Grande parte das canções da música popular brasileira versam sobre a alma do povo deste enorme país. Inclusive faz parte da formação da identidade nacional. Por isso, em geral, as músicas são selecionadas para mostrar a diversidade e a riqueza da cultura brasileira e dos dilemas de quem vive da sua força de trabalho.
São quatro músicas brasileiras e uma do grupo mexicano Café Tacvba, que tem um trabalho voltado para os interesses do povo mexicano.
Raimundo Sodré
A primeira canção completa 40 anos neste ano e apresenta uma atualidade incrível. Parece profecia. “A Massa”, dos baianos Jorge Portugal (1956-2020) e Raimundo Sodré, foi apresentada ao grande público pela primeira vez no Festival da Nova Música Popular Brasileira, da Rede Globo, em 1980.
A empatia do público foi imediata e na final no Maracanãzinho lotado, no Rio de Janeiro, o público inteiro cantou a música que tirou o terceiro lugar. “Agonia” (E sem que se perceba a gente se encontra pra uma outra folia/Eu vou pensar que é festa vou dançar, cantar é minha garantia), de Mongol, ficou em primeiro. “Foi Deus que Fez Você” (Foi Deus que fez a noite/E um violão plangente/Foi Deus que fez a gente/Somente para amar, só para amar), de Luiz Ramalho em segundo.
Mas “A Massa” ganhou o coração do público porque um ano após a Anistia – que trouxe de volta muitos exilados políticos – cantava o sufoco que o país vivia sob uma ditadura desde 1964. Atentem para os versos:
“A dor da gente é dor de menino acanhado
Menino-bezerro pisado no curral do mundo a penar
Que salta aos olhos igual a um gemido calado
Moinho de homens que nem girimuns amassados
Mansos meninos domados, massa de medos iguais
Amassando a massa a mão que amassa a comida
Esculpe, modela e castiga a massa dos homens normais”
A Massa (1980), de Jorge Portugal e Raimundo Sodré
Luedji Luna
Uma nova voz baiana se destaca nesta edição. Luedji Luna canta o antirracismo e o feminismo emancipacionista como forma de colaborar para o aprofundamento desses temas no seio da sociedade, principalmente entre os que vivem do trabalho. Suas músicas mesclam vários gêneros musicais brasileiros com R&B, jazz e blues.
“Eu sou um corpo
Um ser
Um corpo só
Tem cor, tem corte
E a história do meu lugar
Eu sou a minha própria embarcação
Sou minha própria sorte”
Um Corpo no Mundo (2017), de Luedji Luna
O Rappa
A banda do Rio de Janeiro, O Rappa mistura rock, reggae e rap com uma pitada de ritmos nacionais. Formada em 1993, a banda se notabilizou por cantar a necessidade das pessoas sem voz e que sofrem com a repressão e violência de um sistema desumano.
“É Dia de Feira” é um claro exemplo da temática preferencial do grupo. Porque como diz a letra quem fornece a mercadoria não precisa fugir do “rapa” e ganham mais, muito mais, com a exploração do trabalho dos vendedores ambulantes.
“Mas eu não sou autorizado
Quando o rapa chega
Eu quase sempre escapo
Quem me fornece
É que ganha mais
A clientela é vasta
Eu sei!
Porque os remédios normais
Nem sempre
Amenizam a pressão”
É Dia de Feira (1996), de Falcão, Lauro Farias, Marcelo Lobato, Marcelo Yuka e Xandão; canta: O Rappa
Café Tacvba
Café Tacvba é um grupo mexicano de rock alternativo. Desde 1989 canta as mazelas do México e as lutas para mudar a cara do país.
“Se progredir é o nosso trabalho
e ainda há muitos índios por aí
que não sabem o que é viver na cidade”
Trópico de Câncer (1994), de Café Tacvba
Nelson Cavaquinho
Nelson Antônio da Silva, o Nelson Cavaquinho (1911-1986) é um dos mais importantes compositores brasileiros. Com toda a sua melancolia produziu pérolas da música popular brasileira como “Juízo Final”, “Folhas Secas”, “Rugas” e muitas outras. Bastante popularizado na voz de Beth Carvalho, principalmente.
Em “Quando Eu Me Chamar Saudade” ele pede para receber afagos e saudações em vida.
“Mas depois que o tempo passar
Sei que ninguém vai se lembrar
Que eu fui embora
Por isso é que eu penso assim
Se alguém quiser fazer por mim
Que faça agora
Me dê as flores em vida
O carinho, a mão amiga
Para aliviar meus ais”
Quando Eu Me Chamar Saudade (1985), de Guilherme Brito e Nelson Cavaquinho
Texto em português do Brasil
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