Ao negar a existência de fome no Brasil, o capitão-presidente dá as costas ao país e ao povoEm que país vive o presidente Jair Bolsonaro? No mundo da lua? É o que parece quando diz que não há fome no Brasil. Ele repetiu, na sexta-feira (19), num encontro com jornalistas, essa velha ladainha da direita. “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira”, disse. “Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não”. E repetiu o argumento da elite ao dizer que “é um discurso populista” falar de fome no Brasil. Juntou-se àqueles da elite que põem este rótulo de “populista” em todos os que apresentam preocupações com a vida e os problemas do povo.
Horas depois, ao tentar corrigir o que disse, a emenda ficou pior que o soneto – reconheceu que uma “pequena parte” da população passa fome. Esta “pequena parte” era, há mais de três anos, formada por mais de 5 milhões de brasileiros – o dobro do número de moradores de Belo Horizonte, que tem 2,5 milhões de habitantes. Hoje, depois do empobrecimento imposto ao povo após o golpe de 2016, que afastou do governo a presidenta Dilma Rousseff, o número com certeza é muito maior.
As declarações de Bolsonaro reafirmam seu completo despreparo para exercer o mais alto cargo da nação. Demonstram que ele não conhece o Brasil nem os brasileiros – que, aliás, despreza, como já havia deixado claro quando, ao falar sobre seu veto à gratuidade do despacho de malas nos aviões, em 30 de maio, saiu-se com esta: “Os caras são socialistas, comunistas, são estatizantes. Eles gostam de pobre”.
A lua em que Bolsonaro vive é formada pela Barra da Tijuca e bairros chics semelhantes pelo Brasil afora, onde aparentemente não há fome. Ao negar este grave problema, ele mostra mais uma vez desconhecer o que aflige o país que governa, e afeta a vida do povo.
A fome é endêmica no Brasil; é um mal que aflige o povo pobre desde sempre. E só foi enfrentada com decisão durante os governos Lula e Dilma, quando o Brasil atingiu um nível internacionalmente aceitável de garantia da nutrição para todos os brasileiros, saindo do chamado “Mapa da Fome”, da ONU. Ao qual está na iminência de voltar tendo e vista o grande empobrecimento dos brasileiros em consequência da política econômica concentradora de renda imposta ao país nos últimos anos.
A crise econômica se aprofundou, o emprego sumiu e a renda minguou, tragados pelas retrições impostas ao país pelo ultra-liberalismo adotado desde então, e aprofundado por Jair Bolsonaro.
O combate à pobreza foi feito, sob Lula e Dilma, pelo crescimento da economia e do emprego, recuperação do valor do salário mínimo e programas de distribuição de renda, como o Bolsa Família. A ação do Estado, naquele período, foi decisiva e ajudou a retirar mais de 30 milhões da situação de extrema pobreza – que têm renda per capita igual à metade, ou menos, de um salário mínimo.
Na ocasião o Banco Mundial chegou a apontar o Brasil como exemplo para o mundo no combate à pobreza, à redução da miséria, e, em consequência, à fome.
Entretanto, desde 2016, rapidamente a situação se inverteu. Segundo o Banco Mundial, naquele ano um quarto dos brasileiros (52,168 milhões de pessoas) estava novamente abaixo da linha de pobreza, e sob ameaça da fome.
Aumentar mesmo minimamente a renda significou, naqueles anos, colocar comida na mesa do povo pobre. E a fome foi reduzida, no Brasil, a um nível inferior a 2,5% da população. Agora a pobreza e a fome rondam outra vez os brasileiros, em consequência das mudanças posteriores ao golpe de 2016. Um relatório da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, sigla do inglês Food and Agriculture Organization), a agência da ONU dedicada ao estudo da fome no mundo, recolocou o Brasil naquela lista devido a “um aumento da prevalência da má-nutrição”.
Havia no Brasil, em 2017, diz a FAO, 5,2 milhões de pessoas ameaçadas pela fome. É escandaloso. Os governos – e o Estado – de países soberanos, que cumprem a função pública deles exigida, têm programas de segurança alimentar. O Brasil já teve e agora não tem mais. E, pela disposição manifestada por Jair Bolsonaro, está longe de voltar a ter.
A agenda ultra-liberal de Jair Bolsonaro não inclui qualquer cuidado com o povo – é voltada apenas para os muito ricos, aos que habitam a “lua” em cujo mundo vive este presidente sob o qual, tudo infelizmente indica, o problema pode se agravar. Bolsonaro “agride o bom-senso e menospreza a dor dos que sofrem”, reagiu o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). Ele tem razão.
Texto em português do Brasil
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