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Domingo, Dezembro 22, 2024

Os dias negros de Outubro – I

Arnaldo Xarim
Arnaldo Xarim
Economista

Coincidência, ou não, os piores crash bolsistas (designação usada nos mercado de capitais para uma descida grande e inesperada do valor das acções que se traduz num impacto negativo na economia) registados no século XX ocorreram quase sempre no mês de Outubro, ou muito próximo dele.

(Illustrirte Zeitung Nr. 1564)

Deixando um pouco de lado a histórica Crise das Túlipas, ocorrida em 1636 na mesma Holanda que assistiu ao embrião das modernas bolsas de valores mas onde a febre duma verdadeira tulipamania levou a que um simples bolbo daquela espécie vegetal atingisse o valor de alguns hectares de terra, que a falta de dados históricos e estatísticos não permitirá a classificação do episódio como bolha especulativa, remontemos ao ano de 1873 para recordar o crash da bolsa de Viena que na sequência do processo de reunificação alemão de 1871 e ao rápido desenvolvimento económico que gerou conduziria ao aumento da concorrência, à estagnação dos preços e à queda das cotações das acções na zona germanófila (Alemanha e Áustria) até que em Outubro de 1873 a crise atingiria Berlim e outras praças europeias e americanas.

O pânico de 1907

Já no início do século XX, mais propriamente em 1907, ocorreu um episódio nos EUA que ficaria conhecido como o Pânico de 1907 ou o Pânico dos Banqueiros. Foi despoletado em meados de Outubro por uma tentativa fracassada para manipular o mercado de acções da United Copper Company, que levou a uma queda abrupta da Bolsa de Valores de Nova York e a uma corrida aos levantamentos bancários que alastraria a outros estados, originando uma vaga de falências.

A suportar aquela estratégia esteve a Knickerbocker Trust Company, o terceiro maior banco de Nova York, cuja falência ampliou ainda mais a onda de pânico e abalou definitivamente a confiança dos depositantes. Entre as principais causas para a corrida aos levantamentos estiveram uma retracção na liquidez do mercado por parte de vários bancos da cidade de Nova York e uma perda de confiança entre os depositantes, ampliada pelas apostas paralelas não reguladas nas casas de apostas (bucket shops) então muito populares.

A situação arrastou-se por três longos dias, até à intervenção do banqueiro J. P. Morgan, que prometendo recorrer ao seu próprio dinheiro convenceu outros banqueiros de Nova York a formar um sindicato para sustentar o sistema bancário e assim garantir a liquidez de que todos careciam. Esta iniciativa, dirigida pelo banqueiro que já tinha ajudado a resolver idêntica situação em 1893, quando contribuiu para suster outra corrida aos levantamentos na sequência do incumprimento da dívida argentina e da eminente falência do banco inglês Baring Brothers, destacou a impotência do sistema do Tesouro que administrava a oferta de moeda do país, mas não conseguia injectar a liquidez necessária no mercado.

A crise de confiança era tal que os bancos de Nova York continuavam relutantes em fazer os empréstimos de curto prazo com que normalmente facilitavam as negociações diárias de acções. As cotações começavam a cair, devido à falta de fundos para financiar as compras e a agitação nos mercados e nos bancos persistiria até 1908 e terá sido factor determinante na criação da Reserva Federal (FED), segundo o modelo que perdura até aos nossos dias. O FED tem como missão a definição e execução da política monetária (através da compra ou venda de títulos e do aumento ou redução da taxa de desconto), a fiscalização dos Federal Reserve Banks regionais (cada estado norte-americano tem o seu FED) e a regulação e supervisão dos bancos; é independente do governo mas está sujeita à supervisão do Congresso norte-americano e o seu Conselho de Governadores é escolhido pela Casa Branca.

O Pânico de 1907 ocorreu num período de longa contracção económica e o pânico bancário e a queda do mercado de acções resultaram em significativas perturbações económicas, com o sector industrial a ver a produção cair 11% e a registar ao segundo maior volume de falências até aquela data; ajudou ainda a cimentar a ideia que o Outono era um período vulnerável para um sistema bancário, na época, muito dependente dos ciclos agrícolas, que vira a sua liquidez reduzida em virtude dos grandes investimentos provocados pelo terramoto que ocorrera no ano anterior em São Francisco e que com a conjunção com a agitação no mercado de acções, até mesmo um pequeno choque poderia ter graves repercussões.

 

 

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