Alguns dirão, talvez a maioria, que os casos judiciais recentes, em que um procurador do Ministério Público, Orlando Figueira, é acusado de ter sido corrompido pelo ex-vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, e dois juízes desembargadores, Rui Rangel e Fátima Galante, para além de dois advogados e não sei quantos oficiais de justiça, são constituídos arguidos por suspeitas de corrupção num outro processo, são um sinal muito positivo porque mostram que a justiça está a funcionar.
Pode ser que sim, que seja de facto um bom sinal. Mas há um outro lado da justiça que vem à superfície nesta avalanche de acusações e suspeições sobre altos responsáveis da sua hierarquia que causa medo, apreensão e descrença.
Não devem, naturalmente, ser feitas generalizações. Porém, o que já sabemos é demasiado mau. No caso que envolve o procurador Orlando Figueira, os relatos jornalísticos das sessões do tribunal em que o procurador foi ouvido, remetem-nos para um ambiente surrealista em que o procurador exibe visões da realidade próximas da paranóia, provocando o tribunal e disparando em todos os sentidos, incluindo as procuradoras suas ex-colegas responsáveis pela acusação, a quem acusa de incompetência. O caso ainda vai no adro mas já dá para ver que o procurador Figueira revela traços de personalidade que não o recomendavam para funções de magistrado. Cabe, pois, perguntar como foi possível alguém com as suas características ter permanecido tantos anos e subido na hierarquia do Ministério Público, acusando ou arquivando processos sobre pessoas e instituições, sem que ninguém tivesse identificado nele os desvios de carácter que agora tão flagrantemente vieram à superfície. As dúvidas sobre o rigor e a honestidade do seu trabalho são legítimas.
No caso dos juízes desembargadores Rui Rangel e Fátima Galante não sabemos ainda se as suspeitas têm fundamento. Mas independentemente do que vier a ser apurado sobre a sua culpabilidade ou inocência, a operação desencadeada hoje com buscas à residência de Rangel, deu para constatar que a cumplicidade das autoridades judiciais com alguns jornalistas se mantém: a revista Sábado foi informada das buscas à casa do juiz tendo captado e divulgado imagens da chegada das autoridades. Acresce que entre as autoridades presentes na busca à casa do juiz Rangel se encontrava o juiz conselheiro do Supremo e ex-procurador-Geral da República Souto Moura que, segundo os repórteres, chefia a equipa.
Trata-se de uma fuga de informação que segue o padrão de outras fugas, que mancha quem a ordenou e que, além do mais, coloca sob suspeita o próprio ex-procurador-geral Souto Moura. Não se espera, naturalmente, que o ex-procurador-geral a tenha autorizado, porém espera-se que não deixe de mandar investigar quem a fez.
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