Na entrevista de sexta-feira, Lula afirmou ter 80% do ministério na cabeça. Embora ele não confirme ninguém, de suas conversas com políticos e aliados em Brasília vazaram alguns nomes que estão entre os 80%. E alguns dos dilemas que dificultam a definição dos outros 20%.
O que Lula confirmou na entrevista foi apenas a exclusão de Gleisi Hoffmann do ministério, para que continue presidindo o PT, tarefa, segundo ele, mais importante que a de muitos futuros ministros. E o fez para estancar logo movimentos pela sucessão de Gleisi no partido. A tarefa que deu a ela tem a ver com preocupações maiores de Lula, que vão muito além do ministério. O quadro é bem diferente do de 2003. Agora haverá um Bolsonaro raivoso liderando uma extrema direita que não existia naquele tempo. A retração na economia, nacional e global, pode retardar a produção de resultados positivos. E o PT, nas disputas do futuro, não contará mais com Lula. Mas voltemos à equação 80% x 20%. Lula deverá ter mais ou menos 30 ministros, e isso significa que já tem mais de 20 ministros na cabeça, mas sabemos de poucos praticamente certos, como Mauro Vieira, em Relações Exteriores, José Múcio Monteiro, na Defesa, Flávio Dino na Justiça (com ou sem separação da área de Segurança. Isso não está decidido).
Nas últimas horas, avançou o nome do deputado Paulo Pimenta para ministro das Comunicações. Ele teve duas longas conversas com Lula entre quinta e sexta-feira. Esteve muito próximo de Lula nos dias piores e foi dos primeiros, no PT, a ter uma prática de comunicação digital, atuando nas redes sociais.
Avançou também o nome do advogado negro Silvio Almeida para Direitos Humanos, pasta que terá algumas secretarias temáticas. É também praticamente certo que o PSB ficará com Ciência e Tecnologia e o indicado do partido é Márcio França.
Outros nomes estão bem guardados no lobo frontal do cérebro de Lula, área responsável pelo raciocínio e os juízos mentais.
Agora vamos aos dilemas que podem estar dificultando a escolha dos 20%.
1. Haddad na Fazenda – Embora seja dado por muitos como certo, as resistências do mercado financeiro não foram inteiramente contornadas. Lula até pediu ajuda ao banqueiro André Esteves. Já se fala em Haddad no Planejamento, em dobradinha com um nome palatável ao mercado na Fazenda. Como um dos pais do Real, Arida ou Lara Resende.
2. Meio Ambiente – Marina ou não Marina, eis a questão. Lula não gostaria de repetir ministros nas mesmas pastas e Marina Silva, além do mais, é tida como alguém que, se nomeada, ficará indemissível. Por isso se fala nela como Autoridade Nacional Climática, ficando o ministério para alguém como o ex-senador Jorge Viana, coordenador do GT de transição dessa área que terá alta relevância no futuro governo. Por contraposição à destruição bolsonarista e pela projeção de Lula na COP27.
3. Casa Civil – O ministro-chefe da pasta é o coordenador do governo, e por isso será escolha pessoal de Lula. O PT exige a pasta para um dos seus. Rui Costa, ex-governador da Bahia, é cotadíssimo, mas, se Lula já optou mesmo pelo embaixador Mauro Vieira como chanceler, frustrou o velho amigo Jaques Wagner, que cobiça o cargo. A Casa Civil seria uma boa compensação.
4. Secom – Que a comunicação governamental será estratégica para o governo, não há dúvida. Terá que ser forte, ousada e contemporânea, como advertiu em conversa com o GT de Comunicação Social o publicitário Sidônio Palmeira, que comandou a campanha de Lula. A disputa com o bolsonarismo no mundo digital vai continuar e exigirá respostas inovadoras, mas sem fake news. Cotados? Hoje a Secom está no Ministério das Comunicações e o GT sugere que volte para o Palácio, de onde foi retirada e rebaixada por Bolsonaro. Lula disse a um interlocutor esta semana que ainda está buscando um nome “forte” para o cargo. Façam suas apostas.
5. Indústria e Comércio – Este ministério a ser recriado ficaria com um empresário. Se Lula já fez a escolha, o nome está bem guardado.
6. Desenvolvimento Social – O PT exige a pasta que cuida dos programas sociais e é cobiçada pela senadora Simone Tebet. Pelo apoio dela recebido no segundo turno, Lula avalia que ela faz jus a uma pasta “de peso”. Qual seria a outra? Talvez Educação.
7. Saúde – Aqui, outro dilema. Lula tem muitos nomes qualificados para fazer a diferença em relação a Bolsonaro. Alexandre Padilha, cotado também para a área econômica. Arthur Chioro, Humberto Costa e José Gomes Temporão também foram bons ministros da Saúde na era petista. David Uip, Ludhmila Hajjar e Margareth Dalcolmo correm na raia acadêmico-científica.
8. Povos Originários – O presidente eleito vai cumprir a promessa mas admitiu na sexta-feira que poderá criar não um ministério mas talvez uma secretaria. Sonia Guajajara, do PSOL, continua a mais cotada. Mas se for ela, não haverá espaço para Guilherme Boulos, que Lula gostaria de ter na equipe. Talvez em Cidades e Habitação.
Estas são situações aparentemente não resolvidas e suplantam 20% do ministério. Sinal de que Lula, embora deixe escapar alguma coisa, continua retendo na cabeça muito do que já decidiu. Na sexta-feira ele disse e repetiu: “quem fui eleito fui eu”. E acrescentou que não está fazendo um ministério para si, mas para o país, com o conjunto de forças que o apoiaram. E este é o desafio: Como contemplar tantos, ajustando os perfis aos cargos, sem produzir frustrações que gerem ruídos políticos na base de apoio, seja no Congresso ou na sociedade.
Texto original em português do Brasil