A cimeira dos BRICS, que teve lugar entre 22 a 24 de Agosto de 2023 na África do Sul, poderá ficar para a História como um passo fundamental na formação de um bloco com o objectivo de desafiar o domínio ocidental e a confirmação da vontade de ser uma alternativa à ordem mundial.
No plano económico, o alargamento a mais países africanos deve ser entendido num período em que este continente reivindica a substituição do financiamento de infra-estruturas por mais investimentos de base industrial, enquanto no plano político ressaltam a posição do Egipto no quadro dos estados islâmicos do Norte de África e o da Etiópia na região do Corno de África, onde o seu desenvolvimento e os seus resultados económicos deverão ajudar as economias vizinhas no futuro, oferecendo uma opção aos programas propostos pelo Ocidente e mostrando as vantagens que os BRICS poderão representar para a África e outras regiões. Tanto assim é que países como a Argélia, Bahrein, Kuwait, Marrocos e Palestina são apenas alguns dos que já manifestaram publicamente o desejo de aderir.
No plano demográfico, os países africanos apresentam populações jovens, dinâmicas e em crescimento, o que as aproxima de outros membros dos BRICS, como a China e a Índia. Já a Argentina, com uma população envelhecida e uma economia francamente distante da do México (segundo país da América Latina em termos de PIB, mas fortemente condicionado pelos seus problemas fronteiriços com os EUA), deverá a sua participação ao interesse do Brasil.
A proposta, avançada pela Rússia, de transformar os BRICS num bloco comercial é tanto mais importante quanto se vive uma conjuntura onde imperam as sanções económicas impostas pelo Ocidente e se o grupo começar a funcionar como um bloco comercial com termos de comércio justos, outros países poderão equacionar as vantagens de se candidatarem à adesão; se os BRICS se posicionarem como um bloco comercial, com regras eficazes e abertas, poderão até suplantar a OMC (Organização Mundial do Comércio), organização que a maioria dos países em desenvolvimento acusa de favorecer as economias ricas do Ocidente.
Embora esta faceta pareça reduzir a verdadeira essência da cimeira à questão de natureza económica da reorientação das trocas comerciais do grupo para fora da esfera de influência do dólar norte-americano e dos ditames do Ocidente, ela representa muito mais que uma questão económica – ainda assim o BRICS+ (o grupo dos cinco iniciais com os seis novos membros) representam quase 50% da população mundial e mais de 30% do PIB mundial – e traduz a verdadeira essência e a real motivação dos BRICS que é de natureza geoestratégica.
Com o BRICS+ a ser cada vez mais difícil de ignorar no panorama mundial (no conjunto estes países representam 45% da produção mundial de petróleo, 36% da produção de gás e possuem importantes reservas de minério de ferro, carvão e bauxite, para além do papel quase insubstituível que representam na agricultura mundial) e o comércio dos países mais ricos a deles depender em grande medida, ganha nova importância o seu claro posicionamento estratégico em oposição a um Ocidente ainda dominante, mas em clara fase de enfraquecimento.
O BRICS+, uma ordem mundial cada vez mais multipolar e os realinhamentos a ela associados, fomentarão efeitos políticos, económicos e sociais em especial para as regiões do Médio Oriente e do Norte de África, minando potencialmente o poder dos EUA no processo.
Este efeito deverá tornar-se ainda mais evidente com o aumento do número de aderentes – além dos anteriormente referidos países islâmicos do Médio Oriente e do Maghreb, já se fala no Cazaquistão, na Tailândia e na até agora preterida Indonésia – e especialmente se se lhe juntarem outras organizações já existentes, como a União Económica Eurasiática (estrutura supranacional, criada em 2014, que integra a Arménia, a Bielorrússia, o Cazaquistão, o Quirguistão e a Rússia) e a Organização para Cooperação de Xangai (organização política, económica e militar da Eurásia, particularmente orientada para a cooperação em matérias de segurança, que foi fundada em 2001 pela China, Cazaquistão, Quirguistão, Rússia, Tajiquistão e Uzbequistão, inclui ainda a Índia, o Paquistão e o Irão), organizações que integram já alguns dos actuais BRICS.