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Segunda-feira, Dezembro 23, 2024

O que aí vem: desemprego e pobreza

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

No 3º trimestre de 2020 o desemprego atingiu 655.100 trabalhadores e apenas 230.000 recebiam subsidio de desemprego, o apoio aos desempregados diminuiu e a pobreza alastrou no país. As medidas tomadas pelo governo, devido 2ª vaga do “covid”, causarão um novo afundamento da economia e mais desemprego

No 3º Trimestre de 2020, o desemprego oficial era 404.100, mas o desemprego real atingia 655.100 trabalhadores, a taxa de desemprego oficial era de 7,8% enquanto a real atingia já 12%, e o numero de desempregados a receber subsidio de desemprego era apenas de 230.000, quando o numero total de desempregados era 655.100. Como consequência das medidas tomadas recentemente pelo governo, devido ao aumento da pandemia e à fragilidade do SNS causada pela falta de investimento e de planeamento, a economia vai-se afundar-se de novo e o desemprego e a pobreza vão aumentar mais no país. São realidades que seremos obrigados a enfrentar.

O estudo mostro, utilizando dados do INE e da Segurança Social, que no 3º Trimestre de 2020, o desemprego oficial era 404.100 mas o desemprego real atingia 655.100 trabalhadores, a taxa de desemprego oficial era de 7,8% enquanto a real atingia já 12%, portanto os dados do desemprego oficial, que têm de ser divulgados pelo INE, não dão a verdadeira dimensão do desemprego real em Portugal e da pobreza causado por ele.

Mostro também  que o número de desempregados a receber subsídio de desemprego era apenas, na mesma data, de 230.000, sendo 425.100 excluídos pela lei restritiva do tempo da “troika” e do governo PSD/CDS ainda em vigor. E que, como consequência das medidas agora tomadas pelo governo, devido ao aumento da pandemia e à fragilidade do SNS que está a atingir o seu limite máximo devido ao rápido aumento dos portugueses infetados, a economia vai-se afundar de novo e desemprego crescer mais no país: É uma realidade difícil que temos de enfrentar e também temos de fazer tudo que é possível para que o impacto económico e social das medidas seja o mais reduzido possível.

 


Estudo

No 3º trimestre de 2020 o desemprego atingiu 655.100 trabalhadores e apenas 230.000 recebiam subsidio de desemprego, o apoio aos desempregados diminuiu e a pobreza alastrou no país. As medidas tomadas pelo governo, devido 2ª vaga do “covid”, causarão um novo afundamento da economia e mais desemprego

O INE acabou de publicar os resultados do inquérito ao emprego referentes ao 3º Trimestre de 2020. Após termos denunciado em estudos anteriores que o INE reduzia o desemprego oficial quando ele, de facto, estava a aumentar, no 3º Trimestre de 2020, o INE inverteu o que vinha fazendo (queda continuada do emprego oficial) e aumentou o número de desempregados  em 125.000, mas continuou a ignorar a existência de 251.000. O gráfico 1,com os dados divulgados pelo INE, mostra a diferença grande entre o desemprego oficial divulgados pelo INE e o desemprego real, aquele que efetivamente existe no país.

 

Gráfico 1 – Desemprego oficial (barra azul) e desemprego real (barra vermelha) – Milhares de desempregados Fonte: INE

Para compreender a diferença entre desemprego oficial e desemprego real é preciso conhecer a forma como o INE calcula o desemprego oficial. O INE só considera como desempregados os trabalhadores que não têm emprego e que procuraram emprego no período em que fez o inquérito. Os desempregados que não procuraram emprego na altura em que o INE fez o inquérito, que designa por “inativos disponíveis e indisponíveis”, o INE não os inclui no número oficial de desempregados que divulga no fim de cada trimestre, apesar de serem desempregados de facto. E o número de desempregados que o INE não tem incluído no número oficial de desemprego que divulgou no fim de cada trimestre de 2020 foram os seguintes: no 1º Trim.2020: 169.900 desempregados; no 2º Trim.2020: 337.500 desempregados; e no 3º Trim.2020: 251.000 desempregados.

