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Sábado, Dezembro 21, 2024

O texto aparece na paisagem inventada

Vitor Burity da Silva
Vitor Burity da Silva
Professor Doutor Catedrático, Ph.D em Filosofia das Ciências Políticas Pós-Doutorado em Filosofia, Sociologia e Literatura (UR) Pós-Doutorado em Ciências da Educação e Psicologia (PT) Investigador - Universidade de Évora Membro associação portuguesa de Filosofia Membro da associação portuguesa de Escritores

Madrugada ainda cheira a vento. Ao fundo, sinistros passos de letras que deambulam silêncios para se calarem as estrelas. Talvez algum mar por ali, sente-se na pele a bruma que normalmente só o mar sabe colocar sobre as feridas do tempo.

Cabe-nos absorver o impossível, esse cataclismo de sinos por alguma torre mas como?, é madrugada ainda e nesse item exige-se silêncio. Discernir o certo é falso, é como a fome quando desculpa para mais pão com manteiga e encharcar a barriga de tédio. Nada adianta.

Surgem palavras convexas para se soletrarem sem tempo, esvaziar o silêncio é como dormir sentado num comboio sem rumo onde ficam apenas as sombras da saudade.

“o texto aparece na paisagem inventada”

E lentamente discorrem rumos para que os séculos se acumulem nas viagens, nos claustros da ilusão ou no tempo a perder, isso, nada adianta ser inútil, isso cansa-nos, verdade, mais vale adocicar o peito com algum óleo vegetal principalmente de soja, envenena menos, intoxica menos, lubrifica as palavras e não cansa, é suave apenas ao espalhar-se depois pelo corpo que derrete no calor das ideias sobre uma terra de ninguém, sim, a tal que não deve certamente existir mas é inventada no solfejo salgado de um verso escrito nas paredes que nem sequer ainda surgiram.

Tantos prédios neste deserto de sal e cal para nada, um vazio que arrepia as entranhas e regela a pele como o quente das tardes vadias por um bar qualquer absorver tantos nadas que apenas preenchem a ansiedade. Não sei o que sinto nem o que pretendo sentir, apetece-me não estar e pronto, esta sensação de encarnar poros nas areias que vou encontrando por estas ruas onde nada existe, sim, e aí,

“o texto aparece na paisagem inventada”

letras para ninguém soletrar nunca, deixar bem vincada nas paredes essa sensação, esse repúdio pelos tédios e repetições, cansaços fartos de nada e vadiar os contornos da minha cabeça nesta talvez cidade que nunca existirá, é apenas uma mentira recriada para me encantar e divertir e fazer sorrir mesmo que sozinho neste quintal que recrio também para escrever.

Sinto sorver-se na pele todas as sensações como se fossem emoções cantadas sei lá onde e pianos em todas esquinas tocando sozinhos enquanto passo por mim, ali, sentado de vez em quando para me refastelar dos céus que me sobrevoas as ideias que vou, cada vez mais, perdendo. É madrugada ainda, talvez queira ou dormir ainda, tento, tento, e não sei se consigo. Fica a intenção.


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