Para diminuir a presença desses monumentos na vida das cidades ou simplesmente fazê-los sumir da vista, projetos de leu defendem substituí-los, retirá-los ou contextualizá-los.
O incêndio na estátua do bandeirante Borba Gato, em São Paulo, no sábado 24 de julho, jogou luzes sobre o repúdio de setores da sociedade a esse tipo de homenagem pública. Em todo o Brasil, parlamentares lutam para tirar das ruas monumentos que celebram pessoas ligadas a períodos autoritários e criminosos do passado do País, como a escravidão e a ditadura militar.
É o caso dos deputados federais Orlando Silva (PCdoB-SP), Taliria Petrone (PSOL-RJ) e Áurea Carolina (PSOL-MG). Eles apresentaram, na Câmara dos Deputados, projeto de lei que, se aprovado, proibirá homenagens em monumentos públicos a traficantes e proprietários de escravos, além de pensadores que defenderam e legitimaram a escravidão. Segundo os deputados, esses monumentos pró-escravagistas devem ser levados a museus.
Há projetos similares em câmaras municipais e assembleias legislativas, em busca de veto a essas homenagens polêmicas. Para diminuir a presença desses monumentos na vida das cidades ou simplesmente fazê-los sumir da vista, tais projetos defendem substituí-los, retirá-los ou contextualizá-los – neste caso, explicando quem são e o que fizeram as figuras homenageadas.
“Abrir o debate” sobre o monumento a Borba Gato foi o pretexto que o ativista Paulo Roberto Lima, o Galo, usou para justificar seu protesto incendiário. “Em nenhum momento foi feito para machucar alguém ou querer causar pânico. Que as pessoas agora decidam se querem ter uma estátua de 13 metros de altura que homenageia um genocida e um abusador de mulheres”, disse Galo, que é líder do movimento dos entregadores por aplicativos.
A historiadora Ana Lúcia Araújo, professora do Departamento de História da Universidade Howard, critica a permanência desses símbolos. Para ela, homenagens dessa natureza conservam não a História – mas, sim, a memória pública que foi utilizada por grupos para impor agendas político-ideológicas e a sua própria visão do espaço público no passado.
Segundo a historiadora, a retirada, substituição ou derrubada de um símbolo que ocupe o espaço público ajuda a apagar a memória que foi construída e que anos depois já não corresponde à sociedade em que está inserida. “Esses monumentos foram erguidos para prestar homenagem a pessoas que eram algozes. Nesse sentido, cabe a retirada desses monumentos”, afirma. “Essa história não está apagada – ela está no arquivo. Existem historiadores escrevendo sobre isso, jornalistas que escrevem sobre isso.”
O debate ganha força no Brasil, mas já teve destaque em países como Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha. Ana Lúcia lembra que, em diversos momentos da história, monumentos foram retirados ou derrubados sem que a história fosse apagada, como durante a independência dos Estados Unidos, a Revolução Francesa e a derrubada dos regimes comunistas na Europa oriental.
No caso do Brasil, a historiadora avalia que diversas saídas podem ser consideradas, como o armazenamento dos monumentos para exposição em museus ou parques. “Não existe uma solução única. Mas é preciso avaliar”, pondera, lembrando que “a situação dos museus no Brasil é um caos, um desastre, uma tragédia. E tem muitos museus que não querem essas obras”.
Nos Estados Unidos, 169 símbolos dos confederados – que eram escravagistas – foram retirados em 2020, conforme levantamento do Southern Poverty Law Center. Cerca de cem deles eram estátuas. Por outro lado, ainda restam pelo menos 2.100 símbolos pelo país, sendo cerca de 700 deles monumentos.
Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado