Não deixa de ser surpreendente que muitos comentadores e jornalistas estranhem que o Partido Socialista (PS) não comente os casos judiciais que envolvem José Sócrates e, mais recentemente, o seu ex-ministro Manuel Pinho. Alegam esses comentadores que como a justiça em Portugal é demorada o PS devia pronunciar-se e demarcar-se já dos actos de corrupção de que Sócrates é acusado e dos dinheiros que Manuel Pinho terá recebido do BES enquanto era ministro do governo de Sócrates.
Para estes comentadores o que já se sabe sobre Sócrates é suficiente para que o PS se pronuncie, mesmo antes de ser dado como culpado pelo tribunal dos crimes de que é acusado pelo Ministério Público. Apesar de todos reconhecerem que a divulgação televisiva dos interrogatórios judiciais não acrescentou informação ao que já fora publicado sobre o processo, foi essa divulgação que despoletou nestes comentadores a urgência de uma posição do PS, sobretudo depois da declaração de Ana Gomes de que o PS não pode continuar a ser “instrumento de corruptos e criminosos”.
É evidente que o PS não é responsável pelos actos praticados por um ou mais dos seus dirigentes. Nem os ministros que integraram o governo de Sócrates podem ser culpabilizados por crimes pelos quais o tribunal venha eventualmente a condenar José Sócrates. Aliás, pode perguntar-se porque razão os órgãos fiscalizadores do governo, desde logo, o Parlamento, mas também os jornalistas e o Tribunal de Contas não descobriram os crimes de que agora Sócrates é acusado e Manuel Pinho suspeito.
Aos comentadores impacientes que não podem esperar pelo julgamento de Sócrates não interessa aguardar até lá para então se saber até que ponto as acusações que recaem sobre ele se relacionam com o exercício das suas funções de primeiro-ministro, isto é, se Sócrates é de facto o dono dos milhões que lhe são atribuídos pelo Ministério Público como resultado de luvas recebidas enquanto primeiro-ministro.
Sócrates admite que pediu e deve muito dinheiro a Carlos Santos Silva, seu amigo de infância, embora negue que tenha praticado actos de corrupção. Ser financiado por um amigo, não sendo crime, é do ponto de vista ético reprovável num primeiro-ministro. Porém, se assim for, trata-se de uma questão da vida privada de Sócrates pelo que não pode exigir-se que o PS se pronuncie sobre ela. O contrário constituiria uma cedência ao populismo.
Os comentadores impacientes que querem que o PS comente o processo Sócrates e o caso Manuel Pinho não exigiram que os amigos de Ricardo Salgado, entre os quais o Presidente Marcelo e os jornalistas que ele convidava para férias na neve na Suiça e em França, comentem e se demarquem do ex-banqueiro.
É um maul sinal que pessoas influentes na formação da opinião pública se sirvam das suas tribunas mediáticas para pressionarem outros a violarem princípios básicos como a presunção da inocência e a separação de poderes. Não é verdade que a justiça está a funcionar? Então deixemo-la funcionar!
O que havia a dizer por parte do PS sobre Sócrates, disse-o António Costa no dia em que Sócrates foi detido. Tudo o que viesse dizer antes do julgamento do ex-primeiro ministro seria uma irresponsabilidade.
Exclusivo Tornado / VAI E VEM
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