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João de Sousa

Segunda-feira, Novembro 4, 2024

O DCIAP, a nova PIDE?

Estátua de Sal
Estátua de Sal
Economista reformado. Trabalhou como Professor universitário na empresa FEUC - Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra de 1983 a 2014

Todos os dias somos brindados com a telenovela de alguns dos julgamentos mediáticos que estão a decorrer em Portugal. Ele é a Operação Lex, ele é a Fizz, ele a Rota do Atlântico, já que, de momento, a Marquês parece estar no frigorífico à espera de melhor oportunidade. Chego a ter pena dos jovens repórteres que montam acampamento à porta das salas de audiência nestes dias de frio gélido. Só não ficam enregelados devido ao exercício físico que tem que praticar para atacar de microfone em riste todos os actores que entram e saem, arguidos ou candidatos a arguidos, advogados ou testemunhas.

A maioria desses directos não tem qualquer interesse jornalístico, não passando de uma forma de captar a morbidez voyeuristica  dos espectadores que se interessam pela vida dos mais famosos e que desfrutam, sem má consciência, do secreto gozo de os verem ali, indefesos, e caídos em desgraça.

Contudo, entre o dinheiro do Manuel Vicente, as esposas-namoradas do Dr. Rangel, os favores ao Vieira, ou as sombras do eminente Dr. Proença de Carvalho, surgiu algo de insólito e preocupante a que ninguém – nem a comunicação social, nem o poder político, nem o poder judicial, nem os comentadores de serviço -, deu qualquer importância. Refiro-me às declarações do advogado do Estado angolano, Paulo Blanco, também ele arguido no âmbito da Operação Fizz, que leva a juízo a presumível corrupção do ex-Procurador Orlando Figueira. E o que disse Paulo Blanco?

  1. Que o Ministério Público pratica ilegalidades.
  2. Que o Ministério Público conduz secretamente operações administrativas de investigação ao Procurador Geral da República de Angola, mas não só. Também a cidadãos portugueses, políticos, jornalistas, magistrados, requerendo e mantendo informação bancária sobre os mesmos.
  3. Em função disso, há pessoas que vivem em Portugal, condicionadas na sua acção diária. (Ver vídeo e as declarações proferidas em Paulo Blanco e Orlando Figueira desmentem-se e atropelam-se em tribunal).

Operações secretas?! Condicionamento de pessoas?! Será que passámos de novo a viver num Estado policial, sujeitos a uma ditadura secreta do Ministério Público?! Onde anda o Estado de Direito, afinal?

E tendo sido estas declarações proferidas em audiência perante um juiz, qual a reacção deste? Que tal era apenas “uma questão lateral”, já que não tinha interesse para o processo! Ou seja, pelos vistos até o juiz sabe que as afirmações são verdadeiras, mas não considera que os factos aludidos tenham qualquer gravidade. Extraordinário!

Ora, perante a gravidade destas afirmações quer a Procuradora-Geral da República, quer a Ministra da Justiça, quer o Primeiro-Ministro, quer o Presidente que opina e fala sobre tudo quanto mexe, deveriam ter vindo a terreiro, esclarecer a questão e sossegar a opinião pública. O que sucedeu foi aterrador: um silêncio sepulcral sobre o assunto, o que me leva a concluir que, provavelmente, Paulo Blanco tem mesmo razão quando diz que “há pessoas que vivem em Portugal, condicionadas na sua acção diária”, ou seja há muita gente no topo do aparelho do Estado condicionada pela sanha investigatória do Ministério Público. Depois do que sucedeu com o Ministro Centeno, já nada me espanta.

Como diz o ditado, “quem cala consente”, já que nenhuma voz se ergueu a desmentir Paulo Blanco ou a exigir-lhe provas inequívocas das suas afirmações, talvez por se saber que tais provas seriam apresentadas.

Eu não quero acreditar que tempos de má memória, de policiamento pidesco, estejam de regresso ao meu país, e que o destino da Nação esteja dependente de poderes ocultos e não escrutinados, operando nas costas dos cidadãos e fora do controle democrático.

Se é para manter este estado de coisas que ouvimos vozes a clamar pela recondução de Joana Marques Vidal, então o que está em causa não é sequer a recondução mas sim a destituição imediata da actual Procuradora. E enquanto o não é, seria de bom tom que viesse a público esclarecer o que são essas tais operações secretas de investigação. Os portugueses, vivem num país livre e democrático – ou pelo menos julgam que vivem -, e tem todo o direito a serem esclarecidos.

Porque o país e os cidadãos precisam e querem ter uma Justiça sã e eficaz. Sem que para a ter seja necessário transformar Portugal numa República de juízes.

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