem sempre existem, entre as quais, a definição clara do perfil e objectivos do jornal, a sistematização e discussão aprofundada dos assuntos, a formação de consensos e a existência de uma estrutura editorial vocacionada para a produção de opinião. Mas não é menos certo que para a grande maioria dos leitores interessa menos conhecer a posição individual do director ou do jornalista A, B ou C sobre determinado assunto do que a posição institucional do jornal.
Aparentemente, existir um grupo de jornalistas que assinam editoriais parece muito transparente e democrático. Mas se no Conselho Editorial existirem posições contraditórias, o que é normal e desejável, qual deles representa o jornal?
Artigo publicado inicialmente no blog VAI E VEM