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Sexta-feira, Novembro 22, 2024

O meio ambiente, um ângulo morto para a economia

Arnaldo Xarim
Arnaldo Xarim
Economista

As cada vez mais versadas questões da crise ambiental e climática ainda não são um assunto popular entre os especialistas económicos que continuam focados nas tradicionais questões de valor e preço ou, escolhem preferencialmente temas de estudo e reflexão com maior probabilidade de publicação nas revistas da especialidade.

William Nordhaus (Wikipédia)

Com a excepção de William Nordhaus (Nobel da Economia em 2018, com vários trabalhos publicados nesta área), este quase bloqueio à pesquisa académica e a concentração de trabalhos nos temas com maior probabilidade de publicação tem contribuído para criar um ciclo vicioso onde poucos trabalhos sobre o meio ambiente ou as mudanças climáticas significam muito poucas citações, o que de modo algum constitui incentivo para mais trabalhos sobre o assunto. Pior, persiste-se em excluir quem formule perspectivas diferentes, afastando-os da publicação nos mesmos periódicos e de lugares de destaque em conferências, impedindo-os de debate com aqueles cujas declarações são, na prática, tidas como dogmas.

Por outro lado, basta ver a também reduzida quantidade de trabalhos académicos sobre as questões da desigualdade e da redistribuição de riqueza (e estes são temas e problemas basicamente económicos) para perceber como os pesquisadores evitam as chamadas questões de economia política e de maior pendor social, preferindo-lhes as que se pretendem mais objectivas, como se o trabalho de pesquisa e investigação na área económica pudesse oferecer um ponto de vista neutro sobre qualquer escolha política.

Outra importante limitação será a obrigatória redução ao indicador monetário como única medida de valor – há alguns anos já que se debate a necessidade de substituição do PIB (Produto Interno Bruto, expresso como o somatório, em valor monetário, de todos os bens e serviços produzidos numa determinada região ou país, durante um período determinado de tempo) como indicador de bem-estar por outro (ou outros) que ajudem a diferenciar entre o “bom crescimento” e o “mau crescimento” e que desviem o foco de um PIB transformado em obsessão pouco saudável e numa perversa influência sobre o bem-estar humano e a felicidade – e a natural dificuldade de contabilizar ou valorizar a Natureza ou o custo das alterações climáticas; depois ideias como a da preservação da natureza podem chocar directamente com os próprios fundamentos da noção de criação de riqueza e de mais-valias – um economista “puro” dificilmente concebe a ideia de deixar de realizar um investimento (por exemplo a exploração de uma mina e a consequente criação de riqueza) em benefício da preservação ambiental e paisagística, que não consegue ou não sabe avaliar – e é muito mais simples e perfeito (solução óptima) lançar a ideia de um imposto global sobre o carbono.

Enquanto a maioria dos grandes pensadores económicos continua sem incluir nas suas formulações a ideia básica da existência limitada de recursos – persistindo na ideia de um crescimento económico contínuo – a ciência económica vai continuar alheada à necessidade de uma abordagem mais ecológica, mantendo-se a ideia que o meio ambiente é um mundo à parte que pode ser justaposto ou integrado na chamada esfera económica, quando na realidade eles interagem constantemente, perspectiva que só é alterada quando a degradação ou mesmo o esgotamento de um recurso leva a um inevitável aumento do seu preço.

Se a generalidade dos teóricos mais consagrados parecem ainda alheados à necessidade de incluir a sustentabilidade como um parâmetro, a comunidade e os jovens em especial já lançaram algumas iniciativas, especialmente orientadas para a melhoria da formação entre os economistas. Assim, a rede Economists for Future apresenta propostas concretas para a formação e a informação de economistas sobre a crise ambiental e a plataforma Exploring Economics, pretende apoiar a autoformação, a divulgação de boas práticas e reunir uma comunidade dinâmica em torno de workshops e seminários. É que fomentar uma abordagem conjunta das questões ambientais e sociais é actualmente essencial e deve ser construída sobre um diálogo real e plural, que revele abertura teórica e interdisciplinaridade; é um projecto a empreender com empenho e seriedade para que os economistas possam contribuir da melhor forma possível nos debates sobre a transição.

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