A simples observação do gráfico 1, revela uma evolução incompreensível do desemprego oficial, que consistiu no facto de ele ter  diminuído de uma forma continua entre o fim do 4ºTrim.2019 e o 2º Trimestre de 2020, ou seja, até junho, quando a crise causada pelo COVID começou a ter efeitos dramáticos na economia, com o fecho das empresas, a reclusão das pessoas em casa e  despedimentos, logo a partir de março de 2020. Segundo o INE, o desemprego oficial foi de 352.400 no 4º Trim.2019, de 348.100 no 1º Trim.2020 e de apenas 278.400 no 2º Trim.2020. Nesta altura denunciamos que a queda continuada nos números do desemprego oficial do INE não refletia a realidade onde o desemprego real tinha disparado. Depois de termos denunciado tal situação, o INE aumentou, no 3º Trim.2020, o desemprego oficial em 125.000,  mas ainda deixando de fora do desemprego oficial 251.000 desempregados (inativos disponíveis e não disponíveis).

Enquanto o INE reduzia o desemprego oficial, o desemprego real, que inclui a totalidade dos desempregados, aumentava continua e significativamente no país: 4º Trim.2019: 522.300 desempregados; 1º Trim.2020: 535.700; 2º Trim.2020: 615.900; 3º Trim.2020: 655.100.

 

A taxa de desemprego real é muito superior à taxa de desemprego oficial divulgada pelo INE a qual pode enganar

Também se verifica uma diferença muito grande entre a taxa de desemprego oficial, que ilude a opinião pública sobre a verdadeira dimensão do desemprego , e da miséria e pobreza que a ele causa, e a taxa de desemprego real, que inclui a totalidade dos desempregados existentes já no país, e sobre o verdadeiro aumento do desemprego. O gráfico 2 mostra a diferença existente entre eles, e a dimensão do que é escondido aos portugueses.

 

Gráfico 2 – Taxa de desemprego oficial (barra azul) e desemprego real (barra vermelha) Fonte: INE

A diferença entre a taxa de desemprego oficial e a taxa de desemprego real aumentou significativamente entre o 4º Trim.2019 e 3º Trim.2020. No 4º Trim.2019, essa diferença era de 2,9 pontos percentuais (6,7% e 9,6%) e no 3º Trim.2020 era já de 4,2 pontos percentuais (7,8% e 12%). É reduzindo artificialmente o desemprego oficial que se esconde aos portugueses a verdadeira dimensão do desemprego, da pobreza e mesmo o seu alastrar.

 

No 3º trim. 2020, o número de desempregados aumentou 4,5 vezes mais do que a subida nos desempregados a receber subsidio e, como consequência, a pobreza aumentou

O desemprego é a causa mais importante da pobreza no país. Mesmo antes da pandemia, 47,5% dos desempregados estavam no limiar da pobreza. A maioria dos desempregados não recebe  o subsídio de desemprego porque a lei os exclui. O gráfico 3 mostra precisamente isso.

 

Gráfico 3 – Desempregos totais (barra azul) e desempregados a receber subsidio de desemprego (barra vermelha) – Milhares Fonte: INE e Segurança Social

No 3º Trim.2020, o desemprego aumentou em 39.000 mas os que recebem subsidio de desemprego subiu apenas 8.000. No 2º Trim.2020, 36 em cada 100 desempregados recebiam subsídio de desemprego, enquanto no 3º Trim.2020 só 35 em cada 100 o recebiam. O desemprego aumentou, mas o apoio aos desempregados diminuiu, logo a pobreza cresceu.

 

A criação de um apoio extraordinário aos desempregados  que perderam o subsidio de desemprego e aumento das pensões mais baixas em 10€ a partir de Jan. 2021 medidas importantes, mas não suficientes para combater a pobreza que está a aumentar

Num estudo anterior (44/2020) referimos que a proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2021 criava no nº1 do artº 112, umApoio Extraordinário ao Rendimento dos Trabalhadores , com o objetivo de assegurar a continuidade dos rendimentos das pessoas em situação de particular desproteção económica causada pela pandemia da doença COVID 19”. E era uma medida importante embora insuficiente, pois previa abranger apenas 170.000 trabalhadores que tinham perdido o seu rendimento, quando o número de desempregados que não recebiam subsídio de desemprego era 425.000.

