“Temos liberdade, a palavra como arma de transformação e uma mídia alternativa forte, coesa, que dá voz a alguns dos nossos mais geniais pensadores.”
O histórico auditório Vladimir Herzog, na sede do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, foi palco nesta quinta-feira (7) de um ato contra o golpe em curso no país.
As intervenções dos convidados responsabilizaram as grandes empresas de comunicação pelo clima de instabilidade e perseguições no país. Maria Inês Nassif afirmou que “o jornalismo é parte desse clima horroroso”.
Para ela, o Brasil paga pelos erros de ter se curvado ao monopólio da mídia.
“Nossa geração achava que já tinha dado sua cota. E aqui estamos. Nós, jornalistas, temos, nesse momento, um desafio duplo. Temos que ser parte ativa na resistência a essa ofensiva fascista. Mas, o pior é que, de alguma forma, o jornalismo é parte do clima horroroso que se criou nesse país”, disse.
Segundo ela, os jornalistas precisam se posicionar e não podem assimilar o discurso pró-golpe disseminado por seus patrões, as grandes empresas de comunicações. “Não podemos falhar. Essa luta tem lado”, defendeu. “É triste existir essa ofensiva, mas é triste também porque a mídia criou esse clima”, criticou.
O jornalista e professor Laurindo Lalo Leal Filho foi na mesma linha e disse que, como acontecia durante a ditadura militar, hoje os veículos estrangeiros representam melhor a realidade brasileira que a mídia verde-amarela. Segundo ele, há uma estrutura hegemônica de poder que faz com que apenas uma visão de mundo percorra toda a sociedade brasileira, mas é preciso também destacar a responsabilidade do jornalista nesse trabalho.
“Porque não é o Otavinho, não são os donos dos jornais que escrevem os textos dos jornais. São colegas nossos”, disse.
Lalo destacou que há três tipos de jornalistas hoje, no país: “os que se vendem aos patrões, assumem a identidade do patrão e se acham parte da burguesia nacional”; os que estão na grande mídia trabalhando para ganhar o pão, “tendo que fazer matérias que vão contra a sua consciência”, mas que muitas vezes conseguem denunciar o que sofrem nas redações; e os que têm “coragem de se libertar dessas amarras”, disse.
“Estes estão ousando, fazendo um jornalismo que resgata a ideia do jornalista como agente social transformador e que é a grande alternativa à mídia hegemônica. Isso não morreu, apesar da asfixia imposta pela grande mídia”, constatou.
Resistir
Ex-presidente do sindicato durante a ditadura militar, Audálio Dantas destacou que o auditório em que se realizava o evento sempre esteve lotado nos momentos de luta contra o autoritarismo e pela democracia. E defendeu a importância da resistência ao que classificou como um “movimento fascista de um grupo que tenta voltar ao poder por meio do golpe”.
“Hoje, como antes, é preciso ter consciência da necessidade de lutar e resistir”, disse ele, que conduziu, nos anos 1970, os protestos pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog, que ocorreu nas dependências do DOI-Codi de São Paulo. “Pode haver diferenças entre nós, como houve diferenças no passado. Mas estamos aqui na mesma luta em defesa das liberdades democráticas”, completou.
Vilma Amaro, presidenta do grupo Tortura Nunca Mais, declarou que não esperava ter que enfrentar, de novo, a luta contra um golpe. E ressaltou que, se durante os anos de chumbo o jornal Última Hora funcionava como uma trincheira para o jornalismo contrário ao golpe, hoje blogueiros e sites da mídia alternativa cumprem o papel de ser o contraponto à “imprensa golpista”.
Segundo ela, a imprensa brasileira está “submetida aos interesses do oligopólio e sequer tem sentimento de brasilidade, ataca a Petrobras e se coloca em defesa de interesses estrangeiros”. Vilma defendeu a importância de reeditar uma rede pela legalidade no país, que se oponha à campanha de ódio alimentada pela mídia.
Para Altamiro Borges, presidente do Centro de Estudo da Mídia Alternativa Barão de Itararé, o sindicato foi corajoso ao realizar o evento, uma vez que representa a categoria cujo “patrão é o principal partido de oposição, a mídia”, que estaria à frente do golpe. “O papel que os barões da mídia cumprem é nefasto, de regressão civilizatória”, discursou.
Para ele, o que está em jogo na cena política não é o debate sobre corrupção, mas uma disputa de projetos para o país. “Querem voltar ao poder para retirar direitos, sabotar a soberania e criminalizar os movimentos sociais”, acusou.
Violações da Lava Jato
Paulo Zocchi, presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, denunciou a quebra do sigilo da fonte, evidenciado na condução coercitiva do jornalista Breno Altman no dia 1º de abril, como mais uma das violações da operação Lava Jato.
“Na sexta-feira, ao conduzir coercitivamente o companheiro Breno Altman e levar todo o material de trabalho dele, a Lava Jato fez mais uma violação, do sigilo da fonte, um direito democrático e constitucional do jornalista”, completou Paulo.
Para Guto Camargo, secretário-geral da Federação Nacional dos Jornalistas, o sigilo da fonte foi deturpado pelo jornalismo que se pratica atualmente no Brasil. “Foi desvirtuado esse processo para que se possa justificar uma ideia determinada”, observou o dirigente.
Manifesto
O presidente do sindicato ressaltou ainda que o ato desta quinta servia também como lançamento oficial do “Manifesto dos jornalistas em defesa da democracia e dos direitos sociais”, que já conta com cerca de 1.700 signatários (Para ler e assinar o documento ).
Zocchi também convidou toda a categoria a se integrar a um Comitê de Jornalistas Contra o Golpe, que terá sua primeira reunião na próxima terça (12), às 19h, no próprio sindicato. A ideia é discutir o cenário político e apresentar propostas e encaminhamentos para reforçar a luta contra o golpe. Diante das dificuldades financeiras do sindicato, foi iniciada uma campanha de arrecadação de fundos para levar adiante a iniciativa do comitê.
Fonte: Por Joana Rozowykwiat e Railídia Carvalho, do Portal Vermelho
Nota: A autora escreve em português do Brasil