Assinalou-se este ano o 65º aniversário da formação do Clube Bilderberg, também conhecido como Grupo Bilderberg ou Conferência Bilderberg. Segundo a versão oficial, nasceu da iniciativa de “eminentes cidadãos” dos EUA e da Europa, mas como veículo de apoio à NATO contra a URSS terá conhecido desde a primeira hora um forte incentivo dos principais serviços secretos dos dois lados do Atlântico (a CIA e o MI6) e mesmo depois da Queda do Muro de Berlim manteve esse mesmo papel de apoio à estratégia dos EUA/NATO.
Muito tem sido escrito ao longo dos anos sobre este areópago de ilustres que anualmente se reúnem num país diferente e em local adequado à sua protecção e ao secretismo com que desde sempre se procuraram proteger. Ainda assim é crescente o número de investigadores e pesquisadores – entre os quais é impossível não destacar o nome do jornalista lituano Daniel Estulin (que tem desenvolvido um trabalho de investigação em torno do Clube Bilderberg, sendo o autor de uma das obras mais aclamadas sobre o assunto: o seu «Toda a Verdade sobre o Clube Bilderberg» que tem edição portuguesa das Publicações Europa-América, revela boa parte da natureza das reuniões mantidas em vários locais do mundo, bem como a sua possível influência sobre as grande decisões políticas, económicas e sociais desde a sua primeira reunião em 1954) – que têm procurado transmitir-nos uma visão confiável das suas actividades. Fruto desta actividade, há já uma década que se escrevia nas páginas do TIMES ON LINE a propósito da reunião desse ano do Grupo Bilderberg: «Não digam a ninguém, não espalhem a informação, mas os mais poderosos do mundo vão novamente encontrar-se secretamente, para salvarem o planeta da catástrofe económica»…
Mas até o habitual humor britânico parece insuficiente para dar uma verdadeira imagem do que anualmente acontece nas reuniões para as quais são convidados cerca de centena e meia de representantes do mundo político, económico, militar, dos meios de comunicação social e dos serviços secretos, provenientes quase exclusivamente da Europa Ocidental e da América do Norte, que participam a título pessoal nos encontros à porta fechada que têm lugar em países diferentes e em super luxosos hotéis protegidos por fortes sistemas de segurança. Não é permitida a presença a nenhum jornalista ou observador, nenhum comunicado de imprensa é publicado e contrariando a “transparência” que proclamam é imposto aos participantes uma regra de silêncio draconiana.
Esta política de exclusividade e secretismo tem sido a característica desde a primeira hora de uma iniciativa lançada com o alto patrocínio do príncipe Bernardo da Holanda (a quem alguns investigadores apontam ligações ao III Reich de Adolf Hitler) ao que se diz para combater a crescente influência na Europa de políticas antiamericanas, que ganhou o nome a partir do local onde se realizou a primeira reunião – o Hotel Bilderberg, na vila holandesa de Oosterbeek – e que tem sido mantida em grande parte graças à conivência dos meios de informação cujos proprietários ou grandes decisores são membros activos ou convidados regulares.
A reunião anual do Clube Bilderberg, o selecto “clube” que já teve em Junho de 1999 uma reunião no Caesar Park Hotel Penha Longa, em Sintra, juntou este ano a elite da plutocracia em Dresden e que se propôs (segundo a sua página oficial) debater os seguintes temas:
- Uma ordem estratégica estável
- O que se segue para a Europa?
- Mudança climática e sustentabilidade
- China
- Rússia
- O futuro do capitalismo
- Brexit
- A ética da Inteligência Artificial
- O uso dos Meios de Comunicação como arma
- A importância do Espaço
- Ameaças cibernéticas
teve entre as presenças mais regulares e importantes a dos americanos: Henry Kissinger, “figura histórica” do núcleo que criou o grupo com o banqueiro David Rockefeller (também fundador da Comissão Trilateral, falecido em 2017) e James Baker, ex-secretário de Estado de Ronald Reagan e George Bush e actual conselheiro do Pentágono. Entre as figuras da actualidade destaque-se: Mike Pompeo, ex-chefe da CIA e actual Secretário de Estado; David Petraeus, general e ex-chefe da CIA; Jared Kushner, amigo íntimo do primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu, genro do presidente Donald Trump e seu conselheiro para o Médio Oriente. Entre os políticos “estrangeiros” note-se a participação do reconduzido Secretário Geral da OTAN, o norueguês Jens Stoltenberg; de Annegret Kramp-Karrenbauer, a recém escolhida presidente da CDU alemã e sucessora indigitada da chanceler Angela Merkel; do presidente do Partido Popular espanhol, Pablo Casado; do ministro francês das finanças, Bruno Le Maire, e do ex-primeiro ministro italiano, Matteo Renzi.