Durante as negociações, com os partidos da esquerda estes conseguiram, segundo os media, que fosse inscrito no OE uma verba que permite pagar aquele apoio extraordinário a 250.000 desempregados (uma melhoria importante, mas ainda insuficiente, pois os desempregados que não têm qualquer rendimento eram, no 3º Trim.2020, já 425.000); também foi positivo, segundo os media,  que tenham conseguido que o aumento de 10€ atribuído aos pensionistas com pensões até 659€ começasse a ser pago, não a partir de agosto de 2021 como constava da proposta inicial da Lei do OE-2021, mas a partir de janeiro de 2021.

 

É necessário tratar a economia com o mesmo cuidado que se trata a saúde, investindo muito mais em equipamentos e profissionais para o SNS com o objetivo de garantir o funcionamento da economia, pois o afundamento desta causará mais mortes do que o “covid” devido ao aumento da pobreza e à falta de assistência médica em doenças letais

O agravamento da pandemia, e as medidas tomadas, vão determinar inevitavelmente um maior afundamento da economia e, consequentemente, o aumento significativo de desemprego. Na economia não há milagres, e esta é uma previsão certa, como aquela que referimos aquando do início da pandemia em março de 2020.

Nessa altura foi como a economia não existisse, e como a crise de saúde publica causada pelo COVID fosse de curta duração, e as consequências foram dramáticas em termos de emprego destruído, perda de rendimentos e  no alastrar da miséria. Estamos apenas a constatar o facto, e não a afirmar que podia ter sido diferente, tal era o estado de impreparação do país com uma economia dependente e frágil e com o SNS também frágil.

O teletrabalho, que que já abrangia 681.900 trabalhadores no fim do 3º Trimestre de 2020 segundo o INE, e o seu previsível aumento significativo imposto, primeiro,  pela Resolução do Conselho Ministros 92-A/2020 e, depois, pelo Decreto Lei 94-A/2020, e a reclusão em casa dos trabalhadores que dele resulta, para além de provocar a desorganização das empresas e dos serviços públicos, e a diminuição da capacidade de resposta e produtividade, pela dimensão que tem, e pela falta de organização, planeamento e de competências que exige, também causa uma diminuição acentuada do consumo interno o que é visível por quem percorra as ruas das cidades, com estabelecimentos abertos mas vazios de clientes,  o que levará à falências e fecho de inúmeras empresas, acelerando de uma forma significativa o aumento do desemprego.

Se associamos a tudo isto, uma nova queda das exportações portuguesas (no 2º Trim.2020, as exportações diminuíram 39,5% quando comparado com o período homólogo de 2019) que é previsível devido à implementação, pelos respetivos governos, de medidas semelhantes nos países para os quais Portugal mais exporta (Espanha, França, Alemanha) é fácil de concluir a situação dramática em que cairão mais centenas de milhares de famílias portuguesas causada pelo desemprego maciço e crescente e pela, consequente, perda total de rendimentos.

É necessário tratar a economia da mesma forma que se trata a saúde, investindo muito mais e atempadamente no SNS (não ficando por promessas de mais investimentos em equipamentos de saúde e de contratação de mais profissionais de saúde que levam meses a serem cumpridas ou que não são cumpridas, como está a acontecer), para garantir o funcionamento da economia (a incapacidade de planeamento e de organização e a insuficiência de investimentos no SNS está a contribuir em muito também para afundar a economia) e ter também em conta sempre, quando se tomam medidas para defender a saúde, os seus efeitos na economia pois, caso contrário, o número de mortes causada pela pobreza  e pela falta de assistência médica em outras doenças letais, que não as causadas pelo COVID, será muito maior que as provocadas pelo “coronavírus”, que só são aquelas que a comunicação social divulga todos os dias, como se deixasse de morrer que não fosse devido ao “coronavírus” ou que não estivessem a aumentar as mortes causadas por outras doenças.



 

 


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