Não tenho religião. Costumo definir-me como um céptico optimista. Converso com deus através dos mendigos e dos loucos que vou encontrando pelas ruas. Nupérrimos apóstolos, acredito. Em resultado destas minhas confabulações escrevo uma nova doutrina. O Evangelho dos Loucos de Deus.
As pessoas a quem explico o sentido desta minha fé parecem ficar, a toda a hora, boquiabertas. Talvez por que andem demasiado preocupadas em ouvir o que deus tem para lhes dizer, falhando meramente no que lhe dizem elas.
Neste meu afã percebi que dar e receber são, porventura, um só. Tudo o que dou, dou a mim mesmo: o sorriso que dou, o amor que dou, a paz que dou, a gentileza que dou, a alegria que dou, a irritação que dou…
O que não dou tiram-me. Afirmo-o com demasiada frequência. Afinal viemos ao mundo de mãos vazias, retornando do mundo de mãos vazias.
À vista disto, desinquieta-me saber que é de súbito natal. Observo a gente que corre pelas suas músicas acima e abaixo. Houve tempos em que pensava ser apenas mais um. Hoje sei que para alguns entre nós será somente o ultimo natal. A angústia de um natal talvez natal.
Dizem que sempre que nasce um deus outro morre. Esta é por fim a minha fé. A minha única esperança.