A lista conta mais de uma dúzia de personalidades ligadas ao mundo da imprensa (cerca de 10% dos participantes), com particular destaque para Javier Monzón, o presidente do grupo editorial espanhol Prisa, e para Martin Wolf, director do muito influente Financial Times; dentro da mesma linha de difusão de “informação” saliente-se ainda a presença dos historiadores Timothy Garton Ash (inglês) e do americano Niall Ferguson.
A conferência é o destaque do ano para uma elite plutocrata que se reúne para ouvir, uns quantos (poucos) para serem ouvidos e um terceiro grupo para ser “reconhecido”; sobre os dissertantes recorde-se que opinam sobre as crises que eles próprios criam e controlam, seja mediante claras manipulações dos famigerados “mercados”, seja mediante o controlo que exercem sobre os aparentes centros de decisão política (governos) e financeira (grandes bancos), enquanto sobre a última categoria importa referir a presença do ex-presidente da Comissão Europeia e actual presidente do Goldman Sachs International, Durão Barroso, que se fez acompanhar do presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, cuja participação se poderá inserir na lógica de apresentação de primo-ministeriáveis credíveis, há semelhança das verificadas em anos anteriores com José Sócrates, Pedro Santana Lopes, Durão Barroso, António Guterres e António Costa (todos candidatos confirmados a chefiar governos) ou, para referir só os mais recentes e que ainda não alcançaram o Olimpo, Ferro Rodrigues, Manuel Ferreira Leite, Paulo Rangel, Paulo Portas e António José Seguro.
Daniel Estulin cita no seu livro entre as “investiduras mais famosas: a eleição de Bill Clinton em 1992, depois deste ter participado na reunião de 1991; depois de ter assistido à reunião de 1993, Tony Blair, foi escolhido como líder dos Trabalhistas, em 1994, e primeiro-ministro em 1997; o ex-Secretário-geral da NATO, Jorge Robertsom, eleito para o cargo em 1999 depois de ter participado na reunião de 1998; a escolha de Romano Prodi para presidente da Comissão Europeia em Setembro de 1999, poucos meses após ter participado na reunião desse ano. Não mencionado por aquele investigador (a publicação do livro é de data bem anterior), existem fontes que admitem a possibilidade de Barack Obama e Hillary Clinton também terem participado (pelo menos em parte) da reunião que em 2008 teve lugar no estado norte-americano de Virgínia
É claro que o objectivo da reunião esteve muito para além destas, ou doutras, “investiduras” (recorde-se, por exemplo, os convites de 2014 ao actual presidente da República francesa Emmanuel Macron, para este anunciar a sua ruptura com François Hollande, ou em 2016, quando o então presidente da câmara de Le Havre e actual primeiro-ministro francês, Édouard Philippe, pronunciou o seu apoio a Emmanuel Macron) e o facto é que embora agora um pouco menos “secreta”, já que nos últimos anos aumentou substancialmente o escrutínio público sobre o Bilderberg a ponto de em 2013 ter passado a haver uma assessoria de imprensa não oficial, nem por isso os seus membros deixam de continuar a influenciar, para o melhor e o pior, os destinos dos milhares de milhões de cidadãos do planeta a quem continuam a recusar o direito de fazer ouvir as opiniões e de cumprir as vontades.
E para o conseguirem (porque o custo duma organização desta natureza é directamente proporcional ao estatuto e qualidade dos participantes) beneficiam, como escreveu Charlie Skelton neste artigo do jornal inglês The Guardian, do apoio de uma «…instituição de caridade registada oficialmente como a Associação Bilderberg…» que felizmente «…recebe regularmente quantias de cinco dígitos de dois gentis apoiantes dos seus benevolentes objectivos: a Goldman Sachs e a BP». Dúvidas sobre o verdeiro objectivo duma cimeira que junta a nata da finança e da indústria mundial com os seus dilectos representantes (os políticos que fazem, ou querem fazer, eleger pelas populações) e alguns jornalistas (criteriosamente seleccionados e ligados aos influentes The Economist ou do Financial Times) para ouvirem gurus como Henry Kissinger (membro da Comissão Trilateral e ex-secretário de estado de Richard Nixon e Gerald Ford), são tanto mais justificadas quanto é espesso o manto de silêncio que tem coberto as anteriores iniciativas.
Distantes parecem os tempos em que se falava sobre os “segredos” que então se tentavam preservar através do elitismo dos participantes e das densas cortinas de desinformação e segurança policial que rodeavam o “clube”, adensando a ideia de que este pretenderá esconder mais do que candidamente deixa transparecer; situação que se mantém na actualidade, bastando recordar que alguns dos seus membros regulares e mais proeminentes ou pertencem à elite plutocrata ou participam noutras organizações – como a já referida Comissão Trilateral – e em “think tanks” com reconhecidos papéis interventivos na definição das grandes linhas da política mundial (como é o caso do conceituado Council on Foreign Relations), pelo que as referidas medidas de abertura e transparência continuarão a não passar de mera manobra de contra-informação a quem interessa ver escolhidas as opções e aplicadas as medidas que melhor os protegem ou melhor servem os seus interesses.
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